A indicação do deputado federal Osmar Serraglio (PMDB-PR) para ocupar a cadeira de ministro da Justiça motivou a senadora Gleisi Hoffmann (PT-PR), líder do PT no Senado, a analisar a indicação anunciada por Michel Temer nesta semana.
Gleisi lembra que o novo ministro da Justiça, tempos atrás, defendeu um prêmio ao então deputado Eduardo Cunha por ele ter garantido o impeachment da presidenta eleita democraticamente Dilma Rousseff.
Além disso, a senadora ainda aponta que Osmar Serraglio foi indicado por Eduardo Cunha para presidir a Comissão de Constituição e Justiça da Câmara. Ocupando esse posto, Serraglio defendeu a absolvição de Cunha no processo que culminou em cassação.
“É ele quem vai para o Ministério da Justiça. Estamos vendo a operação para estancar a sangria sendo desenvolvida em plena luz do dia. É uma barbaridade o que estamos vendo no Brasil”, lamenta a senadora.
A assessora da Liderança do PT no Senado, Tânia Oliveira, produziu um artigo, motivada pela escolha de Serraglio para o ministério da Justiça, apontando o potencial que Serraglio tem, principalmente, para fazer retroceder os direitos indígenas no País.
Serraglio será o responsável pelo ministério que dita a política indígena no Brasil e é responsável pela Funai. Foi ele também que relatou na comissão especial da Câmara que tratou da Proposta de Emenda Constitucional (PEC 215/00) que prevê a transferir para o Congresso a decisão final acerca da demarcação de terras indígenas, territórios quilombolas e unidades de conservação em todo o País.
Em seu substitutivo, Serraglio também prevê a proibição de ampliações de territórios indígenas já demarcados.
Para Tânia, a intenção dos parlamentares ruralistas com a aprovação da PEC 215 é apenas impedir a efetivação de demarcações de terras indígenas. “Ao tentar tirar o poder das mãos do Executivo para toma-los para si não possuem nenhuma intenção de aprimoramento de legislação, senão impedir que as demarcações de Terras Indígenas se efetivem, paralisando os processos. Desse modo, a ida de um representante desse grupo para o Ministério da Justiça é, abusando do jargão: ‘botar a raposa para vigiar o galinheiro’”, explica.
Confira a íntegra do artigo:
SERRAGLIO E A POLÍTICA (ANTI)INDÍGENA NO MINISTÉRIO DA JUSTIÇA
No xadrez da ocupação de cargos no Poder Executivo, o novo ministro da Justiça é o deputado federal pelo PMDB do Paraná Osmar Serraglio. O homem que pediu a anistia a Eduardo Cunha por ter sido “fundamental para aprovarmos o impeachment da presidente”.
O governo de Michel Temer evidência mais a cada dia que, diante do fato de ter sido alçado ao cargo por um golpe de maioria parlamentar, sente-se na total liberdade de agir de acordo com suas conveniências, já que não tem eleitores a quem dar satisfação e seu ignóbil índice de aprovação não possuem relevância na tomada de decisão.
Nesse diapasão, as perdas e retrocessos adquiriram uma velocidade assustadora. São medidas provisórias, alterações constitucionais, projetos de lei enviados aos borbotões ao Congresso, decretos e portarias editados. Os nomes indicados aos cargos seguem a tônica. Estão umbilicalmente ligados à agenda conservadora e retrógrada imposta ao país.
Mas, fundamentalmente para o debate de direitos humanos, Serraglio comandará a pasta que dita a política indígena do país. É sob a batuta do Ministério da Justiça que se encontra a FUNAI. Cômico não fosse trágico! Isso, considerando que o deputado indicado foi o relator na comissão especial criada para analisar uma proposta de emenda constitucional, a famosa PEC 215, que propõe alterar a Constituição Federal para transferir ao Congresso Nacional a decisão final sobre a demarcação de terras indígenas, territórios quilombolas e unidades de conservação no Brasil. O texto substitutivo apesentado por Osmar Serraglio também proíbe as ampliações de terras indígenas já demarcadas e fixa como marco temporal a data de 5 de outubro de 1988, de promulgação da Constituição, para definir o que são as terras permanentemente ocupadas por indígenas e quilombolas.
Isso significa que os índios não terão direito à terra se não a ocupavam em 1988. Dessa forma, a PEC 215 não leva em conta grupos indígenas que foram expulsos de suas terras tradicionais e que, devido a conflitos fundiários ou por ações da ditadura, não conseguiram voltar a ocupar estas áreas.
A Constituição Federal de 1988 resgatou uma interpretação da ocupação da terra pelos indígenas que já existia desde 1680, que trata do direito originário. A demarcação é apenas o reconhecimento desse direito. Estudos de antropólogos demonstram que a transferência da competência de demarcar Terras Indígenas do Executivo para o Legislativo impactaria diretamente centenas de processos de demarcação de Terras indígenas ainda não homologadas e dezenas que se encontram em disputas judiciais.
O poder de demarcar terras indígenas, territórios quilombolas e unidades de conservação é atribuído ao Poder Executivo pela Constituição por meio de critérios claros, que exigem estrutura e condições técnicas para cumprir o rito necessário à demarcação, desde equipes capacitadas para fazer os estudos de comprovação da ocupação tradicional até a resolução de conflitos e a eventual necessidade de indenizações.
A ninguém é dado iludir-se com o canto da sereia dos parlamentares ruralistas. Ao tentar tirar o poder das mãos do Executivo para toma-los para si não possuem nenhuma intenção de aprimoramento de legislação, senão impedir que as demarcações de Terras Indígenas se efetivem, paralisando os processos. Desse modo, a ida de um representante desse grupo para o Ministério da Justiça é, abusando do jargão: “botar a raposa para vigiar o galinheiro”.
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