“O PT acabou”, grita a direita. Marcelo Zero, em artigo, concorda e esclarece

A mídia conservadora, agora, abriu espaço para os derrotados das eleições de outubro repetir a todo instante que “o PT acabou”. Nosso articulista também acha que sim: o PT acabou com a miséria, acabou com a fome e acabou com submissão do Brasil ao Fundo Monetário Internacional – entre outras mazelas.


O PT Acabou….

Marcelo Zero

Apesar de há poucos meses ter sido o partido que elegeu a maior bancada na Câmara Federal e de ter obtido a quarta vitória consecutiva nas eleições presidenciais, dizer que “o PT acabou” tornou-se moda.

As manifestações minguantes dos derrotados em prol do terceiro turno, devidamente estimuladas e amplificadas por uma mídia inteiramente partidarizada, acabaram por disseminar a ideia de que o PT estaria em irreversível estado terminal. Será?

Bom, na realidade, pode-se dizer a frase “o PT acabou”, de muitas formas.


O PT acabou com a miséria
.

Se não totalmente, praticamente sim. Foram cerca de 36 milhões de brasileiros que conseguiram sair da pobreza extrema, graças, entre outros fatores, a programas como o Bolsa Família. Para os manifestantes pró-Aécio e sua mídia conservadora isso não tem a menor relevância, já que eles não eram miseráveis.  Ao contrário, é algo que parece irritá-los, pois costumam se referir a esses inovadores programas sociais com epítetos carinhosos como “Bolsa-Preguiça” e “Bolsa-Vagabundo”. Contudo, no exterior tais programas são muito elogiados. Hillary Clinton, pré-candidata à presidência dos EUA pelo Partido Democrata, pretende implantar um programa semelhante nos EUA, caso eleita. Quem sabe isso não faz mudar de opinião os reacionários? Afinal, se o Bolsa Família virar moda em Miami, talvez eles comecem a achar a política social do PT algo muito chique.

De qualquer forma, o combate sem tréguas à miséria e à pobreza, nossa grande corrupção, não vai acabar.


O PT acabou com fome.

De fato, o governo do PT conseguiu tirar o Brasil do Mapa da Fome da FAO, um objetivo perseguido por gerações de brasileiros.

Para os derrotados de outubro, que sempre comeram bem, isso talvez não tenha importância.

Não obstante, para aqueles que lutavam todos os dias por um pouco para comer, isso é muito, muito importante.

Essa luta, base de qualquer outra luta, não vai esmorecer.


O PT acabou com o Brasil para poucos
, reduzindo a desigualdade.

O Brasil sempre foi, e ainda é, um país muito desigual. Mas, ao longo dos governos do PT, o Brasil passou, pela primeira vez em sua história, por um período de redução significativa, continuada e intencional da pobreza e das desigualdades.

O número de pessoas abaixo da linha da pobreza reduziu-se à metade e o índice de Gini caiu de cerca de 0,600 para cerca de 0,500.  Ascenderam à chamada nova classe média, ou nova classe trabalhadora, ao redor de 42 milhões cidadãos.

Os derrotados de outubro também não gostam muito disso. Afinal, eles já eram, em sua maioria, cidadãos plenos e grandes consumidores, antes dos governos do PT. A bem da verdade, tal revolução social e econômica os incomoda bastante. Lugares e serviços que antes eram “diferenciados”, hoje se tornaram mais “populares”, como os aeroportos e as universidades, por exemplo.  Assim, essa robusta ascensão de dezenas de milhões de brasileiros antes excluídos é vista, por parte substancial desses setores conservadores, como uma ameaça a sua identidade de classe privilegiada.

Porém, a luta contra a desigualdade, outra grande corrupção brasileira, tem de continuar e se intensificar.


O PT acabou com o desemprego muito alto e com o salário mínimo muito baixo.

Antes do PT assumir pela primeira vez o governo federal, nossas taxas de desemprego estavam em 12,5% e o sonho era se ter um salário mínimo de US$ 100,00. Além disso, havia muita precariedade no mercado de trabalho, e mais de 55% da nossa mão de obra estava inserida no setor informal.

