Combate à fome e à pobreza, transição energética, reforma da governança global e taxação dos super-ricos. Esses são alguns dos temas principais para o governo brasileiro nas agendas com outros países, ressaltou o presidente Luiz Inácio Lula da Silva em entrevista concedida a jornalistas de agências internacionais nesta segunda-feira (22/7).
O presidente defende que os países se unam para assumir a responsabilidade de erradicar a fome no mundo. Por isso, participa na quarta-feira (24/7), no Rio de Janeiro, de reunião para aprovação e pré-lançamento da Aliança Global contra a Fome e a Pobreza. “A fome e a pobreza são um fenômeno do comportamento humano, ou seja, dos dirigentes políticos. Então, a ideia de a gente criar essa coisa importante da aliança global contra a desigualdade e a fome é a razão principal, o tema principal do G20”, afirmou, durante a entrevista.
A iniciativa estabelece um mecanismo prático para mobilizar recursos financeiros e conhecimento de vários países e entidades internacionais, para apoiar a implementação e a ampliação, em escala global, de ações, políticas públicas e programas efetivos desenvolvidos pelos diferentes países e instituições para o combate à desigualdade e à pobreza. O objetivo é ampliar bases para o desenvolvimento e superação da fome a longo prazo. A expectativa é que a Aliança Global contra a Fome e a Pobreza seja definitivamente lançada em novembro, na capital fluminense, durante a Cúpula de Líderes do G20.
Sobre o tema da transição energética, Lula enfatizou que as fontes renováveis de energia representam grandes oportunidades de desenvolvimento para o Brasil e para os países da América do Sul e do continente africano. “É onde os países pobres têm condições de discutir com os países ricos em igualdade de condições. O que é diferente é que os países ricos não têm a riqueza mineral que nós temos, não têm a riqueza florestal que nós temos. Mas eles têm os recursos para ajudar a utilizar as riquezas de floresta, de fauna, de água. Temos que ter recursos suficientes para poder manter isso de pé”, explicou.
Outro assunto destacado pelo presidente foi a taxação dos super-ricos, para que parte da riqueza acumulada possa ser distribuída em forma de pagamento de imposto. “Não estou dizendo que é fácil, estou dizendo que é possível construir um consenso em defesa da taxação dos mais ricos”, frisou.
Lula também falou sobre o seu empenho para reinserir o Brasil na geopolítica internacional, objetivo que considera ter alcançado. “Quando tomei posse, dia 1º de janeiro de 2023, um dos objetivos que eu tinha era tentar recuperar a imagem e a participação política do Brasil nessa nova geopolítica mundial”, disse. Acho que nós conseguimos, com essa participação, colocar o Brasil no cenário internacional”, completou, depois de citar uma série de agendas bilaterais e multilaterais que cumpriu desde o início do governo.
Como resultado de suas missões internacionais, apontou que “nós estamos numa fase agora que é o mundo que vem ao Brasil. O Brasil visitou o mundo, agora o mundo vai visitar o Brasil”. O presidente abordou ainda as políticas públicas lançadas pelo Governo Federal para melhorar a qualidade de vida dos brasileiros e indicou que os resultados passarão a ser notados pela população. “Estou com muita consciência do que nós plantamos e, portanto, tenho certeza do que vamos escolher”, assinalou.
Confira os principais trechos da entrevista do presidente Lula a agências internacionais:
IMAGEM INTERNACIONAL — Quando eu tomei posse, dia 1º de janeiro de 2023, um dos objetivos que eu tinha era tentar recuperar a imagem e a participação política do Brasil nessa nova geopolítica mundial. O Brasil era um país que tinha importância, quando eu deixei a presidência em 2010. Ele teve importância com a Dilma e, depois do impeachment, o Brasil foi perdendo importância no mundo. O Brasil virou quase um pária mundial. Ninguém queria vir aqui e ninguém queria receber o presidente. E eu tinha como missão tentar resgatar essa imagem do Brasil, porque o Brasil pode, tem tamanho, tem população, tem conhecimento tecnológico, científico, tem base intelectual para ser um protagonista internacional. E a gente só consegue ser protagonista internacional se a gente se respeitar, porque ninguém respeita quem não se respeita.
