Autor do projeto (PLS nº 354/2009) conhecido como “cidadania fiscal”, por estabelecer regras para que brasileiros possam repatriar recursos mantidos no exterior, remetidos na década de 1990 quando havia falta de segurança para o patrimônio, o senador Delcídio do Amaral (PT-MS) considerou cautelosas as justificativas do presidente do Banco Central, Alexandre Tombini, para implantar mecanismos que permitam o reingresso de capital no Brasil.
Tombini disse que o repatriamento tem duas vertentes macroeconômicas, que são o fluxo de recurso para as economias, gerando abundância de dívidas num período em que as reservas estão elevadas, e o marco regulatório para a medida. “Havendo origem e dependendo do processo, o projeto tem condições de avançar, desde que os recursos tenham origem e os tributos devidos sejam cobrados”, afirmou.
Na avaliação de Delcídio, apesar da cautela, é positiva a sinalização do Banco Central em participar dessa discussão, principalmente pelo cenário econômico de dificuldades, complexo, onde economias de países da Zona do Euro estão caminhando em solavancos e se observa movimentos recentes como a valorização do dólar perante o real.
“Eu acho que nós poderíamos começar a olhar com mais atenção os projetos que encaram a repatriação de recursos não de uma maneira preconceituosa, mas discutindo alternativas que garantam a internalização de recursos obtidos honestamente e que foram remetidos para o exterior para fugir dos planos econômicos, para fugir de uma política cambial absolutamente fora da realidade”, disse o presidente da Comissão de Assuntos Econômicos (CAE).
Delcídio lembrou, inclusive, que muitos brasileiros que remeteram recursos para o exterior utilizaram, na época, um instrumento oficial por intermédio de operações CC-5, chamadas desta forma por conta da Carta Circular nº 5 do Banco Central que estabelecia as condições para remeter recursos para o exterior. “Essas operações eram devidamente autorizadas pelo BC, por isso acredito que vai chegar o momento de fazer esse debate no Congresso Nacional intensamente”, observou Delcídio.
R$ 50 bilhões
A proposta do senador Delcídio Amaral (PT-MS) conseguiu diminuir as resistências que haviam entre juízes, procuradores, auditores da Receita Federal e do próprio Banco Central. “Estima-se que existam mais de US$ 50 bilhões mantidos no exterior. Esses recursos não são apenas de operações ilícitas. Na década de 1990, pela insegurança jurídica que existia no Brasil, muitas empresas e pessoas físicas fizeram remessas ao exterior como forma de proteger o patrimônio”, afirma Delcídio do Amaral. E o momento é favorável, segundo ele, porque já não compensa financeiramente receber as ínfimas taxas de juros no mercado financeiro internacional, sem contar o risco embutido em vários países.
Chamado de “Cidadania Fiscal”, o PLS nº 354/2009 permite que os detentores de recursos, bens e direitos no exterior retifiquem a declaração do IR da pessoa física, enquanto que as empresas poderão retificar a declaração por intermédio de um agente fiduciário. “A repatriação de recursos é estimulada e não exigida”, observa.
No caso da pessoa física, ao invés de pagar a alíquota de 27,5% de IR, recolherá sem multa e juros 5% sobre o valor global dos bens e direitos recém-declarados e localizados no Brasil. O percentual será de 10% se o bem ou o direito estiver no exterior e não for repatriado. Essa alíquota cairá pela metade se a pessoa física aplicar 50% dos valores em fundos de investimentos que serão criados e aplicarão os recursos em obras de infraestrutura, para aumentar o investimento no setor.
As empresas que aderirem ao projeto deverão pagar 10% do IRPJ e 8% da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CLSS), cinco pontos percentuais acima da proposta que está na Câmara. O projeto de Delcídio prevê, ainda, que as empresas que não utilizarem esse benefício poderão atualizar a declaração de bens de seus ativos – imóveis e participações societárias – a preços de mercado, com alíquotas de 5% para o IRPJ e 4% para a CSLL.
Delcídio reconhece que, quando se fala em repatriar recursos de brasileiros mantidos no exterior, e não declarados à Receita, a polêmica pode tomar conta do debate. Entre 1980 até 2002, segundo ele, remeter divisas para o exterior era uma forma de proteção ao patrimônio, mas é claro que o projeto também envolve recursos oriundos de atos ilícitos.
Em entrevista no final do ano passado para o site da Liderança do PT no Senado, Delcídio foi enfático na defesa do projeto “Cidadania Fiscal”: “O projeto tem os mecanismos para separar o que é dinheiro de brasileiro não declarado no exterior do que é dinheiro do narcotráfico”, afirmou. Países como Itália, Turquia, Rússia, Argentina, Índia e, inclusive o estado de Delaware, nos Estados Unidos, adotaram medidas semelhantes ao projeto Cidadania Fiscal. Só a Itália, por conta da operação Mãos Limpas, na década de 90, conseguiu fazer retornar à sua economia cerca de 60 bilhões de euros. O México também adotou medidas.
Marcello Antunes
Tramitação no Senado
28/08/2009 – Matéria com a relatoria, avocada pelo então presidente da Comissão de Assuntos Econômicos (CAE), Garibaldi Alves Filho.
09/12/2010 – Relator Garibaldi Alves Filho apresenta seu relatório, pela aprovação da proposta.
14/12/2010 – Após relatório na CAE, presidente em exercício, senador Delcídio do Amaral concede vista coletiva, nos termos regimentais.
11/01/2011 – A proposta continua em tramitação e Mesa Diretora do Senado reencaminha a matéria à CAE, que aguarda designação de relator.
19/05/2011 – Mesa Diretora do Senado atende requerimento do senador Álvaro Dias (PSDB-PR) para que a matéria seja examinada pela Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) e pela Comissão de Relações Exteriores (CRE) do Senado. A matéria aguarda distribuição.
06/06/2011 – Mesa Diretora atende requerimento do senador Pedro Taques (PDT-MT) pedindo que a matéria seja analisada pela CCJ.
26/09/2011 – Mesa Diretora recebe ofício reiterando o pedido dos senadores Álvaro Dias e Pedro Taques, para que a matéria seja analisada pela CCJ.