Entrevista

“Transformar a vacina em disputa política é um grande equívoco”

Em entrevista, o senador Paulo Paim adverte que temas como Covid-19, racismo, desemprego, direito dos trabalhadores, custo de vida, meio ambiente, democracia e governabilidade ainda vão dominar o debate público em 2021. E se compromete a buscar respostas a todo esse cenário de incertezas
“Transformar a vacina em disputa política é um grande equívoco”

Foto: Jefferson Rudy/Agência Senado

Gaúcho de Caxias do Sul e tendo iniciado sua vida política em Canoas, na região metropolitana de Porto Alegre, Paulo Paim é um dos mais atuantes e reconhecidos parlamentares do Brasil. Nesta entrevista, ele expõe algumas reflexões sobre 2020 e traça uma perspectiva para 2021. Segundo ele, o país só sairá da crise a partir da construção de políticas humanitárias.

Em agosto, ele foi o senador mais bem avaliado pela votação popular, via internet, do Prêmio Congresso em Foco. O MIPAD (Most Influential People of African Descent), ligado à ONU, o elegeu um dos cem negros mais influentes do mundo em 2020.

Qual a sua avaliação sobre o ano de 2020? 

O Brasil passa por uma das piores crises da sua história: na economia, no social, na saúde, na educação, na política. A pandemia matou milhares; houve um descaso do governo federal. Os números do desemprego são assustadores. Falam em quase 20 milhões. Na informalidade há mais de 40 milhões. O país não cresce, empresas estão fechando e o número das que abrem é insuficiente. A inflação está corroendo o salário dos trabalhadores, os preços dos alimentos, do gás, da luz, dos remédios e da gasolina dispararam. O governo acabou com a política de valorização do salário mínimo. A classe média perde poder aquisitivo. Direitos sociais históricos estão sendo desconstruídos. Os jovens do nosso país estão sendo sacrificados em seus sonhos, não há perspectiva de futuro. Temos hoje mais de 60 milhões de pessoas vivendo na pobreza e na extrema pobreza. 

Infelizmente, a questão da vacina virou uma disputa política. Isso está completamente equivocado. Quantos precisarão morrer para os governantes entenderem que em primeiro lugar está a saúde e a vida das pessoas?  A intolerância racial e religiosa, a homofobia, a violência contra as mulheres, o trabalho escravo avançam. Tudo isso é muito assustador. Onde vamos parar? Não é este o Brasil que nós queremos. Não podemos nos calar com tantas injustiças e erros.

Como foi a relação do seu mandato com a sociedade?

A nossa produção legislativa, a partir do diálogo com a sociedade, procurou dar respostas a todo esse cenário de incertezas e de muita tristeza. Apresentamos mais de 50 projetos, ações legislativas, com objetivo de melhorar a vida das pessoas, garantir o bem-estar e a saúde de todos. Entre eles: o 14º salário aos aposentados e pensionistas, a prorrogação do seguro desemprego, apoio às micro e pequenas empresas, garantia de EPI’s a todos os profissionais de saúde. 

Relatamos matérias importantes, como a Medida Provisória 919/2020, que garantiu o salário mínimo em R$1.045,00, refletindo a inflação integral relativa ao ano de 2019. Conseguimos aprovar no Senado o PLS 787/2015, que aumenta a pena por crime de preconceito e racismo; o PL 5231/2020, que veda a conduta do agente público de segurança ou do setor privado por preconceito; o PL 2179/2020, sobre marcadores étnicos raciais e combate às subnotificações. A regulamentação da profissão de historiador, projeto também de nossa autoria, foi sancionada e virou lei federal. 

Lançamos a campanha “Dez medidas de combate ao racismo e aos preconceitos” e demos início à construção da Frente Parlamentar Mista Antirracista. Fui designado pelo presidente Davi Alcolumbre relator do PDL 562/2020, que ratifica a Convenção Interamericana contra o Racismo, a Discriminação Racial e Formas Correlatas de Intolerância. Aprovamos no Senado o Fundeb público, o que foi uma grande vitória da educação. Realizamos mais de 150 lives com entidades, movimentos sociais, sindicatos, associações, especialistas. A Comissão de Direitos Humanos, a qual eu sou presidente, manteve conversa com toda a sociedade, debatendo e recebendo sugestões de leis.

O que esperar para 2021?

O próximo ano será tão difícil ou mais do que 2020. A população está sofrendo, não sabe o dia seguinte, se terá algo para comer, se estará empregada ou desempregada, se será agredida pela cor da pele. Nas eleições municipais a população deu o recado nas urnas. Não é com ódio e violência que os problemas brasileiros serão resolvidos. Ela entendeu que os espaços políticos precisam ser compostos pela diversidade do nosso povo, com mais mulheres, negros e jovens. Portanto, a nossa responsabilidade é cada dia maior. Os Poderes Constituídos não podem mais continuar agindo isolados. Temos que dialogar, buscar sempre o melhor. Vamos continuar peleando em 2021. 

Temas como covid-19, racismo, discriminação, direitos humanos, desemprego, direito dos trabalhadores, mundo do trabalho, custo de vida, meio ambiente, democracia, defesa da Constituição, governabilidade continuarão na pauta. Eu sempre digo que o fácil nós fizemos ontem, que o difícil nós estamos realizando hoje e que o impossível nós alcançaremos amanhã. É preciso esperançar, ir à luta, fazer o bom combate em defesa da vida, do direito a ser feliz. O país precisa voltar a se reencontrar com o seu destino, unir todas as forças positivas, com a presença constante e participativa de jovens, mulheres, brancos, negros, indígenas, LGBTIs, empreendedores com responsabilidade social. 

Eu acredito numa Frente Ampla pelo Brasil que abrace as causas da nossa gente a partir de políticas humanitárias, que derrube os muros que estão ao nosso redor, um país com oportunidades e direitos iguais para todos. 

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