A mobilização que reuniu ontem cerca de 150 mil pessoas na Esplanada dos Ministérios, em Brasília, foi marcada pela forte repressão policial contra integrantes de sindicatos e movimentos sociais. Mas não é de hoje que essas entidades sofrem com o abuso de autoridade e a criminalização. O tema foi debatido nesta quinta-feira (25), na Comissão de Direitos Humanos do Senado.
Os movimentos vêm sofrendo há anos com a repressão das forças policiais, especialmente as polícias militares nos estados – que, muitas vezes, ao invés de protegerem manifestantes, os atacam. “Precisamos refletir e achar alguma saída para esse problema. As polícias ainda mantém estrutura que vem ligada às forças militares, com uma visão diferente do que se espera em uma sociedade democrática”, destacou o presidente da Associação Nacional dos Defensores, Antonio Maffezoli.
Até mesmo legislações em vigor – como a Lei 12.850/2013 – tem sido usada para incriminar a questão social. Em 2016, por exemplo, o Ministério Público do Estado de Goiás denunciou quatro trabalhadores rurais sem terra como integrantes de organização criminosa.
A situação é agravada no legislativo. A chamada bancada ruralista, que conta com cerca de 200 deputados, é acusada pelos movimentos sociais de promover uma verdadeira caçada aos integrantes de entidades representativas. Um exemplo é a CPI da Funai/Incra, constituída por parlamentares ligados ao agronegócio.
Esse colegiado quer aproveitar um relatório de uma outra CPI realizada na Assembleia Legislativa do Estado do Mato Grosso do Sul. Acontece que esse material – produzido para incriminar membros do Conselho Indigenista Missionário (CIMI) – foi rejeitado pelos Ministérios Público por falta de provas.
“Os deputados aqui estão requentando denúncias falaciosas contra dirigentes do CIMI aqui nessa CPI da Funai/Incra”, denunciou o secretário do CIMI, Cleber Buzatto, durante a audiência na CDH.
A perseguição aos movimentos sociais no campo também foi condenada pelo representante da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil, Alberto Dias França. “Estão tentando desestruturar a Funai, tentando criminalizar as lideranças indígenas, as instituições do próprio Estado. Então, desta forma não vai resolver. Só vai crescer as mortes dentro dessa luta de demarcação de nossas terras”, denunciou.
No campo, outro grupo fortemente reprimido é o dos quilombolas, que há décadas lutam pelo direito ao reconhecimento de suas terras. “Estamos em 2017 e ainda os nossos territórios estão sendo massacrados pelo governo, pelo Estado, pelas pessoas que deveriam defender a Nação.Enquanto não tiverem áreas tituladas, o Estado vai matar mais”, disse a representante da comunidade quilombola Rio do Macaco (BA), Rose Meire dos Santos Silva.
Exército contra o povo
Durante a audiência da CDH, os debatedores destacaram a repressão policial contra manifestantes durante o Ocupa Brasília. O ápice foi a convocação das Forças Armadas por Michel Temer sob o pretexto de cessar atos de violência – na verdade, uma ação para intimidar quem protestava na Esplanada dos Ministérios, na quarta-feira (24), por ‘Diretas Já’ e contra as reformas trabalhista e da Previdência.
“Isso aconteceu em 1964. [Os militares] vieram a Brasília também para acalmar o País e ficaram 21 anos. A gente não pode esquecer isso. É uma coisa extrema. Nós temos a Força Nacional de Segurança para ajudar a polícia, quando precisa. E ele convoca as Forças Armadas. Logo um presidente que não tem nenhuma legitimidade para isso”, criticou a presidenta da CDH, senadora Regina Sousa (PT-PI).
Na mesma linha, o senador Paulo Rocha (PT-PA) afirmou que a medida de Temer – já revogada por ele mesmo nesta quinta – que o governo está moribundo e tenta se sustentar pela via autoritária. Ele lembrou que nem sequer os comandantes das Forças Armadas deram respaldo à decisão.
Nesta quinta, a Bancada de Oposição ao governo Temer divulgou uma nota criticando a convocação das Forças Armadas. Confira:
Nota Pública
O dia 24 de maio de 2017 foi um dia histórico, em que centenas de milhares de pessoas foram pacificamente às ruas de Brasília protestar contra o governo corrupto, ilegítimo e antipopular de Michel Temer.
Não bastasse tentar impor uma agenda de reformas impopulares que retiram direitos da classe trabalhadora, Temer foi flagrado pedindo propina a empresários investigados e passou a ser, pela primeira vez na história, um presidente da república alvo de um inquérito no Supremo Tribunal Federal.
O povo brasileiro não aceita mais esse governo ilegítimo e a saída para a crise não pode passar por um conchavo legislativo que retire do povo o direito de escolher seu governante. Temer precisa sair do cargo o quanto antes e o Brasil precisa de Diretas Já para presidente da república: esse é o recado das ruas. Essa é a única maneira de resolver a gravíssima crise econômica, política e institucional por que passa o Brasil.
Importante registrar que a deflagração de lamentáveis episódios de destruição de patrimônio público não representou o espírito das manifestações de quarta-feira (24), que seguiram pacíficas e massivas, até que uma ínfima minoria de poucas dezenas de pessoas mascaradas passaram a reagir violentamente à presença da polícia. Em nosso entendimento, essa ação violenta partiu de grupos infiltrados, cujo objetivo foi criar um pretexto para a promulgação do vergonhoso decreto que sitiou a democracia brasileira.
O rompante ditatorial, graças à pronta manifestação da oposição e da sociedade civil em geral, não durou sequer vinte e quatro horas, evidenciando a falta de rumo e a fragilidade política do governo golpista em seus estertores.
Diante disso, é necessária a pronta investigação da atuação de provocadores nos atos, para que se apurem as ações daqueles que buscam deslegitimar a pacífica e democrática manifestação dos trabalhadores brasileiros contra as cruéis reformas, pela retirada de Temer do poder usurpado e por Diretas Já para presidente da república.
Brasília, 25 de maio de 2017
Bancada de Oposição ao governo Temer no Senado Federal
MULTIMÍDIA
Presidente da Contag, Aristides Santos critica ataque a movimentos sociais