Para Lindbergh Farias, o Senado precisa tomar a decisão política de enfrentar as desavenças em torno do ICMS e da convalidação dos convênios estaduais.
Debate com Mantega pode apressar votação |
O Senado Federal promoveu nesta quinta-feira (24) mais uma reunião temática, desta vez com a presença do ministro da Fazenda, Guido Mantega, para debater o pacto federativo e, mais especificamente, a necessidade de promover a reforma do ICMS cujo objetivo central é acabar com a famigerada guerra fiscal entre os estados. O senador Lindbergh Farias (PT-RJ), presidente da Comissão de Assuntos Econômicos (CAE), propôs um cronograma de votação de projetos fundamentais para garantir segurança jurídica aos investimentos que estão engavetados e dependem de uma sinalização para saírem do papel.
Há um imbróglio que envolve a reforma do ICMS e cabe ao Senado, na avaliação de Lindbergh, a decisão política de enfrentá-lo. Assim, na terça-feira (29), a CAE deverá analisar o PLP nº 238/2013 que muda o indexador da dívida dos estados, do atual IGP-DI mais 6%, 7,5% e 9% ao ano para o IPCA mais 4% ou Taxa Selic, o que for menor. Os estados e municípios com dívidas com a União apoiam esse projeto encaminhado no começo do ano pela Presidência da República, tanto é que foi votado ontem pela Câmara dos Deputados.
Também na terça-feira, a CAE deve votar o PLS nº 106/2013 que é parte condicionante da Resolução nº 1/2013, que muda as atuais alíquotas do ICMS de 7% e 12% para 4% e 7% – essa resolução está pronta para ser votada no plenário do Senado. O projeto 106, por exemplo, cria o fundo de compensação das perdas que eventualmente possam ocorrer com a redução dessas alíquotas. E também cria um fundo de desenvolvimento regional para substituir a prática até então feita pelos estados que consiste na concessão de benefícios e incentivos fiscais com o ICMS, o que culminou nos últimos anos na guerra fiscal entre os estados. Nesse pacote, também há um esforço político para votar a PEC nº 197/2013 que trata das alíquotas do ICMS incidentes no comércio eletrônico, que já movimenta mais de R$ 20 bilhões por ano. Acontece que, hoje, os estados para adquirem as mercadorias não recebem um centavo do ICMS, que fica na origem dos estados que detém os centros de distribuição.
Para o senador, a sessão temática de hoje |
O último eixo desse pacote – e um dos mais importantes e motivadores da guerra fiscal – diz respeito à convalidação pelo Conselho Nacional de Política Fazendária (Confaz) dos incentivos do ICMS concedidos pelos estados mas que foram considerados inconstitucionais pelo Supremo Tribunal Federal (STF).
Lindbergh lembrou que 24 estados reunidos na última semana concordaram com os termos do acordo de convalidação, mas como três estados manifestaram contrariedade – Goiás, Santa Catarina e Ceará – a negociação ficou paralisada, já que no Confaz há exigência de votação unanimidade para qualquer decisão. “Quero chamar atenção de todos – e sinceramente não sei se todos têm a dimensão e até a cobertura especializada dos principais jornais – do tamanho da crise que estamos enfrentando em relação à convalidação dos incentivos”, disse Lindbergh.
Ele informou que representantes de multinacionais dizem que quando vão discutir investimentos com a matriz questionam se os investimentos não serão afetados caso o STF publique uma súmula vinculante tornando todos os incentivos fiscais nulos. “Não é só a insegurança jurídica pela possibilidade de edição de uma súmula vinculante, as multas são fatos concretos que estão acontecendo. Há empresas que já passaram da época do recurso administrativo e estão tendo que pagar multas no valor de até US$ 2 bilhões, que têm que ser pagos em juízo ou fiança bancária. E os bancos não aceitam cobrir uma fiança desse montante.
Mais grave, as empresas agora vão ter que informar na bolsa seus passivos e isso interfere nas ações”, alertou Lindbergh.
Para o senador, a sessão temática de hoje funcionou como um recado aos secretários de Fazenda, que estão debruçados em chegar ao consenso até a próxima terça-feira (29). Os secretários dos 27 estados abriram uma negociação virtual que encerra nesta data. “Devo dizer que esta é uma casa política. Quem precisa de unanimidade para colocar em votação é o Confaz. No Senado Federal, nós não precisamos de unanimidade, precisamos construir uma maioria política. Então, se 24 estados concordam com isso e aceitam o acordo, nós temos aqui condições políticas de colocar em votação”, disse ele.
Pinheiro defendeu a urgência da votação do |
Sessão Temática
A reunião de hoje com a presença do ministro da Fazenda, Guido Mantega, no plenário do Senado, foi uma sugestão apresentada no começo do mês ao presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL) pelo senador Walter Pinheiro (PT-BA) que tem o seguinte entendimento sobre a urgência da reforma do ICMS: “Há uma expectativa de se resolver a partir da resolução (uniformiza as alíquotas do ICMS), mas é óbvio que tem a conversa com os estados, onde há um movimento que busca o consenso sobre os incentivos no Confaz. Se isso não for atingido, nós vamos fazer como fizemos na resolução do ICMS dos portos, do FPE, ou seja, quando não há consenso, quem define as matérias é o plenário”, afirmou.
