terrenos de marinha

Senadores do PT reagem contra PEC que abre margem para privatizar praias

Proposta em análise no Senado representa risco ao meio ambiente por enfraquecer legislação e abrir as portas para privatização de áreas do litoral

Alessandro Dantas

Senadores do PT reagem contra PEC que abre margem para privatizar praias

Manifestantes protestam contra a aprovação do projeto durante audiência pública

A Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado debateu, nesta segunda-feira (27/5), a Proposta de Emenda à Constituição (PEC 3/2022) que transfere a propriedade dos terrenos do litoral brasileiro, hoje sob o domínio da Marinha, para estados, municípios e proprietários privados.  

Veja imagens da audiência pública

Aprovado em fevereiro de 2022 na Câmara dos Deputados, a PEC estava parada na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado desde agosto do ano passado. 

A PEC exclui o inciso VII do artigo 20 da Constituição, que afirma que os terrenos da Marinha são de propriedade da União, transferindo gratuitamente para estados e municípios “as áreas afetadas ao serviço público estadual e municipal, inclusive as destinadas à utilização por concessionárias e permissionárias de serviços públicos”. 

Para os proprietários privados, o texto prevê a transferência mediante pagamento para aqueles inscritos regularmente “no órgão de gestão do patrimônio da União até a data de publicação” da Emenda à Constituição. Além disso, autoriza a transferência da propriedade para ocupantes “não inscritos”, “desde que a ocupação tenha ocorrido pelo menos cinco anos antes da data de publicação” da PEC. 

Ainda segundo o relatório, permanecem como propriedade da União as áreas hoje usadas pelo serviço público federal, as unidades ambientais federais e as áreas ainda não ocupadas. 

O senador Rogério Carvalho (PT-SE) classificou a proposta como uma medida completamente indiscriminada que poderá ”gerar desconforto à população”.  

“Ainda mais, depois de toda essa catástrofe climática que temos visto ocorrer no estado do Rio Grande do Sul. O que essa PEC propõe é mais um absurdo que precisa ser derrotado no Senado Federal. As praias e rios não podem ser privatizados porque são bens públicos e pertencem a todos os brasileiros e todas as brasileiras”, destacou. 

O vice-presidente da Comissão de Meio Ambiente (CMA) do Senado, Fabiano Contarato (PT-ES), também alertou para o risco da proposta.  

“A proposta transfere a titularidade do terreno da União para estados e municípios. Isso é um perigo à pauta ambiental. Vai favorecer a especulação imobiliária, construção de resorts e ataques ao meio ambiente”, alertou Contarato.

Além das praias, a Marinha detém a propriedade de margens de rios e lagoas onde há a influência das marés. E essas áreas também seriam afetadas pela mudança constitucional proposta. 

De acordo com o Observatório do Clima, “esse é mais um projeto do Pacote da Destruição prestes a ser votado. Isso põe em risco todo o nosso litoral, a segurança nacional, a economia das comunidades costeiras e nossa adaptação às mudanças climáticas”.  

“A PEC pode representar um grande retrocesso na legislação, uma ameaça ao ambiente, aos menos favorecidos e à sociedade, com o risco de perder para a especulação imobiliária o seu livre acesso às praias”, também alertou a senadora Teresa Leitão (PT-PE). 

A secretária adjunta da secretaria de gestão do patrimônio da União no Ministério da Gestão e da Inovação dos Serviços Públicos, Carolina Gabas Stuchi, alertou para o fato de a proposta permitir a extinção do conceito de faixa de segurança e, com isso, permitir a alienação e a transferência do domínio de áreas importantes para o Plano Nacional de Gerenciamento Costeiro.  

“[O projeto] acaba favorecendo essa ocupação desordenada, ameaçando os ecossistemas brasileiros, tornando esses territórios mais vulneráveis aos eventos climáticos extremos”, alertou.  

A coordenadora geral do departamento de oceano e gestão costeira do Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima, Marinez Eymael Garcia Scherer, chama a atenção para o fato de existirem motivos técnicos que justifiquem esses terrenos serem áreas de preservação permanente.  

“Elas são áreas de preservação permanente porque são importantes para a segurança humana e para o bem-estar humano. Se a gente perde essas estruturas, se a gente perde esses ecossistemas, a gente vai perder bem-estar humano e a gente vai perder economia. A gente vai perder valor, que é importante para todas as pessoas, além de que é um gasto que acaba recaindo sobre toda a população brasileira”, explicou. 

A representante do Movimento das Pescadoras e Pescadores Artesanais (MPP), Ana Ilda Nogueira Pavão, disse que as populações ribeirinhas e de terrenos de marinha são as primeiras a sofrer com os impactos do avanço de empreendimentos sobre as áreas de preservação.  

“Quem mora na beira dos rios, na beira dos lagos, na área de marinha é que sofre com os assoreamentos, desmatamento desordenado de grandes empreendimentos. E a gente sabe que o teor dessa PEC, no fundo, o que ela visa, o objetivo dela é a urbanização das orlas, é a urbanização por grandes empreendimentos, e quem vai lucrar com isso não somos nós. Nós só vamos perder”, criticou. 

Tramitação

A proposta de autoria do deputado Arnaldo Jordy (Cidadania-PA) já foi aprovada pela Câmara dos Deputados e aguarda análise na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado com a relatoria do senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ). Ainda não existe data para a deliberação na CCJ. Após a análise do colegiado, a proposta seguirá para discussão, em dois turnos de votação no plenário do Senado por se tratar de mudança constitucional. Se aprovada, a proposta segue promulgação.

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