Educação

Trabalhadores da educação defendem 10% do PIB para execução do novo PNE

Presidida pela senadora Teresa Leitão, Comissão de Educação ouviu sugestões do profissionais do setor para o novo PNE

Alessandro Dantas

Trabalhadores da educação defendem 10% do PIB para execução do novo PNE

Senadora Teresa Leitão informou que as demandas da sociedade serão analisadas para a confecção do texto final do novo PNE

Enquanto o Brasil melhorou seu Índice de Desenvolvimento Humano (IDH), subindo cinco posições no ranking global, impulsionado pela melhora na renda e nos dados sobre a saúde, o desempenho na área da educação continua estagnado, sem avanços desde antes da pandemia de covid. No entendimento dos representantes dos trabalhadores da educação, que participaram de audiência na Comissão de Educação (CE), nesta terça-feira (6/5), o cenário só será revertido se o próximo Plano Nacional de Educação (PNE) assegurar, entre as prioridades, um financiamento equivalente a 10% do Produto Interno Bruto (PIB).

A discussão, proposta pela presidente da comissão, senadora Teresa Leitão (PT-PE), faz parte do ciclo de debates sobre o Projeto de Lei (PL 2.614/2024) que estabelece o novo PNE para os próximos dez anos. Proposto pelo Poder Executivo, a partir do documento aprovado na Conferência Nacional Extraordinária de Educação (2024), a matéria institui metas e diretrizes da educação nacional e ainda aguarda votação na Câmara dos Deputados. Em seguida, o projeto será enviado para análise do Senado. 

Os participantes destacaram os dados divulgado nesta terça-feira pelo Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud). Segundo o relatório, o Brasil passou da 89ª para a 84ª colocação entre 193 nações analisadas, com base em dados referentes ao ano de 2023.

O avanço foi impulsionado, principalmente, pelos indicadores de renda e saúde, que mostram sinais de recuperação após os impactos causados pela pandemia da covid-19. No entanto, o desempenho na área da educação, conforme o estudo, tem comprometido a evolução no índice geral. Um dos apontamentos é que o tempo médio de estudo da população brasileira segue abaixo do ideal.  

Para o presidente da Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação (CNTE), Heleno Manoel Gomes Araújo Filho, a estagnação só será superada com investimento adequado para enfrentar o analfabetismo, retomar matrículas na educação básica e combater desigualdades estruturais. Ele citou a concentração de renda e políticas que beneficiam “a minoria dos brasileiros”, como o uso de recursos públicos para pagar juros da dívida pública. 

“Em 2024, enquanto 42,96% dos impostos arrecadados no país foram para as mãos dos ricos, milionários, bancos, para a mão da minoria […], o investimento em educação ficou em 12,95%”, disse. 

A mesma defesa foi feita pela vice-presidente do Sindicato Nacional dos Docentes das Instituições de Ensino Superior (Andes-SN), Raquel Dias Araújo. Ela lembrou que desde 1998, com a discussão do primeiro PNE — o país já contou com a aprovação e execução de dois PNEs — houve o consenso da aplicação de 10% do PIB na educação. Ela apontou o financiamento como a alma do Plano Nacional de Educação e que o projeto não pode apresentar um retrocesso nesse sentido. 

“Há um recuo em relação aos 10%, que estava previsto no documento de 1998. Então nós estamos há 30 anos perseguindo os 10%, quando hoje nós conseguimos chegar a apenas 5,5% para toda a educação, incluindo a privada”, alertou.

O projeto do novo PNE estabelece uma aplicação progressiva que vai de 7% (até 6º ano de vigência) a 10% do PIB, em 2034.

Além da questão orçamentária, Teresa Leitão indicou que outras demandas da sociedade estão sendo apresentadas à comissão e que serão levadas em consideração na formulação do texto final. Ela disse que a meta é aprovar o PNE até o final de 2025 para que ele possa entrar em vigor em 2026. 

“Esse plano carrega muita legitimidade social, ele é fruto de um debate da Conferência Extraordinária de Educação, que só debateu o plano. Não é uma peça perfeita, se não já estaria aprovada. Ela está vindo para cá justamente para ser emendada, aperfeiçoada, tanto por nós, parlamentares, como pelas emendas da sociedade que a gente for acatar ou não”, explicou a senadora.

Ensino superior

O presidente da Federação de Sindicatos de Professores de Instituições Federais de Ensino Superior e de Ensino Básico Técnico e Tecnológico, Francisco Wellington Duarte, avaliou ser preciso aprimorar alguns dispositivos do texto para garantir a ampliação do acesso, permanência e conclusão no ensino superior. 

Entre eles, a garantia de financiamento do ensino superior e técnico, a regulamentação do ensino à distância, a adoção das novas tecnologias, o fortalecimento da pesquisa e da produção científica, e a formação cidadã com foco no combate às desigualdades regionais. 

