De um lado, milhões de brasileiros que correm o risco de paralisar tratamentos médicos; de outro, a pressão de operadoras de planos de saúde para manter a cobertura restrita a uma lista que hoje é de pouco mais de 3 mil procedimentos, o rol taxativo, definida e atualizada pela Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS).
O assunto está no Senado, depois de passar por idas e vindas nos últimos 18 meses. Tudo começa com a edição de resolução (RN 465/2021), pela ANS, fixando a taxatividade do Rol de Procedimentos e Eventos em Saúde, ou seja, estabelecendo que o rol é o parâmetro para cobertura de procedimentos. Provocado, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) confirmou, em junho, que os planos de saúde estariam desobrigados de cobrir procedimentos não listados nesse rol. Mas os ministros abriram exceção para casos em que não haja substituto terapêutico, depois de esgotados os procedimentos do rol da ANS, desde que a alternativa médica ao paciente seja reconhecidamente eficaz. Fora disso, restaria ao paciente negociar com o plano de saúde um aditivo contratual ou pagar cobertura ampliada.
A decisão do STJ motivou a apresentação de projeto (PL 2033/22) na Câmara dos Deputados, fruto de grupo de trabalho composto, entre outros, pelo deputado Alexandre Padilha (PT-SP) e pela deputada Rejane Dias (PT-PI).
O texto, aprovado no início de agosto (3), torna o rol exemplificativo, e obriga as operadoras a custearem tratamento fora da lista da ANS quando houver comprovação de sua eficácia ou no caso de ser recomendado pela Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no Sistema Único de Saúde (Conitec). Abre, também, a possibilidade dessa autorização acontecer se o tratamento tiver a chancela de pelo menos um órgão de avaliação de tecnologias em saúde com renome internacional.
O senador Paulo Paim (PT-RS) está entre os que pressionam pela aprovação do texto enviado pela Câmara. O projeto deve passar por um debate no dia 23 de agosto e está pautado para a sessão do Senado do dia 29.
“O Senado precisa votar projeto que obriga os planos de saúde a cobrir tratamentos fora da lista da ANS, o chamando rol taxativo. A medida beneficia milhões de brasileiros que necessitam de procedimentos diferenciados”, reivindica o senador.
O jogo será pesado, a julgar pela posição da própria ANS, que se perfilou com as empresas do setor em nota técnica que prega a derrubada do projeto. Na nota, a agência afirma que a mudança o texto traz insegurança jurídica e oferece risco à sustentabilidade do mercado.
Para o senador Jaques Wagner (PT-BA), inseguras, mesmo, estão as pessoas que dependem de tratamento médico.
“Atualmente, segundo dados da própria ANS, 49 milhões de brasileiros e brasileiras dependem de planos de saúde para tratamentos contínuos ou não. Famílias não podem e não devem ter que esperar a aprovação de procedimentos pelos planos. É uma questão de vida e de saúde”.
Para o Coletivo de Mobilização Nacional Contra o Rol Taxativo e a Favor do Rol Exemplificativo, “a ANS abandonou a posição de autarquia de Estado, com atribuição estritamente regulatória e atuação obrigatoriamente isenta, para se posicionar de maneira parcial em favor das operadoras de plano de saúde”.
Assim como o Coletivo, o Conselho Nacional de Saúde (CNS) é favorável ao projeto. Segundo o CNS, manter o rol taxativo da ANS como parâmetro único para obrigar operadoras a custar tratamentos “causará imenso prejuízo à saúde de quase 50 milhões de pessoas, podendo culminar na morte de muitas beneficiárias e beneficiários, já que, a priori, as operadoras de planos de saúde podem recusar a custear parte dos tratamentos, havendo assim descontinuidade da assistência, que poderá levar ao agravamento do quadro de saúde dos pacientes”.
Além do PT, senadores de outros partidos, até alinhados ao governo, têm se juntado à campanha pela aprovação do projeto. Nesta quarta, o também médico Nelsinho Trad (PSD-MS) defendeu o texto, assim como o comunicador Jorge Kajuru (Podemos-GO).