ALIANÇA GLOBAL — Acho que nós conseguimos, com essa participação, colocar o Brasil no cenário internacional. Sobretudo com três temas que nós consideramos extremamente importantes. O primeiro deles: a luta contra a desigualdade e o combate à fome nesse país. A luta contra a desigualdade, a luta contra a fome, a luta contra a pobreza, é uma luta que não pode ser feita por um país. Ela tem que ser feita pelo conjunto dos países que estão dispostos a assumir essa responsabilidade, eu diria, histórica. A fome não é um fenômeno da natureza. A fome, a pobreza é um fenômeno do comportamento humano, ou seja, dos dirigentes políticos. Então, a ideia de a gente criar essa coisa importante da aliança global contra a desigualdade e a fome é a razão principal, o tema principal do G20.
FOME — Quando eu voltei agora, foi muito triste saber que a gente, que tinha acabado com a fome em 2014, voltamos ao mapa da fome. O que me deixa feliz é que nós tiramos, até agora, 24,5 milhões de pessoas da fome e da miséria. Significa que, outra vez, nós vamos acabar com a fome no Brasil. Significa que, outra vez, a massa salarial vai aumentar. Significa que, outra vez, o desemprego vai diminuir. Significa que a inflação vai estar controlada. E nós estamos trabalhando para reduzir a taxa de juros, que é um grande impeditivo do crescimento mais vigoroso do Brasil, é a taxa de juros mais cara do mundo. Então, daí, a relevância da nossa seriedade na questão fiscal, mas a relevância do Banco Central pensar um pouco nesse país, e não só da sua função dentro do Banco Central. Então, estou ciente de que vamos terminar o nosso mandato em uma situação muito boa para o povo brasileiro.
GOVERNANÇA — Além dessa aliança, que pretendemos contar com muitos países, nós vamos discutir a questão de mudança governamental na ONU, ou seja, é preciso que a gente tenha uma governança mundial mais ativa, mais altiva, uma instituição multilateral como a ONU, que tenha mais representatividade, que tenha mais países e não apenas os cinco que criaram a ONU e que estão no Conselho de Segurança.
TRANSIÇÃO ENERGÉTICA — E, ao mesmo tempo, nós vamos discutir um outro assunto extremamente importante que é a questão da transição energética que o planeta tanto necessita, tanto precisa. E, além da transição energética, o Brasil tem um potencial extraordinário, que vocês sabem, não só por conta que a gente já tem 90% da nossa energia elétrica renovável, nós temos 50% da matriz energética toda renovável, nós temos etanol há mais de 40 anos, temos biodiesel, temos biomassa, temos eólica, temos solar e agora entra o momento de exploração do hidrogênio verde. Ou seja, tudo isso são perspectivas extraordinárias para os países como o Brasil, para os países da América do Sul, para os países africanos. É uma perspectiva extraordinária, é onde os países pobres têm condições de discutir com os países ricos em igualdade de condições. O que é diferente é que os países ricos não têm a riqueza mineral que nós temos, não têm a riqueza florestal que nós temos, mas eles têm os recursos para ajudar você a utilizar essas riquezas que você tem de floresta, de fauna, de água. Você tem que ter recursos suficientes para você poder manter isso de pé.
TAXAÇÃO DE RIQUEZAS — Outra coisa que nós vamos discutir também é a questão da taxação das pessoas mais ricas deste país. Vocês sabem que três mil pessoas detêm uma riqueza patrimonial de 15 trilhões de dólares. Isso é mais do que o PIB da Alemanha, do Japão, da Inglaterra juntos. Então, é preciso que a gente faça uma discussão, sabe? Não é difícil acabar com a fome, acabar com a miséria. É só a gente fazer com que as pessoas que têm acumulação de riqueza distribuam um pouco em forma de pagamento de imposto. E eu acho que é possível construir um consenso. Não estou dizendo que é fácil, estou dizendo que é possível construir um consenso em defesa da taxação dos mais ricos.
G20 NO BRASIL — Além de todas essas viagens que nós já fizemos, estamos numa fase agora que é o mundo que vem ao Brasil. O Brasil visitou o mundo, agora o mundo vai visitar o Brasil. Nós, neste nosso G20, temos algumas novidades. A primeira novidade é que temos 67 reuniões do G20 para fazer, dos vários campos. Nós criamos o G20 social. E estamos trabalhando com o empoderamento das mulheres que foi criado na Índia e que a gente quer fortalecer muito porque as mulheres têm um papel extremamente importante na sociedade. E, cada vez mais as mulheres, assumem papel político. Até o Brasil serve como exemplo, porque aqui nós aprovamos uma lei no Congresso Nacional que define o seguinte: trabalho igual, salário igual entre mulheres e homens.