A Comissão e Constituição e Justiça (CCJ) aprovou nesta terça-feira (6), após um dia inteiro de discussões e tentativas da base bolsonarista de adiar a votação, a Proposta de Emenda à Constituição (PEC 32/2022) — conhecida como PEC do Bolsa Família — para evitar a paralisação do pagamento dos programas sociais para o ano de 2023.
A proposta, negociada pela equipe do governo de transição, teve três mudanças do relatório apresentado no início da reunião pelo senador Alexandre Silveira (PSD-MG), relator da PEC.
O valor que ficará fora do teto de gastos para a manutenção do pagamento dos R$ 600 para o Bolsa Família saiu dos R$ 175 bilhões para R$ 145 bilhões. Outra mudança foi o período de vigência da excepcionalidade para a medida, reduzida de quatro para dois anos. Por fim, o prazo para o governo do presidente eleito Lula encaminhar ao Congresso a proposta de um novo regime fiscal, que substituirá o teto de gastos, passou de um ano para sete meses.
O texto aprovado ainda proíbe o futuro governo de aumentar despesas acima do que foi gasto no ano anterior acrescido da inflação.
O senador Jaques Wagner (PT-BA), ao rebater membros da base bolsonarista, explicou que a decisão do presidente eleito pela PEC do Bolsa Família foi uma forma de privilegiar a política e dar mais segurança aos investidores estrangeiros a partir de uma saída negociada que impedisse a paralisação do Brasil no próximo ano, tendo em vista que o orçamento apresentado pelo governo atual foi classificado por vários senadores como inexequível.
“Para oferecer ao país e aos investidores estrangeiros uma estabilidade maior, o presidente eleito preferiu se arriscar e prestigiar a política. Por isso estamos fazendo [por meio da PEC]. É claro que ele poderia abrir crédito extraordinário. Mas a opção foi pela saída política, o esforço que o presidente eleito tem feito no sentido do desafio que ele tem pelas carências da nossa gente. É melhor para a economia brasileira aprovar algo com mais perenidade”, explicou Wagner.
O senador Rogério Carvalho (PT-SE) também rebateu as críticas feitas pelos apoiadores do atual governo de que a aprovação da medida geraria mais inflação. Ele lembrou aos colegas que o governo Lula, durante oito anos, foi exemplo de responsabilidade econômica e fiscal.
“Os governos do presidente Lula sempre mantiveram o superávit primário. Foi no governo do presidente Lula que construímos a maior reserva externa que o Brasil já teve. E no governo do presidente Lula, o Brasil mudou o perfil da sua dívida. Saiu de uma dívida em dólar, para uma dívida em real. Então, precisamos levar essas questões em consideração”, disse.
O senador ainda destacou o fato de o processo inflacionário vivido pelo Brasil nos últimos anos ser resultado direto do desastre promovido pelo governo Bolsonaro na condução da economia.
“Nosso processo inflacionário não é somente por uma questão fiscal, é muito mais em decorrência do desastre que foi a reindexação da economia. Por adotar, por exemplo, paridade internacional de preços de combustíveis. Nós não somos um país pequeno. Somos um país grande, com uma economia grande. E este valor proposto [para a PEC do Bolsa Família] não é nada que não possa ser absorvido. Precisamos garantir que o Brasil volte a andar”, concluiu.
Após a aprovação de medida na CCJ, a proposta segue para análise do plenário do Senado. Para avançar e ser analisada pela Câmara dos Deputados, a PEC do Bolsa Família precisa do apoio de 49 senadores, em dois turnos de votação.
Tentativa de melar votação
Os senadores Carlos Portinho (PL-RJ), líder do governo Bolsonaro, além dos colegas Flávio Bolsonaro (PL-RJ) e Eduardo Girão (Podemos-CE), tentaram enterrar a PEC do Bolsa Família usando diversas artimanhas ao longo da discussão.
Ao final da tarde, quando o presidente da CCJ, senador Davi Alcolumbre (União-AP), anunciou a votação da PEC, os três governistas apresentaram um pedido para realização de audiência pública. Caso fosse aprovado, o requerimento praticamente acabaria com as possibilidades de votação da proposta neste ano, já que ela precisa ser aprovada no Senado e na Câmara antes do recesso constitucional. A tentativa de sepultar a votação foi derrotada por 16 a 10.
PEC ameniza desastre Bolsonaro
Para evitar a completa paralisação do Brasil pela incompetência demonstrada por Bolsonaro que já impactou o funcionamento diversos serviços públicos e prejudicou milhões de brasileiros, o relator da PEC do Bolsa Família incluiu no texto a autorização para a gestão do Bolsonaro gastar R$ 23 bilhões, obtidos a partir de excesso de arrecadação em 2022.
Assim, o atual governo poderá pagar a realização de perícias, honrar compromissos da Previdência Social, emitir passaportes, desbloquear os recursos das universidades públicas, entre outras ações.
Confira outros pontos da PEC do Bolsa Família
* Auxílio Gás: O relator acatou emenda para dispensar o governo de cumprir regra da Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) obrigando a indicação da fonte de receita no caso de aumento de despesas com o Bolsa Família e o Auxílio Gás.
* Desvinculação de receitas: O texto também prevê a prorrogação, até o final de 2024, da chamada Desvinculação de Receitas da União (DRU). Atualmente, a desvinculação tem previsão de acabar no fim de 2023.
* Exclusão do teto de gastos dos seguintes compromissos:
– despesas custeadas com recursos de operações financeiras com organismos multilaterais dos quais o Brasil faz parte, destinados a financiar ou garantir projetos de investimento em infraestrutura;
– despesas com projetos socioambientais ou relativos às mudanças climáticas custeadas por recursos de doações, bem como despesas com projetos custeados com recursos de acordos judiciais ou extrajudiciais em função de desastres ambientais;
– despesas das instituições federais de ensino custeadas por receitas próprias, de doações ou de convênios celebrados com demais entes da Federação ou entidades privadas;
– despesas custeadas por recursos oriundos de transferências dos demais entes da Federação para a União destinados à execução direta de obras e serviços de engenharia.