“Fator é a lei mais cruel inventada nesse País depois da ditadura”, diz Paim

Em entrevista, Paim defende fórmula 85/95 ao fator previdencárioUm destaque aprovado na Câmara pode ser a primeira alternativa ao fator previdenciário desde que este foi criado – em 1999, durante a gestão de Fernando Henrique Cardoso. Trata-se da fórmula 85/95, que soma a idade ao tempo de contribuição e garante aposentadoria às mulheres que atingirem 85 anos e, aos homens, 95 anos – sendo 10 anos a menos no caso dos professores. A proposição foi um dos principais temas da entrevista concedida por Paulo Paim (PT-RS) ao jornal Sul21.

A fórmula 85/95 foi incluído na Medida Provisória 664/2014, que muda as regras das pensões por morte e auxílio-doença e deve ser votada nesta semana, no Senado, antes de ir para a análise da presidenta Dilma.

Por cerca de 40 minutos, Paim também conversou sobre assuntos como a política de ajuste fiscal promovida pelo ministro da Fazenda, Joaquim Levy, a onda de conservadorismo que tomou conta do Congresso Nacional, a reforma política e a Lei das Terceirizações.

Sul21 – Ao contrário do governo federal, o senhor quer o fim do Fator Previdenciário. Por que e quais os benefícios para o trabalhador com essas mudanças?

Paulo Paim – O Fator Previdenciário é a lei mais cruel inventada nesse País depois da ditadura. Foi aprovada no Congresso Nacional logo após a posse do Fernando Henrique [Cardoso]. O fator trabalha com a idade, a expectativa de vida e tempo de contribuição. Quem sofre com o fator? Os trabalhadores do Regime Geral da Previdência e aqueles que ganham até R$ 4.623. Só como exemplo: o Executivo, o Legislativo e o Judiciário, o teto é de R$ 33 mil, aí não aplica o fator e aposenta com o salário integral. Não é justo que o trabalhador brasileiro do Regime Geral da Previdência, aqueles que ganham abaixo de R$ 4 mil, R$ 3 mil e R$ 2 mil, tenham esse redutor chamado Fator Previdenciário, que confisca pela metade o salário da mulher no ato da aposentadoria e, do homem, tira em torno de 40%. Isso daqueles que ganham menos.

Nós trabalhamos para derrubar esse fator há 14 anos, praticamente. Eu, por duas vezes, já votei um projeto, de minha autoria, que acabava com o Fator Previdenciário no Senado, aprovado por unanimidade. Foi pra Câmara, que nunca mais votou.  O primeiro, há oito anos. Depois, o Senado votou novamente outro projeto, que veio da Câmara. Nós defendemos, aprovamos e o Lula vetou na época. Agora, eu apresentei, de novo, nessa Medida Provisória, uma emenda para substituir o fator pela fórmula 85/95. O deputado federal Arnaldo Faria de Sá (PTB-SP) apresentou na Câmara e combinamos o jogo: ‘Arnaldo, tu apresenta aí (o ideal é tu aprovar aí). Mas, se tu não aprovar, eu aprovo aqui e volta para aí’. Como ele aprovou lá, o Senado, pela minha posição, tem que aprovar essa proposta, que é igual a minha, e vai para a sanção da presidenta, que pode vetar ou não.

O Fator Previdenciário é a lei mais cruel inventada nesse País depois da ditadura.

Sul21 – Qual a sua avaliação sobre o argumento de que a Previdência não tem como arcar com as mudanças no Fator Previdenciário?

Paim – Esse discurso de que a Previdência está falida é totalmente equivocado, atrasado e falta com a verdade. Os dados da Anfip (Associação Nacional dos Auditores Fiscais da Receita Federal do Brasil) mostram que, no ano de 2014, o superávit da Previdência foi de R$ 50 bilhões. Eles (o governo) dizem que a entrada da fórmula 85/95 vai trazer um déficit para a Previdência. Mas, pelo contrário, nos primeiros oito anos, a Previdência vai ter um superávit além de R$ 18 bilhões. Daí pra frente, o superávit poderá diminuir, mas você pode ir ajustando na medida em que a expectativa de vida das pessoas também for aumentando.