Para ele, o Brasil só será uma “nação forte e respeitada” quando priorizar o investimento em educação. 

“É preciso que o atual nível de desligamento dos atuais alunos e alunas, hoje em torno de 50%, seja combatido. A formação cidadã e mudanças curriculares alinhadas às transformações sociais e as novas demandas do mundo do trabalho sem, entretanto, tornar essa formação totalmente alinhavada com o mercado. Assim como a expansão, regionalização e interiorização da educação superior de forma articulada ao desenvolvimento econômico e social. Um olhar qualificado para os desníveis regionais do Brasil”, disse.

Valorização dos profissionais 

Já a diretora do Sindicato Nacional dos Servidores Federais da Educação Básica, Profissional e Tecnológica (Sinasefe), Andréa Pereira Moraes, a previsão orçamentária estabelecida no projeto, que é de até 7,5% ao final da sua implantação, está na contramão das metas e estratégias. Enquanto o texto fala em ampliar matrícula, permanência e as conclusões dos alunos, não trata, efetivamente, de ampliar o financiamento para bancar a valorização e formação dos profissionais da educação.

“Como é que a gente pretende dizer que vai cumprir as metas diante dos cortes orçamentários? Como é que a gente pode pressupor uma qualidade no ensino se isso não está sendo passado?”, questionou.

Os participantes da audiência ainda classificaram como retrocessos no projeto de lei o dispositivo que permite à rede pública de educação a contratação de 70% de profissionais da educação por concurso público. O plano que está hoje em vigor estabelece um teto de 90% para contratação de profissionais do magistério por certame público, no entanto, conforme Heleno Manoel Filho, atualmente a rede possui  51,6% dos professores contratados sem concurso.

Enquanto ocoordenador da Secretaria de Assuntos Educacionais e Formação da Confederação Nacional dos Trabalhadores em Estabelecimentos de Ensino (Contee),Allyson Queiroz Mustafá, defendeu que o novo PNE também aponte rumos para a regulamentação da educação privada no país, com a aprovação do Sistema Nacional de Educação (SNE). 

Para ele, o Brasil apresenta hoje um cenário de “mercantilização da educação privada”, com cerca de seis grandes grupos educacionais do ensino superior com mais de 50% das matrículas. Segundo ele, essa financeirização tem se estendido para o ensino básico, disputando, inclusive, o orçamento público em situações de gestão compartilhada e aquisição de materiais didáticos. Ele defendeu, especialmente, que o novo PNE preveja o cumprimento, pela rede privada, de parâmetros mínimos de qualidade do ensino e de valorização do trabalhador, por meio do cumprimento, por exemplo, do piso nacional do magistério. 

“Na Bahia, por exemplo, nosso piso do setor privado é de R$ 11,20. Isso significa o mínimo da hora aula de um professor é de R$ 11,20. O que é absolutamente insuficiente, não garante atração para a carreira, é uma demonstração que ajuda a descontrair a ideia de que no setor privado há uma condição de trabalho, há uma valorização, muito diferentes e muito maiores do que no setor público, e não é real”, afirmou.

Técnicos administrativos 

Por outro lado, o coordenador de Educação da Federação de Sindicatos de Trabalhadores Técnico-administrativos em Instituições de Ensino Superior Públicas do Brasil (Fasubra), Sandro de Oliveira Pimentel, observou que os trabalhadores técnico-administrativos foram deixados a margem pelo projeto de lei. Ele alegou que esses trabalhadores precisam ser olhados como sujeito no processo de implantação do PNE, com a inclusão de uma meta específica buscando a sua valorização. 

“Nós somos essenciais ao funcionamento das universidades, precisamos aprimorar a nossa carreira. Precisamos garantir melhores condições de trabalho. Precisamos que estejamos como sujeito no acompanhamento de todas as fases de implantação do novo PNE”, explicou.

Objetivos, metas e estratégias

A proposta do novo PNE foi elaborada pelo Ministério da Educação a partir das contribuições de um grupo de trabalho, da sociedade, do Congresso Nacional, de estados, municípios e conselhos de educação. 

O texto também inclui sugestões da Conferência Nacional de Educação, realizada em 2024. Para cada objetivo previsto no plano, foram estabelecidas metas que permitem seu monitoramento ao longo do decênio. São 58 metas, comparáveis com os 56 indicadores do PNE 2014-2024 (que foi prorrogado até dezembro de 2025).

Para cada meta, há um conjunto de estratégias com as principais políticas, programas e ações (envolvendo a União, os estados, o Distrito Federal e os municípios) para que os objetivos propostos sejam alcançados.  

Comissão de Educação e Cultura (CE), em audiência pública debate o PL 2614/2024, que institui o novo Plano Nacional de Educação para o decênio 2024-2034.
To top