Seguro para atletas e treinadores gera mais dúvidas do que certezas

Comissão de Educação discutiu projeto que visa regulamentar artigo da Lei Pelé que exige a contratação de seguros para atletas e treinadores de futebol de todo o País.

Aníbal sugeriu que a CBF direcione parte
dos recursos negociados pelas cotas de
TV para um seguro de acidente de
trabalho para os atletas

Por solicitação do senador Aníbal Diniz (PT-AC), a Comissão de Educação, Cultura e Esporte (CE) realizou audiência pública para instruir o Projeto de Lei do Senado (PLS 531/2011), de autoria do senador Zezé Perrella (PDT-MG), que prevê a exigência da comprovação de contratação de seguro como condição para participação de atletas e treinadores de futebol em competições, e que tem o senador petista como relator – um seguro por acidente de trabalho.

“O futebol tem uma importância ímpar na vida do brasileiro. A gente se pergunta o porquê de se fazer futebol no Brasil. Essa é uma atividade extremamente complicada, que requer muito. E a gente percebe que os problemas crescem na mesma proporção do tamanho do clube. Para mim, essa é uma atividade movida simplesmente pela paixão”, disse o senador Aníbal, que mostrou preocupação com a situação de clubes pequenos do Brasil, que, geralmente, atuam apenas por quatro meses no ano durante a disputa dos campeonatos estaduais.

“Temos no Acre, clubes na situação em que os jogadores não recebem o vale-transporte para ir ao treino. Essa é uma situação complicada. A proposta do senador Perrella é meritória por trazer uma preocupação com o atleta e o treinador”, disse.

Antônio Aquino Lopes, presidente da Federação Acreana de Futebol argumentou que a discussão não se sustenta. “No projeto, me preocupou a situação de que, mesmo se tivéssemos a empresa seguradora, que o clube arcaria com a primeira fase de gastos com o atleta. Como os clubes que atuam apenas quatro meses por ano vão bancar esse primeiro momento? Existem clubes que não teriam condições de sustentar isso”, avaliou.

Inexistência de seguradoras interessadas
Entre os integrantes da mesa, os convidados foram unânimes ao afirmar que, no Brasil, nenhuma seguradora demonstrou interesse em firmar contrato para segurar atletas profissionais. Dentre as argumentações, relatou-se que, na maioria dos clubes brasileiros, o valor do salário é muito baixo para o risco que a profissão proporciona. Por isso, seria inviável o cumprimento do que exige o artigo 45 da Lei Pelé (9.615/1998). 

Alexi Portela Júnior, presidente da Liga dos Clubes de Futebol do Nordeste (LCFN) sugeriu que os treinadores, que recebem um salário acima da média do praticado no Brasil, façam os seus seguros.

João Guilherme Maffia, Diretor Jurídico do Sindicato dos Treinadores Profissionais de Futebol do Estado de São Paulo (Sitrefesp) argumentou que, antes de se tratar da questão do seguro de jogadores de futebol e treinadores, é preciso atualizar a legislação sobre os treinadores de futebol (Lei 8.650/1993). “A regulação atual deixa margem para várias dúvidas e interpretações. Hoje, não há exigência de um contrato mínimo de trabalho. Essa lei merece uma alteração para que a gente possa ter a profissão tratada com o devido respeito”, disse.

Apoio da CBF e viabilidade do projeto
Eduardo Santos Novaes, advogado e consultor jurídico da Federação Nacional dos Atletas Profissionais de Futebol (Fenapaf), criticou o projeto e disse que o foco deveria ser os atletas amadores.  “Os atletas amadores não têm direito a nada. Nos esportes olímpicos, considerados amadores, existe dinheiro público e privado e não existe nenhum tipo de seguro para essas categorias”, disse.

A realidade é diferente, no entanto, quando se trata dos grandes times, que contratam jogadores pela norma celetista com seguro para acidente de trabalho. “Os clubes maiores tem acesso à medicina avançada. Os clubes menores estão com uma situação péssima e não conseguem nem pagar os salários de jogadores. Proponho que o atleta só tenha condição de jogo se o contrato dele for registrado na federação local e na CBF, com a existência desse seguro”, argumentou.

Para Eduardo, seria possível a Confederação Brasileira de Futebol (CBF) contribuir para questão. “A CBF teria força para dar uma solução ao caso e fazer uma apólice coletiva garantindo todos os jogadores profissionais do País. A CBF lucra uma fortuna com os direitos televisivos de seus campeonatos e esse valor é dividido entre poucos clubes. Esse montante deveria ser mais bem distribuído”, ressaltou.

Amilar Fernandes Alves, advogado da CBF, rebateu a proposta de Eduardo e disse que a entidade responsável pelo futebol no Brasil seria um risco assumir a responsabilidade pelos seguros dos atletas. “A CBF é uma entidade privada e, apesar da aparente força, não tem condições de negociar com empresas do exterior para fazer esse tipo de seguro para atletas. Além disso, seria arriscado, pois, ela atrairia para si todos os riscos dessa contratação. Considero que seja impossível que a CBF tenha a possibilidade de buscar esse tipo de seguro para oferecer aos clubes e treinadores”, rebateu.

Aníbal Diniz sugeriu que, talvez, a CBF direcione parte dos recursos negociados pelas cotas de TV, para um fundo destinado a segurar os atletas.

Defesa do projeto
O autor da matéria, senador Zezé Perrella, ex-presidente do Cruzeiro Esporte Clube, relatou algumas experiências vividas como dirigente de um dos mais importantes clubes brasileiros e que motivou a construção do projeto em debate. De acordo com ele, os jogadores, quando saem de um clube por conta do encerramento do contrato, acionam a Justiça. “Os clubes e federações não exigem esse seguro”, disse. “Quando eu buscava jogadores emprestados de fora do Brasil, eu tinha de fazer o seguro com empresas estrangeiras”, relatou. O senador afirmou que existem empresas no Brasil interessadas em realizar esse tipo de serviço.

“Posso trazer ao menos quatro aqui em outra audiência. Essa questão vai onerar, no máximo, em 10% da folha dos clubes. Isso é completamente viável. Não estou aqui inventando a roda. Estou buscando um caminho para que os clubes e a CBF cumpram a lei”, argumentou.

O senador Aníbal Diniz ressaltou que o relatório deve atender às necessidades dos clubes e dos atletas, e que as normas sejam aplicadas sem prejuízo a nenhuma das partes, além de não inviabilizar as competições. “Precisamos de um texto consistente e que possa ser aplicável. Eu tenho muito interesse em contribuir para esse tema e gostaria de, a partir das contribuições dessa audiência, fazer uma proposição preenchendo as lacunas que surgiram”, ressaltou.

O colegiado deve realizar nova audiência pública para ouvir as empresas seguradoras sobre o assunto.

Leia a íntegra do PLS 531/2011

Conheça a íntegra da Lei Pelé (Lei 9.615/1998)

Conheça a Lei que regula a profissão de treinador de futebol no Brasil (Lei 8.650/1993)

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