O problema básico do Brasil é o imposto de renda regressivo, onde os ricos e os dividendos de capital não pagam imposto, enquanto os trabalhadores são obrigados a pagar mais mesmo ganhando menos. Foi desta maneira que o senador Roberto Requião iniciou sua apresentação aos senadores e aos representantes dos movimentos sociais, nesta quinta-feira (3), durante audiência pública na Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) para debater os efeitos nocivos da PEC do Fim do Mundo no cotidiano das pessoas. A PEC do Fim do Mundo (241 na Câmara e de número 55 no Senado) altera a Constituição para estabelecer um congelamento dos gastos sociais por vinte anos. Isso mesmo, vinte anos, ao passo que libera geral o gasto da União no pagamento de juros dos títulos do governo nas mãos dos para especuladores, banqueiros e rentistas.
Requião trouxe à audiência um trabalho de sua equipe em que rechaça um luxuoso documento de 26 páginas que o ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, encaminhou para os 81 senadores dourando a pílula da PEC 241 (PEC 55 no Senado), como se ela fosse a salvação da lavoura. “O ministro mandou uma peça de ficção. São seis consequências que seus resultados são a mais acabada falácia”, afirmou. Para Requião, crítico do governo Temer, que é de seu partido, há na sociedade um conflito entre o capital produtivo, aquele destinado a investir numa fábrica que cria empregos e gera renda contra o domínio do capital vadio, do capital financeiro que toma conta do governo há algum tempo. Os interesses em jogo com a PEC do Fim do Mundo não são o povo, os brasileiros, mas o mercado, os financistas, os rentistas e os banqueiros. Estes, na opinião do senador, não são mais brasileiros. O Brasil e os brasileiros servem apenas para ser explorados, e por aí vai. A PEC do Fim do Mundo leva a nação para o buraco, para o atraso, para o período do Brasil Colônia.
Abaixo, confira os seis pontos em que Requião desmonta a tese de Meirelles de que o País vai viver o melhor dos mundos com a PEC do Fim do Mundo:
1) Meirelles diz que a aprovação da PEC que congela os gastos públicos e sociais trará confiança. Requião diz que nada é mais falso. “Não é o reequilíbrio das contas que ajudará a retomada do crescimento econômico, mas a existência de demanda efetiva na economia. Isso é o fato de os consumidores terem renda, emprego e disposição de comprar. O investidor produtivo tem em vista o mercado, não as intenções do Meirelles com a sua demagogia neoliberal e mistificadora. Enfim, confiança empresarial é efeito do crescimento econômico, não a causa do crescimento econômico”.
2) Meirelles diz que a retomada do investimento privado será como um efeito da aprovação da PEC. Para Requião, outra ficção: “como eu, investidor, vou investir se a economia está em uma depressão de cerca de 8% acumulados em dois anos? A taxa de desemprego alcança quase 12%, e a renda está em queda. Vou investir em produção, e quem vai comprar? Na verdade, a confiança que se está construindo é exclusivamente para os especuladores financeiros, que não dependem demanda de produtos e serviços, mas da disposição do governo de pagar juros escorchantes sobre a dívida pública, que, afinal, é o primeiro e último objetivo da PEC 55”.
3) Meirelles diz que haverá crescimento econômico com a PEC. Requião diz que “não há a mais remota possibilidade de crescimento econômico resultar de um regime fiscal de congelamento de gastos correntes e de investimento. Crescimento econômico, numa situação de depressão como a que estamos vivendo hoje, exige ampliação de gastos fiscais, sejam gastos correntes, sejam investimentos. Essa é a primeira lição de uma economia estimulada por métodos keynesianos. O efeito do crescimento do déficit fiscal é imediato, como reconhece o próprio documento do Meirelles. Só que é mascarado por um raciocínio falacioso sobre o aumento da dívida, que, na verdade, cai em relação ao PIB”.
4) Meirelles fala que a PEC vai gerar mais emprego e melhorar a renda do trabalhador. Requião diz que esse argumento é falácia das grandes. “Emprego e renda são resultantes de uma economia em crescimento e só aparecem na primeira fase de um processo de expansão quando frutos de uma política deliberada de gastos públicos deficitários – deficitários, sim, nunca congelamento de despesas. Já o crescimento derivado da ampliação de gastos públicos deficitários contribui para a expansão do emprego e da renda, gerando um círculo virtuoso de crescimento da economia e reduzindo a relação dívida/PIB. Só o crescimento da economia e o aumento do PIB podem reduzir essa relação dívida/PIB. Não há outra maneira”.
5) Meirelles, em seu documento, diz que a aprovação da PEC garantirá mais recursos para investimento e consumo. Requião acha que Meirelles dourou a pílula demais. “Isso é inteiramente falso. Absolutamente falso. Na medida em que o setor púbico congela gastos orçamentários, é imediatamente reduzida a demanda de bens e serviços do próprio setor público sobre a economia privada, congelando as oportunidades de investimento e consumo reais – não financeiros, mas reais. Se a economia está em depressão, como é o nosso caso, o setor privado, mesmo que tenha recursos disponíveis para investimento, como de fato tem, aplicados na dívida pública, não realiza investimentos reais porque não tem demanda. Conforme o mencionado, se não temos demanda, como é que aprofundamos a recessão que deprime ainda mais a demanda?”, indagou.
6) O sexto e último argumento de Meirelles ele fala dos tais juros estruturais, que ninguém, nenhum especialista do próprio governo conseguiu traduzir até agora. Requião pergunta: “o que que quer dizer queda de juros estrutural? É uma palavra ao vento! Isso não significa rigorosamente nada! Esta é mãe de todas as falácias! A taxa básica de juros no Brasil, chamada Selic, nada deve às forças do mercado ou mesmo ao regime fiscal proposto pelo Meirelles; obedece exclusivamente às determinações do Copom, que, por sua vez, condiciona as decisões do Banco Central. Não existe nenhuma mágica nisso! É política de governo; é decisão do Copom e do Banco Central! E o Banco Central, em última instância, é ele que determina a taxa de juros e, na prática, ele obedece a determinações do mercado financeiro especulativo, comandado pelo Bando Itaú e pelo Bradesco, que são quem nomeia os membros do Banco Central. Está lá o Ilan Goldfajn, o ex-diretor do Bradesco; e o antigo presidente do Banco de Boston, o nosso Meirelles, no Ministério da Fazenda. Afirmar que a taxa de juros estrutural – aliás, ninguém sabe o que é isso: taxa de juros estrutural – vai cair por conta do regime fiscal proposto é uma tentativa sórdida de enganar a sociedade brasileira e preservar uma política monetária criminosa. Conclusão: se as postulações de Meirelles são todas falsas, quais são, afinal, os objetivos ocultos contidos na PEC nº 55, na PEC do fim do mundo? Em síntese, trata-se de dar o passo final na construção do Estado mínimo, conforme a pressão constante sobre a economia brasileira exercida pelos formuladores do famoso e já conhecido consenso de Washington. É o fim do Estado social! É a precarização do Estado, com a prevalência absoluta de um Banco Central controlado pelo mercado, pelos banqueiros e pelos rentistas! É a precarização do parlamento, com a influência pesada do capital financiando candidaturas e partidos”.
Marcello Antunes
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