Populações são afetadas pela mineração em Carajás

Senadora Ana Rita ouviu relatos de moradores da região que sofrem as consequências da exploração.

Populações são afetadas pela mineração em Carajás

Senadora encaminhará relatos a diversos órgãos
do Governo Federal para que problemas possam
ser solucionados (Agência Senado)

As populações que vivem ao longo do complexo siderúrgico de Carajás reclamam, sem sucesso, providências do Estado para problemas que enfrentam há décadas: poluição sonora pelos trens que dia e noite transportam minério, rachaduras nas casas pela trepidação, doenças respiratórias decorrentes da poluição do ar, atropelamentos pela falta de passarelas para cruzar a ferrovia, assoreamento de igarapés, desapropriações irregulares de terras e ruptura dos sistemas tradicionais de cultivos e criação de animais, entre outras situações.

A denúncia foi feita em audiência pública, nesta quinta-feira (21), na Comissão de Direitos Humanos e Legislação Participativa (CDH), presidida pela senadora Ana Rita (PT-ES). A reunião foi motivada pela iminente construção de nova mina na região, em empreendimento liderado pela Vale, e a duplicação da Estrada de Ferro Carajás, que corta 27 municípios e 86 comunidades quilombolas e populações indígenas no Pará e no Maranhão.

Os problemas constam de relatório apresentado na audiência pela pesquisadora Cristiane Faustino, da entidade Direitos Humanos Econômicos, Sociais, Culturais e Ambientais da (Plataforma DHESCA), que também apresenta recomendações à Vale. Convidada para o debate, a mineradora não mandou representante.

Faustino explicou que o projeto da nova mina permitirá mais que dobrar a produção de ferro do complexo de Carajás, passando das atuais 110 milhões de toneladas ao ano para 230 milhões de toneladas. Como enfatizou, a geração dessa riqueza pela atividade de mineração tem sido acompanhada da violação sistemática dos direitos das populações que vivem nesse território.

“As populações afetadas pela atividade mineradora, causadora de muitos impactos, são muitas vezes invisibilizadas. Há grande desencontro entre o discurso do desenvolvimento e a situação concreta enfrentada pelas comunidades que vivem na região”, explicou.

Para o advogado Guilherme Zagallo, da rede Justiça nos Trilhos, a situação revelada no relatório da DHESCA é fruto do descaso com que são tratadas as populações afetadas pela mineração.

“A buzina dos trens, de dia e de noite, interfere em atividades escolares e interfere no sono das pessoas. Imagine alguém conseguir trabalhar no outro dia tendo sido acordado três ou quatro vezes de noite, por uma buzina ferroviária. As rachaduras nas casas, causadas pela vibração. Esses problemas têm sido recorrentes e o Estado brasileiro tem tido um tratamento muito pequeno”.

No debate, Edson Faria Melo, represente do Ministério das Minas e Energia, reconheceu que muitos dos problemas relatados decorrem da falta de diálogo com a população, ainda no início da atividade mineradora da Vale.

Desapropriações
Para completar o relato, o líder quilombola Justo Evangelista Conceição contou que muitas famílias desalojadas com a abertura da ferrovia até hoje esperam pela regularização das terras. Por temer que a duplicação da ferrovia agrave o problema, ele cobrou a conclusão do processo de titulação de terras, pelo Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), mas ficou sem resposta, pois o órgão não enviou representante ao debate.

Justo Evangelista contou ainda que a atividade mineradora afetou toda a estratégia de sobrevivência das populações tradicionais.

“Antes dessa estrada, havia quantidade de pássaros, tinha guará, gado, caranguejo à vontade, manguezais. A Vale mexeu em tudo, foram embora os peixes, os pássaros, os manguezais se acabaram. E não temos mais como fazer criações”, disse.

Também relatou problemas de exploração sexual de menores e prostituição que acompanham a instalação de acampamentos para acomodar o grande número de trabalhadores mobilizados para as obras na mina e na ferrovia.

Zagallo e Evangelista cobraram a instalação de infraestrutura para travessia de carros e pedestres sobre a ferrovia, há muito prometida pela mineradora. Eles explicaram que a passagem de carros fica frequentemente bloqueada pelo movimento dos trens, fazendo com que doentes fiquem sem socorro médico e crianças sem poder ir à escola, ocorrendo ainda muitos atropelamentos.

“Já aprovamos, no âmbito do Ibama, a construção de algumas passagens, só não sei se as obras começaram”, informou Eugênio Pio Costa, representante do Ibama.

Tributação
Para Guilherme Zagallo, uma das dificuldades para o atendimento das demandas da população decorre do fato de a mineração no Brasil ser pouco tributada, beneficiando as empresas, mas não resultando na geração de recursos que beneficiem o conjunto da sociedade. Nesse aspecto, pode ser considerada uma atividade subsidiada por outras atividades econômicas, uma vez que prefeitos, governadores e a União precisam buscar em outros setores os recursos necessários para mitigar os impactos sociais e ambientais da mineração.

“Isso que para alguns é chamado de desenvolvimento, para parcela da população é chamado de sofrimento, é a triste realidade da convivência desses empreendimentos, que tornam invisíveis as dificuldades da população”, disse.

Para buscar uma solução para os problemas relatados na audiência, a senadora Ana Rita informou que o relatório da DHESCA e as notas taquigráficas da audiência pública serão enviados à Presidência da República, ao Ministério das Minas e Energia, Incra e Ministério Público.

Com informações da Agência Senado

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