Na contramão do golpismo, presidente do Santander aposta em Dilma

Na contramão do golpismo, presidente do Santander aposta em Dilma

Sérgio Rial: Não é a ruptura
que vai levar a uma soluçãoA crise política exige amadurecimento político e não rupturas traumáticas, que só vão levar ao caos. O recado é do presidente do banco Santander, Sérgio Rial, que recusa o alinhamento com a parcela majoritária dos grandes empresários que pedem o afastamento da presidenta Dilma Rousseff. “O governo que está aí foi eleito democraticamente. Isso é superimportante”, afirmou Rial em entrevista ao jornal Folha de S Paulo, publicada neste domingo (10).

O banqueiro acredita que a presidenta ainda tem condições de recuperar a confiança e conduzir o País até o final de 2018, “desde que se encontre a agenda correta” e define como “posições extremas” o coro do empresariado que prega a derrubada de Dilma como saída para a crise econômica. “Vejo com tristeza a intolerância que se espalhou pelo país e espero que a gente consiga encontrar um caminho. Estamos num processo de maturidade política duro, mas necessário. Não é a ruptura que vai levar a uma solução. Aliás, não há solução na ruptura. Só há o caos”, afirmou Rial.

Leia a íntegra da matéria publicada pela Folha de S Paulo:

Governo ainda pode recuperar confiança, diz presidente do Santander

O presidente do Santander, Sérgio Rial, é voz destoante no empresariado. Enquanto vários colegas passaram a dizer abertamente que não há saída para a crise com Dilma Rousseff no Palácio do Planalto, Rial afirma que a presidente ainda é capaz de recuperar a confiança na economia.

“Não há nenhum ponto tão baixo que não possa melhorar, desde que se encontre a agenda correta”, afirma o banqueiro. “Não é a ruptura que vai levar a uma solução.”

Apesar da posição claramente favorável à presidente, Rial não diz se é a favor ou contra o impeachment.

E o vice Michel Temer, daria certo no lugar de Dilma?

“Sempre existe o risco de que só a mudança no Executivo não gere a concertação política” capaz de tirar o país do atoleiro.

No comando desde janeiro do terceiro maior banco privado do país, Rial afirma que a crise econômica só não é pior porque os bancos estão segurando as pontas das grandes empresas e renegociando suas dívidas.

De acordo com ele, se bancos e investidores exigissem hoje que as empresas pagassem em dia, elas não teriam condições de honrar seus compromissos.

“Os bancos estão envolvidos num esforço de prorrogar, refinanciar, repensar, redesenhar tudo. Não interessa a ninguém que as empresas quebrem, que mais gente fique desempregada.”

FORA DO ROTEIRO

Carioca, 55 anos, filho de espanhóis, Rial chegou à presidência da filial brasileira do espanhol Santander sem seguir o roteiro típico dos ocupantes desse tipo de cargo.

Começou a carreira em bancos estrangeiros, mas deu uma escapada que o levou a posições de destaque na multinacional americana Cargill e, antes do Santander, à presidência do frigorífico Marfrig.

Apesar do cenário de terra arrasada que domina o país, ele diz que o setor privado já fez seu ajuste e acha possível que os primeiros sinais de reação econômica comecem a dar as caras a partir do segundo semestre. “Acho que a economia não vai cair muito mais.”

Na opinião do presidente do Santander Brasil, Sérgio Rial, a crise econômica só não é pior porque os bancos estão renegociando as dívidas de grandes empresas para tentar evitar que quebrem. “Isso não interessa a ninguém.”

Leia a seguir trechos da entrevista.

Folha – Até as maiores empresas do país estão com dificuldades para pagar dívidas. O sr. teme uma onda de quebradeira?
Sérgio Rial –
 A gravidade da crise é inquestionável. Se hoje todos os bancos e investidores que compraram papéis de empresas brasileiras exigissem pagamentos nos vencimentos previstos, teríamos incapacidade de liquidez no país para isso.

Mas essa não é a proposta dos bancos. Os bancos estão envolvidos num esforço de prorrogar, refinanciar, repensar, redesenhar tudo. Não é do interesse de ninguém que empresas quebrem, que mais gente fique desempregada.

E o impacto dos calotes na saúde financeira dos bancos?
O Brasil tem um sistema financeiro sólido. Minha preocupação não é a quebradeira. É que haja um alinhamento claro dos bancos para ajudar, e está havendo isso, e que as empresas façam seu trabalho de casa.

Que trabalho é esse?
Voltar para o negócio principal, deixar de fazer coisas que eram bacanas e não dá mais para ter, e que os acionistas se comprometam em colocar recursos.

Como as empresas estão reagindo a isso?
Muitas são familiares e se assustaram. Vinham de uma fase de bonança, muitas foram pegas de surpresa pela parada abrupta da economia e não conseguiram ler os sinais de que viria uma queda acentuada no preço das commodities.

