Meio Ambiente

Relatório aponta incentivo à grilagem de terras pelo governo

Texto assinado por Fabiano Contarato (PT-ES) e aprovado pela CMA traz radiografia da ocupação ilegal de terras públicas no país
Relatório aponta incentivo à grilagem de terras pelo governo

Foto: Alessandro Dantas

O relatório de avaliação faz parte do calendário de 2022 da Comissão de Meio Ambiente (CMA), que decidiu, em abril, monitorar os impactos ambientais gerados pela ocupação ilegal de áreas públicas na Amazônia Legal. A análise é feita com base na Política Pública de Regularização Fundiária do governo federal. Aprovado, o documento passa a ser uma recomendação da CMA e será encaminhado à Mesa do Senado.

É verdade que desde 1990 o Brasil lidera o ranking de países que mais promovem desmatamentos ilegais. Mas esse roteiro começava a mudar em 2004, no primeiro governo Lula, quando foi lançado o Plano de Ação para Prevenção e Controle do Desmatamento na Amazônia Legal. Os resultados desse esforço transversal entre vários órgãos de governo foram comemorados em todo o mundo: entre 2005 e 2014, deixaram de ser desmatados mais de 11 milhões de hectares ou 22 bilhões de árvores adultas. A taxa anual de desmatamento caiu 82% em função da implantação desse Plano.

“Foi a maior contribuição de um único país para toda estratégia de mitigação de emissões de gases de efeito estufa no Planeta”, anotou no relatório Fabiano Contarato.

Mas com o fim daquele ciclo do PT no Planalto, houve um aumento progressivo do desmatamento no bioma amazônico, principalmente em terras públicas. Junto, cresceu a grilagem para fins de especulação fundiária e, no atual governo, explodiu o garimpo ilegal na região.

Ação incentivada
O relatório centrou nos problemas relacionados ao Sistema Nacional de Cadastro Ambiental Rural (CAR), que acumula denúncias de registros de propriedades ilegais em terras públicas. O texto aponta que, apesar de constituir um importante instrumento de monitoramento e regularização ambiental dos imóveis rurais, o CAR tem sido utilizado como atalho para legitimar a grilagem em terras públicas, principalmente na Amazônia.

“Tratam-se de registros sobrepostos a Florestas Públicas Não-Destinadas (FPND), Terras Indígenas (TI) e Unidades de Conservação (UC), que não poderiam ser aceitos no sistema como propriedade privada ou mesmo posse legítima e, portanto, com direito de registro no CAR”, alerta Contarato, que enxerga uma relação clara nesse processo: criminosos praticam a grilagem utilizando-se do CAR, que é auto-declaratório, e derrubam a floresta para comprovar a posse da terra.

Conforme o Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia, esse ciclo ilegal que declara particular a terra pública, já responde por 66% dos casos de desmatamento na Amazônia Legal. O número foi enfatizado por Fabiano Contarato: “até o fim de 2020, este Instituto indicou que mais de 14 milhões de hectares das Florestas Públicas Não Destinadas estavam registrados ilegalmente como propriedade particular no CAR, sendo que 3,4 milhões de hectares já haviam sido desmatados”.

O senador explica que a obrigação do poder público é trabalhar para impedir cadastros em terras públicas não destinadas. “E deveria implementar a legislação vigente para viabilizar a entrega de títulos de terra para as ocupações antigas de pequenos posseiros, que correspondem a mais de 90% dos beneficiários na fila da regularização fundiária”, opina.

Mas, segundo ele, o governo federal, bem como sua base parlamentar, atuou para flexibilizar a legislação que impede a grilagem de terras. Mudou até a forma de atuação de órgãos que decidem sobre a destinação de terras. O resultado é que, embora a Constituição proíba a concessão, a proprietários privados, de Terras Públicas Não Destinadas, 69% dessas florestas já estão sob ameaça de privatização.

Otimismo
As conclusões de Fabiano Contarato foram aprovadas simbolicamente pela CMA. Na presidência dos trabalhos, a senadora Eliziane Gama (Cidadania-MA) afirmou que o relato é preocupante, mas é essencial na construção da política nacional de meio ambiente e dos compromissos que o Brasil negocia com o mundo, inclusive na COP-27, a cúpula mundial do clima, que acontece daqui a uma semana no Egito, e para a qual o futuro governo Lula foi convidado.

“O relatório traz dados preocupantes, mas necessários, que apontam para ações que precisamos tomar na política ambiental. Sobretudo, preocupa-nos a quantidade de hectares de terras existentes hoje no Brasil com indício de irregularidades, algo em torno de 14 milhões de hectares, e pelo menos 3,4 milhões de hectares já desmatados”, afirmou.

Presidente da CMA, coube a Jaques Wagner (PT-BA) a leitura do relatório do colega Contarato. Diante de números tão negativos, o senador se mostrou otimista com as conversas em torno do meio ambiente num futuro breve.

“Eu me sinto esperançoso com o próximo governo, que assume em 1° de janeiro, e particularmente com o meio ambiente. Não tenho dúvida nenhuma de que teremos um ambiente de diálogo muito mais salutar, o que é muito positivo pras duas casas do Congresso, para o Senado e para a Câmara”, projetou.

 

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