Os norte-americanos têm a tradição de sempre recorrer à história quando a ordem política está em perigo, assinala Timothy Snyder, em Sobre a Tirania. Ela não se repete, mas ensina e adverte. Todo e qualquer discurso extremista, seja qual for a sua vertente, tem o seu propósito. Sabemos onde ele principia, em que circunstância se estabelece e a qual destino quer chegar.
A democracia brasileira vem, a cada ano, forjando o seu amadurecimento e comprometimento com o país e com os seus cidadãos. Foi por meio dela que tivemos grandes avanços consagrados na Constituição. Mesmo assim, muitos sentem-se incomodados com a democracia e a Constituição. Eles as utilizam apenas para chegar ao poder e, após, de forma vil e autoritária, fazem coro ao fechamento do Congresso Nacional e do STF.
O Legislativo vem fazendo a sua parte. Várias propostas foram aprovadas para resguardar a vida das pessoas, os empregos, a renda, a sobrevivência das empresas. O problema é que o governo não faz a sua. Inclusive vetou a extensão do auxílio emergencial a várias categorias, deixando de fora 10 milhões de trabalhadores. Tenta ele esconder o seu próprio fracasso político e de gerenciamento da crise do país.
Quando se ataca a democracia e a Constituição, se fere os direitos humanos. E, ao combater a pandemia com ineficiência e menosprezo, se desrespeita os direitos humanos e a vida, se mata presentes e futuras gerações. O número de mortes de indígenas na Amazônia devido à covid-19 aumentou 800%. Nas periferias das grandes cidades, nas comunidades carentes e no sistema carcerário, a tendência é de aumentar ainda mais. Poderemos ser o epicentro do mundo.
A Comissão Interamericana de Direitos Humanos aprovou norma externando “a necessidade de os países adotarem um enfoque de direitos humanos em todas as estratégias, medidas ou políticas oficiais relacionadas à pandemia”. Os governos devem prever e atenuar os impactos negativos sobre os direitos das pessoas atingidas, em especial os mais vulneráveis, miseráveis, pobres, negros e mulheres.
Se a história nos adverte dos males das tiranias, nada mais oportuno e necessário do que seguir os seus ensinamentos e defender, intransigentemente, a democracia, a Constituição e os direitos humanos.
Artigo originalmente publicado no jornal Zero Hora