Pinheiro reconhece que o projeto (PLS nº 106/2013) que cria o fundo de compensação e o de desenvolvimento regional pode ser questionado futuramente porque se discute se tais fundos devem ser criados por um projeto exclusivo de autoria da Presidência da República ou por uma Proposta de Emenda Constitucional. “Essa é uma polêmica central. Não há como consagrar uma resolução que trate do ICMS com alíquotas de 4% e 7% sem que haja os fundos de compensação e desenvolvimento regional. Portanto, essa matéria depende da relação com o governo quando da votação nas duas casas”, disse Pinheiro.
“Se não entendermos o momento que estamos |
O senador Delcídio do Amaral (PT-MS) lembrou que já se vão quase três anos de discussão da reforma do ICMS e cada dia que passa aumenta mais a insegurança jurídica. “Se não entendermos o momento que estamos vivendo e o risco, sem dúvida nenhuma, teremos muitas dores de cabeça ao longo dos próximos meses. Isso é ruim para o Brasil, não é só ruim para os estados; é ruim para nossa economia, é ruim para nosso futuro. A iniciativa da Comissão de Assuntos Econômicos é fundamental para que retomemos esse processo e encontremos uma saída nas próximas semanas. Este é o maior desafio do Congresso Nacional”, afirmou.
Delcídio lamentou que na reunião do Confaz não houve o consenso esperado em torno da convalidação dos incentivos fiscais considerados ilegais pelo STF. Ele observou que o posicionamento contrário de Santa Catarina dizia respeito à resolução aprovada pelo Senado e que mudou as alíquotas do ICMS de importação e acabou com a guerra dos portos.
“Estivemos no ministério da Fazenda e depois entendemos que o problema de Santa Catarina não estava associado ao projeto do ICMS. Santa Catarina estava preocupada com a guerra dos portos, de um acordo com o BNDES feito na ocasião. Portanto, nós estamos misturando as coisas. Nós não podemos misturar essas coisas, até pelo que representa essa reforma. Alguém falou em fazer uma reforma tributária ampla. Só que a reforma tributária ampla não funcionou no Brasil exatamente por ser ampla demais. Se atacarmos o ICMS, que é o imposto que talvez seja o fator corrosivo da matriz tributária brasileira, isso representaria 70% de uma reforma tributária. É um avanço extraordinário”, enfatizou Delcídio, também cobrando esforço do presidente do Senado para negociar a rápida aprovação da PEC 197/2013, de sua autoria, que dá melhor distribuição do ICMS praticado no comércio eletrônico.
Suplicy sugeriu que a tributação e-commerce |
O senador Eduardo Suplicy (PT-SP), por sua vez, citou nota técnica do secretário de Fazenda do estado de São Paulo, Andrea Calabi, dizendo que a PEC do comércio eletrônico, quando foi apresentada, o cenário da reforma do ICMS era diverso do panorama atual, ou seja, “o estado de São Paulo, neste contexto de um cenário de redução das alíquotas interestaduais a 4% e compensação das perdas de arrecadação, seria aceitável que fosse incluída nas discussões da reforma do ICMS a mudança nas regras constitucionais aplicáveis às vendas interestaduais destinadas a consumidor final não contribuinte do ICMS, objeto da PEC 197. São Paulo aceitou incluir a discussão da PEC 197 no âmbito da reforma do ICMS em conjunto com as demais iniciativas, para viabilizar as negociações de temas tão complexos, mas não concorda com sua votação de forma isolada”, disse Suplicy.
O senador, no entanto, fez questão de salientar que Andrea Calabi e o próprio governador Geraldo Alckmin concordam com a PEC do comércio eletrônico desde que haja a correspondente compensação das perdas.
O senador Delcídio do Amaral lembrou que o texto da PEC 197/2013, que tramitou no Senado com o número PEC 103/13, foi negociado exaustivamente, inclusive com a bancada de São Paulo e o secretário Andrea Calabi. “Só que, depois, surpreendentemente, aquilo que foi acordado aqui não valia e que não foi esse o entendimento. Ora, esse projeto passou pela CAE e pela Comissão de Constituição e Justiça (CCJ). Portanto, é incompreensível que um entendimento que aqui houve – nós aprovamos, depois, por unanimidade – agora não valha, e inclusive em plenário”, observou.
Mesmo que não haja acordo no Confaz, a tendência para a próxima semana é ocorrer aquilo que o senador Lindbergh está defendendo: colocar a matéria em votação, nos moldes de como aconteceu com a reforma do ICMS de importação, que acabou com a guerra dos portos. A batalha foi dura, mas valeu a pena.
Marcello Antunes
Veja a entrevista do senador Walter Pinheiro
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