No entanto, graças às políticas de redução da pobreza e das desigualdades e de estímulo à produção adotadas pelos governos do PT, bem como à geração de mais de 20 milhões de empregos com carteira assinada, as taxas de desemprego reduziram-se ao seu mínimo histórico (entre 5% e 6%) e o salário mínimo experimentou valorização real de mais de 72%.

Antes do período do PT, o salário mínimo correspondia a apenas 14,5% do salário mínimo ideal, conforme os parâmetros do Dieese. Hoje, esse índice já subiu para 25,3%. Além disso, a informalidade caiu para cerca de 45% da população ocupada.

É possível que, para muitos dos manifestantes pró-terceiro turno, esses avanços não signifiquem nada, pois eles não recebiam o salário mínimo e, muito provavelmente, não estavam desempregados ou inseridos precariamente no mercado laboral. É provável até que isso os incomode, pois a mão de obra brasileira tornou-se mais cara e exigente quanto aos empregos oferecidos. Mesmo as empregadas domésticas, antes tão discriminadas, obtiveram mais direitos.

O ajuste pode até reverter conjunturalmente esse quadro de melhorias, mas a estratégia de médio e longo prazo é a de consolidar e aprofundar todos esses avanços.  Esse processo não vai acabar.


O PT acabou com a universidade para uma pequena elite.

O PT abriu as portas da universidade, o grande instrumento de ascensão social no Brasil, para os pobres, os afrodescendentes, os egressos da escola pública e os índios. Com efeito, a duplicação da rede federal de ensino superior, as cotas para os que antes eram excluídos e programas como o Prouni, o Reuni e o Enem possibilitaram a entrada no ensino superior a setores da população que antes tinham muita dificuldade para ter acesso a uma universidade, pública ou privada.

Antes dos governos do PT, apenas 2,2% de pardos e 1,8% de afrodescendentes entre 18 e 24 anos cursavam ou tinham concluído um curso universitário no Brasil.

Hoje, subiu de 2,2% para 11% a porcentagem de pardos que cursam ou concluíram um curso superior no Brasil; e de 1,8% para 8,8% o percentual de negros na mesma situação.

Para os manifestantes pró-terceiro turno isso pode parecer irrelevante, pois a maioria deles não é de negros ou pobres. Na realidade, isso pode até irritá-los, pois agora é necessário concorrer com egressos da escola pública, pardos e negros por uma vaga nas universidades.

Mas, para o grosso da população do Brasil, parda, negra, pobre e frequentadora de escolas públicas, isso representa um avanço extraordinário, que precisa se expandir muito mais. Não pode acabar.


O PT acabou com o Menos Médicos.

Antes dos governos do PT, havia um programa tácito na saúde pública brasileira chamado “Menos Médicos” ou “Poucos Médicos”. Os municípios mais pobres e isolados e a população de mais baixa renda praticamente não tinham acesso a médicos, que ficavam muito concentrados nas áreas mais abastadas do país.

O Mais Médicos, implantado pelo governo do PT, vem acabando com essa situação insalubre, levando assistência básica de saúde a mais de 50 milhões de brasileiros antes desassistidos.

Nos derrotados de outubro, isso não desperta muitas simpatias, uma vez que, em sua maioria, já tinham acesso à saúde. Ao contrário, esse programa exitoso costuma incomodá-los. E por razões puramente ideológicas, pois trouxe médicos cubanos ao Brasil.

Esses excelentes médicos, infelizmente, não são capazes de curar preconceitos, ódios ideológicos e corporativismo.

Contudo, eles continuarão a lutar pela saúde dos brasileiros, com atendimento básico e, no futuro próximo, com atendimento especializado.


O PT acabou com dívida externa pública e com a dependência em relação ao FMI.

Em 2002, pouco antes do primeiro governo do PT, nossa dívida externa pública líquida estava em US$ 165 bilhões e éramos também devedores do FMI, que nos impunha seus planos recessivos. Hoje, levando em consideração as nossas volumosas reservas internacionais de US$ 372 bilhões, somos credores internacionais líquidos em mais de US$ 24 bilhões. E também somos credores do FMI, que hoje não pode nos impor mais seus receituários. Assim, somada à nova política externa “ativa e altiva”, que, entre outras coisas, elevou muito nosso protagonismo internacional e terminou com a ameaça da ALCA, o PT acabou com a falta de soberania que tanto nos afligia.

