ARTIGO

Novembro passou

Promover a igualdade racial, é promover um futuro de avanço e prosperidade para todas, todos e todes
Novembro passou

Foto: Elineudo Meira

O Dia Vinte de novembro, Dia da Consciência Negra é reconhecido pelos movimentos negros do país, como uma data simbólica e de resistência, diante do assassinato de Zumbi, o senhor da guerra, líder de um dos maiores quilombos do Brasil, o Quilombo de Palmares.  Zumbi guerreou pela liberdade do povo negro e não negro no período da escravidão.

Na década de setenta, militantes universitários no Estado do Rio Grande do Sul, como o poeta Oliveira Silveira, Vilmar Nunes, Ilmo da Silva e o único militante vivo, o doutor Antônio Carlos Côrtes, eleito recentemente para academia rio-grandense de letras iniciaram o debate para solidificação do Dia Nacional da Consciência Negra, Dia Vinte de Novembro. O grupo não considerava o dia 13 de maio, data da abolição inacabada, como a dia simbólico de resistência e de luta contra o racismo no país.

O mês de maio, dia treze, mesmo não sendo reconhecido pelos movimentos negros, como data da luta antirracista e o mês de novembro, dia vinte, acolhido pelos movimentos negros, são os períodos em que o Brasil, mais “discute e da visibilidade” aos crimes de racismo e ações de promoção da igualdade racial, o chamado antirracismo por conveniência. O Brasil tem a maior população negra fora da África e a segunda maior do planeta, onde perde apenas para Nigéria com população estimada de oitenta e cinco milhões, conforme dados do domínio público.

Durante a pandemia do coronavírus, que ainda não acabou e ceifou quase setecentas mil vidas, o Senado Federal com o apoio do presidente da casa, Rodrigo Pacheco, do partido das trabalhadoras e dos trabalhadores, da secretaria nacional de combate ao racismo do partido, do núcleo de igualdade racial da fundação Perseu Abramo e dos movimentos negros do país com suas diversas siglas partidárias, sob o comando de um dos poucos senadores negros da república, senador Paulo Paim, discutiram, resgataram, elaboraram e aprovaram diversas matérias raciais.

Entre as propostas aprovadas está o projeto de lei 5231, de 2020, que trata da abordagem de agentes públicos e privados. No Brasil 84% das pessoas mortas em ações policiais são negras, conforme dados do Anuário Brasileiro de Segurança Pública.

Outra matéria importante e simbólica no combate ao racismo, é o projeto de lei do Senado 482, de 2017, de autoria do senador Randolfe Rodrigues e relatoria do senador Paim, que cria o feriado Nacional do Dia Vinte de Novembro, Dia Nacional de Zumbi e da Consciência Negra. No país, apenas 1100 dos 5570 municípios brasileiros, incorporam o dia, como feriado nacional. Acolher uma legislação federal, que assegure a absorção desse dia de reflexão e ação em todos os municípios do país, significa exercer na prática a própria lei 11.645, de 2008, que incluiu no currículo da Rede de Ensino a obrigatoriedade da temática “História e Cultura Afro-Brasileira e Indígena, tão pouco aplicada no país.

Entre as mais de treze proposições aprovadas no período podemos citar a aprovação da Convenção Interamericana contra o Racismo, a Discriminação Racial e Formas Correlatas de Intolerância, que tem status de emenda constitucional e fortalece ainda mais o compromisso do Brasil e sua conexão com o mundo no combate ao racismo.

A aprovação desses e outros projetos no Senado refletem o acalantar da esperança no combate ao racismo, e que a Câmara Federal se comprometa, em concluir o ciclo de aprovações, para que se tornem leis. Não podemos apagar um momento tão singular da história do país.

A tempestade de horrores e a névoa de retrocessos estão passando, pois o povo brasileiro reafirmou a sua missão com o amor e a rejeitou o ódio, contudo os desafios da terra arrasada são tremendos e a efetivação de políticas raciais são um deles.

Neste momento, o atual governo está em diálogo com a equipe do presidente eleito, a chamada transição, que objetiva propiciar condições para que o candidato eleito para o cargo de Presidente da República, o Presidente Lula, possa receber de seu antecessor todos os dados e informações necessárias à implementação do programa do novo governo, desde a data de sua posse.

Uma das ações da equipe de transição é a implantação dos grupos técnicos temáticos, como de mulheres, economia, saúde, trabalho, educação, igualdade racial e outros. Um dos objetivos dos grupos é o resgate e a formulação de políticas públicas para o novo governo.

Ter um grupo técnico racial interligado em suas transversalidades com os outros grupos temáticos, para pensar, propor e implantar políticas públicas de promoção da igualdade racial, para além da área de atuação, é de extrema importância, não apenas para o povo negro, mas para o Brasil, que deseja se desenvolver em sua plenitude, sem deixar ninguém para trás.

Hoje, a população negra corresponde a 56% da população brasileira, que por quase quatrocentos anos viveu calcada na escravidão. Promover a igualdade racial, é promover um futuro de avanço e prosperidade para todas, todos e todes. Axé, saúde e muito amor.

Maria Isabel Sales, jornalista, formada em direito, especialista em direito legislativo e assessora legislativa e racial no Senado Federal

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