PL do veneno

Senado terá que decidir entre veneno e comida saudável

Entidades e movimentos sociais se juntam contra o Pacote do Veneno, que facilita liberação de agrotóxicos proibidos e fragiliza fiscalização. Do outro lado da mesa, Senado tem para votar projeto que incentiva produção de bioinsumos, que ajudam a produzir alimentos saudáveis
Senado terá que decidir entre veneno e comida saudável

Foto: Alessandro Dantas

Um comunicado aos senadores lançado nessa segunda-feira (14) pela Fundação Oswaldo Cruz encorpou ainda mais a luta de dezenas de organizações da sociedade civil contra Pacote do Veneno, nome dado ao projeto (PL 6.299/2002) que revoga a atual Lei dos Agrotóxicos e abre a porteira de vez para a liberação, sem os trâmites atuais, do uso de venenos químicos nas lavouras. A matéria está no Senado, que tem no cardápio outra proposta (PL 3.668/2021), esta do senador Jaques Wagner (PT-BA), que institui a política de produção de bioinsumos, que são produtos obtidos por substâncias naturais e que servem ao manejo biológico da produção agroflorestal.

O estudo conduzido pelo Grupo de Trabalho Agrotóxicos e Saúde, da Fiocruz, adverte que se o Senado aprovar o Pacote do Veneno, “promoverá danos irreparáveis aos processos de registro, monitoramento e controle de riscos e dos perigos dos agrotóxicos no Brasil, com graves danos à saúde humana e ao ambiente”. Os cientistas chamam a atenção para o risco de se permitir o registro de produtos mais tóxicos, que causam câncer, problemas reprodutivos, distúrbios hormonais e para o nascimento. Segundo a nota, o Pacote do Veneno inviabiliza a aprovação de produtos mais modernos e de menor toxicidade.

Também é condenada pelos estudiosos a substituição de áreas técnicas do governo – Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) e Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) – pelo gabinete do Ministério da Agricultura (MAPA) em decisões que afetam a saúde das pessoas e o meio ambiente. Outro ponto atacado pela nota é a fragilização da atuação do Sistema Único de Saúde (SUS), “especialmente quanto ao monitoramento e vigilância da água, da qualidade dos alimentos, dos ambientes de trabalho e das populações expostas aos agrotóxicos, além de sobrecarregar as ações assistenciais em todos os níveis de atenção à saúde devido ao potencial aumento de casos de adoecimento pela exposição a esses agentes”. Essas e outras atribuições, incluindo a de estados e municípios, que hoje podem opinar sobre determinado veneno em razão da exposição de populações indígenas, por exemplo, passam para o MAPA, conforme o projeto.

Campanha
A Fiocruz se somou também ao Dossiê contra o pacote do veneno e em defesa da vida, elaborado por alguns dos maiores especialistas no tema do país, que será entregue a todos os senadores. O documento é assinado pela Associação Brasileira de Saúde Coletiva (Abrasco), Associação Brasileira de Agroecologia (ABA-Agroecologia) e Campanha Permanente Contra os Agrotóxicos e pela Vida. A manifestação da Fiocruz e dessas entidades se soma a uma campanha multifacetada, que envolve dezenas de movimentos sociais e organizações não governamentais, numa frente contra a aprovação do Pacote do Veneno. A campanha começou com um alerta à população sobre quais deputados votaram a favor do projeto, e segue com postagens de artistas, vídeos e textos nas redes sociais, além de outras manifestações pelo Brasil. No Senado, a bancada do PT vem debatendo formas de barrar o que o senador Fabiano Contarato (PT-ES) classifica como uma tragédia.

“Estamos nos mobilizando numa estratégia de atuação para impedir de todas as formas a tramitação desta matéria. Precisamos avaliar com lupa os impactos danosos do texto. Está em risco a saúde de quem consome os produtos intoxicados por esses venenos, e os recursos naturais ficam extremamente contaminados – da terra à água”, denuncia o senador.

Produção limpa
Outro passo da campanha é esclarecer a sociedade sobre as diferenças desse texto para outra proposta em análise no Senado. Trata-se do PL 3.668/2021, apresentado em dezembro pelo senador Jaques Wagner (PT-BA), que institui a política de produção de bioinsumos, que são produtos obtidos por substâncias naturais e que servem ao manejo biológico da produção agroflorestal. O setor de bioinsumos está em franco crescimento, com uma produção que movimenta perto de R$ 1 bilhão por ano no Brasil e já colabora com mais de 50 milhões de hectares na produção agrícola. E sem envenenar nada nem ninguém.

Presidente da Comissão de Meio Ambiente (CMA), Jaques Wagner explica que seu projeto tem viés econômico, além de ambiental, e vai na linha do que ele costuma chamar de guinada verde.

“A regulamentação do uso de bioinsumos no Brasil, especialmente, na proteção de cultivos, promoverá ampliação da utilização desses produtos na agricultura de 2,6% para 20% até 2025, podendo o faturamento chegar a R$ 2 bilhões por ano”, explicou.

Já o Pacote do Veneno segue o caminho oposto, e pode resultar em perdas econômicas, aponta Jaques Wagner, na medida em que coloca em risco o acordo comercial entre Mercosul e União Europeia. No mesmo tom, Fabiano Contarato adverte que “nosso mercado externo está exigindo o fim do desmatamento e dos agrotóxicos na cadeia produtiva. Inclusive a China já veio aqui dizer que acredita numa economia verde. Estamos na lanterna mundial”.

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