Entretanto, para quem cultiva um histórico complexo de vira-lata e escreve cartazes de protesto em inglês, esse avanço pode parecer inteiramente irrelevant e até annoying.

Não obstante, esses são avanços irreversíveis.


O PT acabou com a concessão de petróleo a empresas estrangeiras.

No regime de concessões, implantado antes da descoberta do Pré-Sal, a empresa estrangeira que descobrisse petróleo no Brasil tornava-se dona dele. Com a fantástica descoberta do pré-sal, o governo do PT implantou o regime de partilha. Nesse novo regime, aplicado às jazidas do pré-sal, a empresa estrangeira não se torna dona do petróleo que vier a descobrir. Ela apenas adquire o direito de explorá-lo, com a participação obrigatória da Petrobras. O Estado somente a remunera pela prestação de serviços. Portanto, nesse novo regime, o Estado brasileiro continua a ser dono do petróleo, que lhe permite ter o controle estratégico sobre a produção do óleo e do gás. E permitindo-lhe, também, ter uma política robusta de apoio à produção nacional de embarcações, plataformas e outros equipamentos vinculados à cadeia do petróleo.

Os que se dizem chocados com a corrupção da Petrobras não parecem se importar nada com esse avanço fundamental para o Brasil, nem com a sucessão de recordes de produção quebrados por essa grande empresa brasileira. Ao contrário, se utilizam do escândalo para enfraquecer a Petrobras e propugnar pelo fim do regime partilha. Querem, na realidade, acabar com “o petróleo é nosso”.
Já o PT, que também acabou com a venda de patrimônio público, tão apoiada pelos defensores do terceiro turno, quer manter o regime partilha e utilizar os recursos finitos do petróleo para fazer avançar a riqueza imperecível da Educação, no Brasil. Assim, não faltará progresso.


O PT acabou com a impunidade.

Os manifestantes vociferam contra a corrupção, mas querem o fim do governo que mais fez e faz para combatê-la.

O PT acabou com o “engavetador geral”, com a prática de nomear delegados, juízes e procuradores alinhados com o governo, e com a antiga fragilidade das instituições de controle. O PT também acabou com a opacidade da administração pública, mediante medidas como o Portal da Transparência e a Lei de Acesso à Informação.

Ao contrário do que acontecia no passado tão admirado pelos derrotados de outubro, o PT deu todas as condições para que a PF, as procuradorias, a CGU e outras instituições atuassem com firmeza e independência.  Somente a Polícia Federal aumentou suas operações destinadas ao combate corrupção e aos desvios de 48 para 2.226.

Por conseguinte, a maioria dos manifestantes e a mídia pró-impeachment não parecem estar realmente preocupadas com a corrupção, muito menos com a sonegação e a evasão fiscal, que causam prejuízo bem maior ao erário e ao país.

Tampouco parecem empenhados em avanços reais na democracia, pois parte expressiva deles defende o golpe, branco ou de qualquer outra cor.

Esses neoudenistas, assim como os udenistas de antanho, querem fundamentalmente o fim do governo e o fim de qualquer força política significativa de esquerda ou progressista.

Porém, o PT, apesar da grande ofensiva política das manifestações conservadoras e da mídia partidarizada, assim como das dificuldades econômicas atuais, não acabou e nem vai acabar. E não vai acabar por uma razão muito simples: o PT fez muito, mas tem muito mais por fazer.
Ainda falta fazer muito para erradicar totalmente a pobreza, para reduzir drasticamente a nossa desigualdade e para prover serviços públicos de qualidade a toda à população. Ainda falta fazer uma Reforma Política que transforme a revolução social promovida numa revolução política e limite a influência do poder econômico no sistema partidário. Ainda falta livrar a governabilidade dos grilhões sujos do presidencialismo de coalizão. Ainda falta promover um grande aumento da competividade da economia nacional, mediante a geração maciça de inovação, especialmente na nossa indústria. Ainda falta transformar este país em mutação num país plenamente desenvolvido.

Todas essas transformações que o país precisa ainda promover não acontecerão sem a contribuição decisiva do PT e das forças progressistas que apoiam seu governo. As forças neoudenistas e conservadoras não as realizarão.

O Brasil inclusivo e progressista ainda vai precisar muito do PT.
O PT só acabará se o Brasil para todos também acabar.

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