Seminário do PT

Movimentos denunciam retrocessos em políticas agrárias e agrícolas

Lideranças dos movimentos sociais discutiram a resistência popular no campo e o papel das organizações. O debate ocorreu no Seminário Resistência, Travessia e Esperança nos Territórios Rurais, organizado pelo PT
Movimentos denunciam retrocessos em políticas agrárias e agrícolas

Foto: Agência Brasil

“Nada mete mais medo na burguesia que o povo organizado” foi uma das frases proferidas por Antônia Ivoneide Silva, da direção nacional do Movimento dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais Sem Terra (MST), que ecoou no Seminário Resistência, Travessia e Esperança nos Territórios Rurais. O evento ocorreu nesta terça-feira (15) e lideranças de vários movimentos sociais do campo denunciaram retrocessos em políticas públicas agrárias e agrícolas.

A atividade foi organizada pelas bancadas do PT na Câmara e no Senado, em conjunto com a Fundação Perseu Abramo, a Secretaria Agrária Nacional do PT e o Núcleo Agrário do PT no Congresso Nacional, coordenado deputado Pedro Uczai (PT-SC). O debate contou com a participação dos deputados Padre João (PT-MG), Nilto Tatto (PT-SP) e João Daniel (PT-SE).

Resistir, ocupar e produzir

Antônia Ivoneide Silva – também conhecida como Neném – lembrou a atualidade do lema “ocupar, produzir e resistir”, utilizado há mais de 30 anos pelo MST. Segundo ela, essa resistência representa, até hoje, a luta pela terra, mesmo diante de tantas ameaças e intolerância.

Neném lamentou o assassinato do menino de 9 anos, a tiros, por homens encapuzados que invadiram a casa de Geovane da Silva Santos, pai da criança e líder dos agricultores rurais do Engenho Roncadorzinho, onde moram mais de 60 famílias. O crime aconteceu na noite de quinta-feira (10) no município de Barreiros (PE).

A dirigente do MST denunciou ainda que o processo da regularização fundiária acabou virando uma política para atender os que já têm terra e querem muito mais. “Tudo é utilizado para se apropriar de forma ilegal ou regularizar o processo de titulação forçada dos assentamentos sem debate, sem discussão, sem construção organizada. Está dentro dela aqueles que querem se apropriar das terras dos indígenas, dos camponeses de forma geral para dali tirar riqueza. Portanto, se apropriar das águas, das florestas, de todos os bens, mas com interesse particular e privado, e tirar dali seu lucro”, criticou Neném.

Mais uma vez, reforçou a importância da luta coletiva e organizada. “Portanto, essa resistência na terra é muito importante para que a gente permaneça nessas terras, nesses territórios”.

Luta política

O presidente da Confederação Nacional dos Trabalhadores Rurais Agricultores e Agricultoras Familiares (Contag), Aristides Veras dos Santos, destacou que o Estado está a serviço do que tem de pior no Brasil, do que é mais conservador. Segundo ele, o governo brasileiro se aliou a setores militares, da Igreja, do agronegócio, das mineradoras e das madeireiras. “Aquilo que tem de pior, do ponto de vista da evolução na sociedade brasileira, se aliou ao atual governo e as consequências são gravíssimas nesse momento”, alertou.

O sindicalista enfatizou o papel das organizações sociais na luta política. Segundo ele, não fosse a resistência dos movimentos sociais e sindicais, e também do Parlamento, a situação pela qual passa o país poderia estar ainda pior.

“Acho que a resistência que a gente tem no Parlamento por parte das bancadas, a exemplo da bancada do PT, junto com a gente que está no campo e nas cidades, as centrais sindicais na liderança da CUT, conseguimos evitar problemas maiores e, na sociedade, ganhar o debate da vacina, por exemplo”, avaliou o presidente da Contag.

Autonomia no campo

Dione Torquato, integrante da direção do Conselho Nacional dos Extrativistas (CNS), destacou a importância dos movimentos populares no Brasil e o legado construído nas políticas públicas, sobretudo em defesa do campo, da floresta e das águas.

“Vale a pena ressaltar que os movimentos, historicamente, sempre lutaram e combateram a desigualdade, lutaram pela soberania, segurança alimentar, lutaram contra a desigualdade e sobretudo pela autonomia no campo”, afirmou.

O extrativista denunciou que os povos da floresta vivem profundas ameaças dentro de seus territórios. Segundo ele, há uma estratégia clara do governo de apropriação dessas terras que pertencem à União para repassá-las ao setor privado. “Isso tem consequências diretas não só para a questão ambiental mas sobretudo para a cultura desses povos, e são consequências que são geradas para todo o Brasil – do campo, da floresta e das águas –, como atores sociais importantes na construção da democracia no país”, alertou Torquato.

Dione Torquato disse que não há dúvida sobre a necessidade de continuar resistindo e defendendo as conquistas. “Eu acredito muito que sem luta não há conquistas. E sem a conquista não há como pensar os povos. E sem os povos não há como pensar a história e a diversidade desse país, porque certamente eles serão apagados ou simplesmente esquecidos (…) Então, nós temos que continuar resistindo em trincheiras para manter o legado e a diversidade tão importante que contribui para a identidade do nosso país, que são o campo, as águas, as florestas e as cidades unificados, garantindo direitos sociais”, defendeu o dirigente do CNS.

Soberania alimentar

Para Isabel Ramalho, da direção nacional do Movimento dos Pequenos Agricultores (MPA), o campo também precisa ser olhado como um lugar de geração de renda para garantir a permanência na terra. “É fundamental ao território, a todas as famílias camponesas, indígenas, quilombolas, os extrativistas, enfim, todos os trabalhadores e trabalhadoras do campo que precisam ter garantido acesso à terra”.

Segundo ela, essa é a primeira condição para que o povo do campo possa seguir como camponeses, cumprindo com a missão de produzir alimentos de qualidade para alimentar o povo brasileiro. “Não dá para seguir achando que o agronegócio algum dia vai garantir soberania alimentar nesse país, pelo contrário”, criticou Isabel Ramalho.

Eleger Lula

Michela Calaça, dirigente nacional do Movimento de Mulheres Camponesas (MMC), foi categórica em afirmar: “Um pressuposto desse debate é que a nossa tarefa zero – e no MMC a gente tem isso muito nítido – é eleger o presidente Lula. Essa é a nossa grande tarefa deste ano. É eleger, é organizar para eleger, é organizar para sustentar seu mandato”.

Michela disse que é necessário que os movimentos pensem, conjuntamente, qual a conformação do Estado que se quer a partir da eleição do ex-presidente Lula e qual o projeto de desenvolvimento nacional deve ser implantado.

Já Marcos Rochinski, dirigente nacional da Confederação Nacional dos Trabalhadores e Trabalhadoras na Agricultura Familiar do Brasil (Contraf-Brasil/CUT), defendeu a reconstrução do Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional, retomar o Conselho Nacional de Desenvolvimento Rural e recuperar a política dos territórios como bases para a construção de políticas diferenciadas.

Para o dirigente sindical, resistência no Brasil é o que a agricultura familiar faz. “Mesmo apanhando, mesmo fora do orçamento, mesmo fora das linhas de créditos e de assistência técnica, o povo, concretamente, continua resistindo e desenvolvendo suas atividades, dentro das suas propriedades, dentro dos seus territórios”, destacou.

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