No dia em que o Tribunal de Contas da União (TCU) deve definir o destino da Eletrobras, o senador Jean Paul Prates (PT-RN), líder da Minoria, alertou para a pressa do governo Bolsonaro em concluir o processo de privatização da empresa.
Além de comprometer a soberania nacional com a venda de uma empresa estratégica, o senador apontou que o governo tem trabalhado com um valor subestimado para o processo de venda da companhia. Pelas contas da Associação dos Engenheiros e Técnicos do Sistema Eletrobras (Aesel) e da Associação dos Empregados da Eletrobras (Aeel), a empresa vale, no mínimo, R$ 400 bilhões e o governo quer vender por apenas R$ 67 bilhões. Além disso, caso o processo de privatização seja concluído, a tendência é de que o valor das contas de luz para os consumidores aumente.
“Não foi apresentado nenhum estudo de impacto tarifário. Estão fazendo esse processo sem nenhuma ideia de quanto isso vai custar aos consumidores. A gente não sabe qual impacto desse processo na tarifa de energia. E isso é gravíssimo. Não se faz nada sem saber qual o impacto. E estão fazendo isso [vender a Eletrobras] por causa da pressa”, alertou Jean Paul.
A Eletrobras controla 233 usinas que produzem um terço da energia consumida no Brasil, com mais de 70 mil quilômetros de linhas de transmissão. Para o senador, não faz o menor sentido, depois de tanto investimento público, repassar toda essa infraestrutura para a iniciativa privada.
“Vender essa estrutura que o Brasil construiu com dinheiro público, políticas públicas e planejamento sob o argumento de que essa empresa perdeu espaço para a iniciativa privada é de uma falta de senso absurdo. E essa justificativa não colaria em nenhum outro país do mundo”, disse.
De acordo com Jean Paul, o objetivo da abertura para investimento privado nos setores estratégicos era, justamente, complementar o investimento público. Mas o governo atual alega, de maneira falsa, que o Estado perdeu a sua capacidade de investimento no setor para justificar a venda.
“Isso é uma mentira. A Eletrobras foi impedida de participar de diversos leilões por uma política deliberada de diminuição da sua capacidade de investimento. É pela Eletrobras que nós fazemos redirecionamento de políticas sociais, ajudamos distribuidores em dificuldade, como foi o caso do Amapá recentemente, abrimos novas possibilidades de fornecimento e geração de energia. O mundo está discutindo a transição energética e é necessário investir em pesquisa e desenvolvimento com um prazo muito longo. E acionistas imediatistas e especuladores não têm interesse em bancar esses investimentos”, alertou. “Temos 76 mil quilômetros de linhas de transmissão que cobrem o Brasil todo. Tudo isso está à venda por um preço vil e subestimado. É isso que representa vender a Eletrobras”, completou o senador.
Mobilização em defesa da Eletrobras
Diversos setores da sociedade civil estão organizados em defesa da Eletrobras enquanto o governo Bolsonaro se esforça para entregar mais um patrimônio público. Na última terça-feira (17) os integrantes da Frente Parlamentar de Recursos Naturais e Energia se reuniram com representantes de entidades para debater alternativas que possam aprimorar as regras do setor energético no Brasil.
Uma das alternativas apresentadas foi a aprovação do Projeto de Lei 414/2021. O texto aprovado no Senado ainda em fevereiro do ano passado aguarda deliberação na Câmara dos Deputados. A proposta a proposta abre caminho para a expansão do mercado livre de energia. Além disso, permite a portabilidade da conta de luz entre as distribuidoras, o que, segundo senadores e especialistas do setor, pode trazer vantagens para o consumidor como a redução na tarifa.
“As mudanças vão permitir aos consumidores que adquiram, por exemplo, energia elétrica de empresas que coloquem preços mais baratos mesmo que não sejam as distribuidoras oficiais na cidade ou no estado. O projeto já foi aprovado pelo Senado e deve ser votado logo pelos deputados”, defendeu Jean Paul.
Para evitar que o consumidor seja enganado em relação aos preços, o projeto prevê que, na fatura das distribuidoras, sejam informados, de forma separada, o valor da energia elétrica fornecida e o valor do transporte, de forma a garantir transparência. É como se o consumidor passasse a ter duas faturas: uma relacionada à energia elétrica gerada para atendê-lo, paga ao gerador, e outra referente ao serviço de transporte, paga à distribuidora. Hoje, na prática, o consumidor já paga essas duas faturas para a distribuidora.
Em outra frente, entidades do setor registraram queixa contra a empresa na Security Exchange Commission (SEC), a Comissão de Valores Mobiliários dos Estados Unidos. Na ação, homologada ontem, a Aeel, a Associação dos Empregados de Furnas (ASEF) e o Coletivo Nacional dos Eletricitários (CNE) alegam que os acionistas da Eletrobras não foram devidamente informados sobre valores que Furnas, subsidiária da estatal, terá que despender com a usina de Santo Antônio em um processo de arbitragem envolvendo a hidrelétrica. Como a Eletrobras negocia ações na Bolsa de Nova York, está sujeita às regras estadunidenses.
Os representantes dos eletricitários apontam ainda que eventual sonegação de informações “tem vínculo direto com a pressa da direção da Eletrobras em privatizar a companhia a qualquer custo”.
Desde o começo do ano, entidades que representam os servidores públicos da Eletrobras já protocolaram na Justiça Federal 25 ações questionando a privatização.
Na última terça-feira (10), a Comissão de Infraestrutura (CI) do Senado aprovou dois requerimentos para a realização de audiências públicas para tratar da privatização da Eletrobras, ambos sugeridos pelo líder da Minoria na Casa, Jean Paul Prates (PT-RN). O senador quer analisar as consequências do negócio para a Itaipu Binacional e para a Eletronuclear.