Doação de empresas para campanhas é contra a Constituição

Renan Aguiar, da PUC-RJ, diz que STF deveria julgar logo o fim do financiamento empresarial, cuja ação está na gaveta de Gilmar Mendes há de dez meses

Os possíveis efeitos perversos da proposta, como o aumento do caixa 2 de campanha, não constituem argumento suficiente para que se abdique do ideal democrático, mas têm sido o refúgio daqueles que desejam manter o desequilíbrio de forças entre os grandes financiadores de campanha e o eleitor comum.

A presença das contribuições de empresas às campanhas eleitorais fere o princípio constitucional da igualdade, permitindo que empresas utilizadas para o financiamento de candidatos e de partidos determinem, ainda que maneira indireta, os resultados das eleições e reduzindo drasticamente a influência do cidadão. A afirmação é do professor de Políticas Públicas da Pontifícia Universidade Católica (PUC) do Rio de Janeiro, Renan Aguiar, em artigo publicado na edição desta segunda-feira (9) no Jornal O Globo.

O professor lembra que diante da omissão do Legislativo em avançar em uma reforma política que afasta a influência econômica dos processos eleitorais, a saída é aguardar a conclusão do Supremo Tribunal Federal sobre a ação apresentada pelo Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil — a matéria já recebeu a maioria dos votos da Corte, mas a decisão está suspensa por um pedido de vistas do ministro Gilmar Mendes, que está “examinando a questão” há dez meses. Segundo O Globo, em editorial de contraponto ao artigo, “pode-se, com isso, ganhar tempo para uma discussão mais profunda” sobre o tema.

O que o jornal não nega é que as contribuições de empresas às campanhas eleitorais tem sido um foco permanente de escândalos de corrupção e de atrelamento das decisões da administração pública aos interesses privados dos grandes financiadores dos candidatos que alcançam a condição de governantes e legisladores.

Veja a íntegra do artigo do professor Renan Aguiar:

Debate maduro

Por Renan Aguiar, mestre em Teoria do Estado, professor de Políticas Públicas da PUC-RJ

Em 2011, o Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil propôs uma ação judicial perante o Supremo Tribunal Federal para tornar inconstitucionais as doações de pessoas jurídicas a campanhas políticas.

De lá para cá, apesar da interrupção do julgamento — em razão do pedido de vista feito pelo ministro Gilmar Mendes —, há fortes expectativas sobre a matéria e o resultado final do processo.

O debate, já maduro entre os constitucionalistas brasileiros, ocupa diversos espaços sociais, pressionando o Poder Legislativo a caminhar para uma inevitável reforma política.

No entanto, a inércia do legislador levará mais uma vez à judicialização política no Brasil, impondo à Suprema Corte a realização desta pequena, mas significativa, reforma eleitoral.

As diversas definições de financiamento das campanhas eleitorais, presentes nos atuais projetos de reforma política, estão sob a mira de todos os holofotes e provocam debates acirrados.

Nesta discussão, a necessidade de elaboração de normas que ponham fim à corrupção eleitoral é um consenso público que, sob orientação de princípios constitucionais, em especial o da igualdade, encontra repercussão na produção de nosso legislador excepcional, o Supremo Tribunal Federal.

A igualdade, um princípio liberal fundamental de todas as democracias ocidentais, apresenta-se hoje divorciada dos pleitos eleitorais. Empresas são utilizadas para o financiamento de candidatos e de partidos, determinando, mesmo que de maneira indireta, os resultados das eleições e reduzindo drasticamente a influência do cidadão.

A nítida desigualdade entre o empresário que vota e distribui grandes volumes de recursos e o cidadão comum que — além de seu voto e de suas convicções — pouco possui viola o próprio sentido da democracia.

Os possíveis efeitos perversos da proposta, como o aumento do caixa 2 de campanha, não constituem argumento suficiente para que se abdique do ideal democrático, mas têm sido o refúgio daqueles que desejam manter o desequilíbrio de forças entre os grandes financiadores de campanha e o eleitor comum.

É certo que o pensamento elitista pode discordar da necessária existência de paridade entre os ricos e a maioria da sociedade, especialmente nas eleições, mas felizmente este não parece ser o posicionamento ideológico da atual composição de nossa Corte Suprema, como também não encontra abrigo na compreensão média da sociedade.

To top