Algumas hesitaram em tomar decisões necessárias, como venda de ativos e fechamento de operações negativas. Mas este é o momento de revalidar a crença nas empresas que lideram e estamos vendo vários exemplos disso.

O Santander é um dos grandes financiadores da Petrobras. O sr. teme que a empresa dê calote?
A gente não fala sobre clientes, mas absolutamente não. Não estamos numa situação de liquidez que levaria o país a deixar de pagar dívidas.

O governo Dilma Rousseff ainda tem condições de recuperar a confiança de empresários e consumidores na economia?
Acho que sim. Não há nenhum ponto tão baixo que não possa melhorar, desde que se encontre a agenda correta. O governo que está aí foi eleito democraticamente. Isso é superimportante.

Mas um número crescente de empresários passou a dizer abertamente que, com Dilma no Planalto, não há saída possível para a crise econômica…
São posições extremas. Tenho certeza de que a presidente tem as melhores intenções. Vejo com tristeza a intolerância que se espalhou pelo país e espero que a gente consiga encontrar um caminho.

Estamos num processo de maturidade política duro, mas necessário. Não é a ruptura que vai levar a uma solução. Aliás, não há solução na ruptura. Só há o caos.

O vice Michel Temer corre o risco de enfrentar processos iguais aos de Dilma. Ele teria condições de formar o tal governo de transição?
O sistema presidencialista criou no imaginário do brasileiro a figura do salvador, ou da salvadora. Não tenho visto movimentos de concertação política no país. Sempre existe o risco de que só a mudança no Executivo não gere essa concertação.

No caso de o vice assumir a Presidência da República, o Congresso estaria apto a ajudar? Não sou capaz de responder.

Acho que chegou a hora de exigir que todos [governo e oposição] resolvam suas diferenças para termos pelos menos uma agenda mínima de governabilidade do país, que implica melhores contas públicas e pelo menos algumas reformas.

O discurso do governo não vai na direção de reformas…

Acho que agora não existe um discurso. Não existe uma agenda. Mas posso dizer que elas acontecerão. São necessárias.

O sr. é a favor do impeachment da presidente ou da renúncia dela?

Prefiro não responder.

Muitos bancos estão prevendo que, neste ano, a recessão será ainda pior do que a de 2015. Que a queda do PIB talvez passe dos 4%. Qual é a sua previsão?

Acho mais provável a repetição do que vimos em 2015. A projeção do banco é inferior a 4%. E acredito que a partir do segundo semestre estejamos num outro momento.

Já batemos no fundo do poço?

Sempre pode haver surpresas. Não havendo nada dramático além do que sabemos hoje, acho que a atividade econômica tem tudo para voltar a melhorar a partir de agora. O setor privado já fez seu ajuste. O desemprego que a gente vê na rua é consequência do ajuste feito desde 2015.

As empresas estão refinanciando suas dívidas, vendendo coisas que não são importantes, focando suas operações, trabalhando em produtividade. Já vemos sinais de que o Brasil pode emergir dessa crise melhor.

Quais são os sinais?

A indústria de calçados começa uma retomada e o setor têxtil pode voltar a ser forte, já que a importação da China ficou cara. O agronegócio vai bem. Acho que a economia não vai cair muito mais do que já está dado.

Bancos estrangeiros como o HSBC e o Citibank estão saindo do Brasil. O país deixou de ser interessante para as grandes instituições financeiras internacionais?

Não se pode atribuir a saída desses bancos apenas à situação do Brasil. O país tem um mercado financeiro de grande potencial.

Agora, alguns se cansaram da complexidade de operar aqui e também não conseguiram criar quadros de gestão locais para ter a relevância de que precisavam.

Vocês conseguiram?

O Brasil representa de 20% a 25% do Santander. Isso é relevância. Nós investimos aqui mais de US$ 30 bilhões nos últimos 20 anos. É preciso esse nível de investimento para ter relevância.

O Santander perdeu o HSBC para o Bradesco. Vai tentar comprar as operações de varejo do Citi?

Vamos olhar o Citi. Temos obrigação. Mas vamos manter a disciplina financeira que tivemos no caso do HSBC [o Santander acha que o Bradesco pagou muito].

O Santander hoje é oriundo de mais de 20 aquisições. Compramos o Banespa e o Banco Real, que por sua vez tinha comprado o Sudameris, o Bandepe, e tem várias outras aquisições.

Hoje somos alternativa aos dois grandes locais [privados, Itaú e Bradesco]. Não há nada errado em ser um grande número dois.

RAIO-X
SÉRGIO RIAL, 55

Formação
Direito pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e economia pela Universidade Gama Filho

 

Carreira
Desde janeiro é presidente do Santander Brasil, após um ano como presidente do conselho de administração da instituição
Foi presidente do frigorífico Marfrig e diretor financeiro da indústria de alimentos Cargill, nos Estados Unidos
Começou a carreira no banco de investimentos americano Bear Stearns e trabalhou 18 anos no banco holandês ABN Amro, no qual ocupou posições em seis países

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