Sul21 – Como será possível obter esse superávit com a mudança? O governo e as pessoas que são contra dizem que a mudança vai trazer um prejuízo para as contas da Previdência.

Paim – Quem diz isso não sou eu, é o ex-ministro da Previdência, José Pimentel. O atual ministro também reconhece que o fator deve mudar e que, no primeiro momento, nos primeiros oito anos, ele é positivo. O que as pessoas estão fazendo: elas sabem que o fator corta o salário. Então se aposentam com uma idade considerada precoce e continuam trabalhando. A pessoa ganha o dinheiro da Previdência e ganha o dinheiro na fábrica. E, ali na frente, entra com o pedido da desaposentadoria e vai ganhar o salário integral. Como o tempo de contribuição aumentou, a idade também aumentou. Aí, mesmo o fator não vai trazer prejuízo.

Com a fórmula 85/95, a pessoa vai esperar até 60 anos pra se aposentar – com 60 anos e 35 de contribuição, no caso do homem, soma os dois dá 95, e a mulher com 55 anos de idade e 30 de contribuição (soma 85). Como agora as pessoas teriam que esperar até uma idade, dá uma economia imediata à Previdência na ordem de R$ 18 bilhões.

Sul21 – A questão do Fator Previdenciário está sendo sinalizada como uma derrota para o governo. O senhor disse em outras entrevistas que, mesmo que o governo vete, o veto será derrubado no Congresso. Por quê?

Paim – Agora tem um fato novo: o voto não é secreto. Foi uma luta minha de anos. Acabamos com o voto secreto para apreciar o veto e quem é que vai votar contra o fator? Ninguém vai votar, ninguém é maluco, seria irracional tecnicamente, politicamente e economicamente. Consequentemente, ela [presidente Dilma] vai ser derrotada. Então, o bom senso manda, e não é só eu que digo isso, o própria Lula já tinha recomendado que ela não vete o fator, é hora de dizer chega desse fator e vamos para uma nova metodologia.

Sul21 – E por que ela vetaria?

Paim – Ela vetaria porque ela está com uma visão, no meu entendimento, equivocada, que não é a visão do próprio ministro dela da Previdência. É a visão do ministro Levy. Porque eles não querem sinalizar para o mercado externo de que ele estaria flexibilizando o instituto da aposentadoria.

Sul21 – O senhor já se manifestou várias vezes contra o ajuste fiscal que está sendo promovido pelo governo. Por quê?

Paim – O ministro Levy está totalmente equivocado. Primeiro, o método é equivocado e economicamente também é equivocado. O que ele fez: logo após as eleições, baixou duas medidas provisórias (MP 664 e MP 665) para ajuste fiscal, que não é ajuste fiscal coisa nenhuma, é arrocho salarial. É retirar direito do trabalhador, do pescador, do aposentado, da viúva e até o abono de um salário mínimo que tem direito a receber quem ganha até dois,, e também estariam praticamente eliminando pela fórmula que foi encaminhada. Quando eles fizeram isso, de pronto eu disse: ou vocês alteram radicalmente essas duas Medidas Provisórias ou vocês vão perder e eu não tenho problema nenhum de ficar com as minhas causas e criar esse embate, que pode me criar um constrangimento até de continuar na base de governo. Foram essas palavras que eu expressei e acabou dando toda aquela polêmica de sai ou não sai [do PT].

Eu defendo o PT de raiz, eu defendo o PT que elevou o número de carteiras assinadas, que tirou da miséria 30 milhões de brasileiros, que mais que quadriplicou o número de alunos de escola técnica, que botou as cotas para negros e índios como o ProUni. Tudo isso pra mim foi importante e são essas propostas do Levy que estão a contramão da história. Ele só ataca o andar de baixo, aquele grupo mais pobre que está sendo sacrificado.

Ele [Joaquim Levy] só ataca o andar de baixo, aquele grupo mais pobre que está sendo sacrificado.

Continue lenda a entrevista no jornal Sul21

 

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