Inconformada, a bancada petista no Senado juntou-se à ministra Maria do Rosário, da Secretaria de Direitos Humanos (SDH), para repudiar a decisão do Superior Tribunal de Justiça (STJ) que inocentou um estuprador de três meninas menores de 12 anos. Nesta quinta-feira (29/03), os senadores Paulo Paim (PT-RS) e Ana Rita (PT-ES), divulgaram notas de protesto, nas comissões de Direitos Humanos (CDH) e Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI), que investiga a violência contra a mulher. Eles querem a revisão da decisão.
Paim, que coordenava um debate sobre a política brasileira de direitos humanos, após ler uma nota pública encaminhada pela ministra nesta manhã, sugeriu aos membros da CDH dar apoio ao texto que será enviado pela Secretaria ao procurador Geral da República, Roberto Gurgel, e ao advogado-geral da União (AGU), Luiz Inácio Adams. “A Comissão de Direitos Humanos aprovou a subscrição da nota a fim de reverter o caso. Esse criminoso precisa ser punido exemplarmente”, afirmou.
A senadora Ana Rita demonstrou indignação: “Essa decisão parte do princípio de que uma criança de 12 anos – que não é mais virgem –, não precisa de proteção, não merece atenção do Estado e não necessita ter sua integridade física e psicológica respeitada. Fizemos uma nota de repúdio manifestando a nossa posição e esperamos que o STJ reveja o caso”, argumentou.
A determinação
A decisão da justiça, divulgada na última terça-feira (27/03), entende que violência contra menores de 14 anos em caso de estupro deve ser avaliada relativamente caso a caso. E nesse, especificamente, a relatora, ministra Maria Thereza de Assis Moura, considerou que, como as meninas se prostituíam “desde longa data”, o estupro deixa de ser criminoso, porque não viola o “bem jurídico tutelado”, ou seja, a liberdade sexual.
A relativização que sugeriu o colegiado do STJ abre precedentes ao criar jurisprudência. Sob essa ótica, julgamentos futuros de casos semelhantes podem usar esse caso de exemplo e inocentar outros estupradores. Com isso, o tribunal liberou o sexo com garotas menores de 14 anos, desde que seja pago.
Por isso, a ministra Maria do Rosário ressaltou, em nota, que os direitos de crianças e adolescentes “jamais podem ser relativizados” e que a sentença deixa impune “um dos crimes mais graves cometidos contra a sociedade brasileira”. Além disso, observou, que a justificava usada para a absolvição – de que, à época dos fatos, as vítimas não eram inocentes, ingênuas, inconscientes ou desinformadas – é inaceitável, porque responsabiliza as meninas pela situação de vulnerabilidade que se encontram.
No mesmo sentido, a nota assinada pelas parlamentares da CPMI da mulher questiona as motivações que levam meninas em idade tão precoce a prostituição. “É impensável que uma criança de 12 anos ou menos (já que viviam há muito tempo na prostituição) possa nela ter ingressado voluntariamente. Esquece-se a Ministra Maria Thereza que a prostituição de jovens no Brasil é fruto da violência, da exploração sexual e de sua condição de vulnerabilidade”, destacou o texto.
Outras notas de repúdio também já foram divulgadas utilizando os mesmos argumentos – pela Comissão Brasileira Justiça e Paz (CBJP), entidade ligada à Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), e pela Associação Nacional dos Procuradores da República (ANPR).
Violência contra a mulher
Diferentes casos de estupro e de violência contra a mulher, especialmente do campo e das florestas, foram discutidos na audiência pública da CPMI desta quinta-feira. A representante da Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura (Contag), Carmen Foro, afirmou que existe uma situação de completa invisibilidade para mulheres e meninas que vivem longe dos centros urbanos.
Já a representante do Conselho Nacional das Mulheres Indígenas (Conami), Maria Helena, revelou que muitas mulheres indígenas sofrem violência dos companheiros, por causa de problemas relacionados ao alcoolismo e às drogas entre os homens da aldeia. E denunciou que a polícia, geralmente, não acolhe as denúncias das índias casadas com homens brancos, o que dificulta medidas mais severas contra a violência. “A Lei Maria da Penha não chega lá. Acho que a lei deveria ser para todas as mulheres do Brasil”, disse.
Após os depoimentos, a senadora Ana Rita encaminhou requerimentos para que sejam feitas diligências e pedidos de informação às autoridades e aos órgãos citados na sessão. “Falar sobre violência é falar de emoções. É se indignar com relatos vivos de histórias descabidas. A CPMI tem a coragem de fazer este trabalho com base em relatos que ouvimos hoje. Isso nos estimula a exercer nosso papel”, comentou.
Catharine Rocha
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