Pinheirinho: “Desocupação foi um estupro social”, diz morador

Durante audiência, moradores da comunidade denunciam violência da ação policial. Muito diferente da alardeada “desocupação pacífica”. 

 

Pinheirinho: “Desocupação foi um estupro social”, diz morador

Quem vivia no Pinheirinho e teve que sair de casa sem chance de recolher qualquer pertence relata um cenário de guerra. Muito diferente da alardeada “desocupação pacífica”, noticiada como êxito da polícia do estado de São Paulo. O depoimento dos moradores nesta quinta-feira (23/02) à Comissão de Direitos Humanos (CDH) do Senado é chocante. Idosos agredidos a golpes de cassetete, balas e bombas disparadas indiscriminadamente contra a população e muita violência.

“Muitos jornais publicaram que foi uma desocupação pacífica. Mas, se fosse assim, todas aquelas casas não teriam sido destruídas em tão pouco tempo”, assegurou Maria Laura da Silva Sousa que estava ao lado do companheiro, Deivid Washington Furtado, quando ele foi baleado nas costas. Deivid passou 17 dias no hospital, ficou com sequelas na perna e tem uma grande cicatriz nas costas.

“Se a bala fosse de borracha, não teria deixado essa marca. O exame confirmou que eu fui atingido por uma bala letal”, atesta Deivid, que ainda tenta se recuperar da agressão e terá que passar por um exame específico chamado eletroneuromiografia ,que, por meio de estímulos elétricos que passam por agulhas inseridas no membro do paciente (no caso, a perna), é capaz de avaliar as condições dos músculos e nervos.

O senador Eduardo Suplicy (PT-SP), que já havia se encontrado e ouvido o relato de Deivid, pediu que ele mostrasse a cicatriz, para contestar claramente a versão de que os policiais que participaram da desocupação utilizavam apenas balas de borracha.

Além de Deivid, um morador conhecido por “Seu Ivo” também está no hospital. Oficialmente, foi vítima de um Acidente Vascular Cerebral (ACV). Na versão dos moradores, conforme relata Deivid, “Seu Ivo sofreu espancamento por parte dos policiais”.

Atordoado com a violência da invasão, “Seu Ivo” tentou voltar à sua casa para recolher alguns pertences. A tropa de choque estava no caminho. “Um oficial que não estava com a tropa começou a espancá-lo. Ele levou muita pancada”, relatou Deivid, que testemunhou a cena. O resultado é que o idoso, de mais de 70 anos, ainda está internado.

Deivid também relatou a morte de um homem – Antônio Dutra Santana – vítima de atropelamento .”Jogaram bombas dentro do carro de uma mulher que estava passando. Ela perdeu o controle da direção e atropelou o rapaz”, contou o morador.

“Não sou parasita” – Valdir Martins de Souza, conhecido na comunidade do Pinheirinho como “Marrom”, está indignado com as autoridades de São Paulo. Diz que foi chamado de parasita pelos homens que o representam. “Não sou parasita; sou trabalhador”, disse o homem de 54 anos, que garante trabalhar há 37 – 35 deles com carteira assinada.

Marrom reclama que a invasão foi motivada por interesses econômicos e discriminação contra a população mais pobre. “É estranho que o senhor Naji Nahas não pague seus impostos há 40 anos e ainda tenha direito ao terreno se, no Brasil, um cidadão que esteja inadimplente há apenas cinco tenha sua casa levada a leilão”, declarou. E emendou “Se o terreno estivesse ocupado por pessoas ricas, eu duvido que acontecesse a desocupação”.

O morador acredita que a desocupação foi uma represália pelo fato de a comunidade ter se organizado para construir suas casas, sem a participação dos “empresários da construção civil”.

Exaltado, ele informou que a desocupação foi “apenas uma forma de mostrar para o Brasil que o pobre não pode se organizar”. “Aquilo não foi uma desocupação. Foi um estupro social; foi o governo do estado mostrando que pobre não tem vez”.

Outros dois moradores de Pinheirinho, Sérgio Henrique Pires e Juarez Silva dos Reis, também em depoimento cobraram a devida apuração dos fatos, a punição dos responsáveis e a desapropriação do terreno onde se localizava a comunidade. “Essa covardia precisa ser investigada e nós temos que cobrar a punição. Caso contrário, ficará provado que a lei não vale para quem é pobre. Nesse momento, desapropriar o Pinheirinho é uma questão de justiça”, constatou Sérgio Pires.

Giselle Chassot

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