Ao decidir pela cassação automática dos deputados federais condenados no julgamento do mensalão, o Supremo Tribunal Federal (STF) tomou, na opinião do jurista Pedro Serrano, uma das decisões mais inconstitucionais já proclamadas pela Corte. “É evidente que o Supremo errou. É uma antinomia aparente, que pode ser resolvida aplicando a especificidade. Contraria a própria letra da Constituição”, afirma Serrano que é professor da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP).
“O Supremo decidiu fazer política em vez de fazer jurisdição”, comenta Luiz Tarcísio Teixeira, também da PUC-SP. Para ele, ao pretender dar a última palavra, o STF está criando uma crise institucional “desnecessária, perigosa e altamente evitável”, pois há norma específica que regula a questão.
Na mesma linha vai o jurista Luiz Moreira, da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). “Só quem tem voto cassa voto”, afirma, ao explicar que o voto popular sai fragilizado da decisão do STF.
Por 5 votos a 4, o Supremo decidiu pela cassação automática dos mandatos parlamentares dos deputados federais condenados no julgamento doe mensalão. Uma vez transitada em julgado a decisão, quando não houver mais a possibilidade de recursos, estarão suspensos os direitos políticos e extintos os mandatos dos deputados João Paulo Cunha (PT-SP), Valdemar Costa Neto (PR-SP) e Pedro Henry (PP-MT).
A maioria foi formada com o voto do decano Celso de Mello, que desempatou a questão. Ausente nas duas últimas sessões em função de uma febre, o ministro seguiu o entendimento do relator Joaquim Barbosa e dos colegas Gilmar Mendes e Marco Aurélio. “A perda do mandato é uma consequência direta e imediata da perda dos direitos políticos”, argumentou o ministro, nos casos em que a condenação seja por crimes com componentes de improbidade administrativa.
Do outro lado do debate, o revisor Ricardo Lewandowski abriu a divergência afirmando que a Constituição Federal faz uma ressalva sobre os mandatos parlamentares. Para ele — e também para Dias Toffoli, Rosa Weber e Cármen Lúcia —, o texto constitucional reserva exclusivamente às Casas Legislativas a prerrogativa de extinguir os mandatos. O argumento, seguindo este raciocínio, é de que a vontade popular deve ser preservada de arbitrariedades do Poder Judiciário, instituição que não é eleita pelo voto popular. “Uma vez transitada em julgado a decisão condenatória”, proclamou o presidente Joaquim Barbosa, “ficam suspensos os direitos políticos e ficam os réus ora condenados impedidos de exercer mandato representativo”.
Crise institucional
Ao longo de seu voto, o ministro Celso de Mello também respondeu implicitamente ao presidente da Câmara dos Deputados, Marco Maia (PT-RS), que havia alertado para um possível “impasse” entre os Poderes com a questão da cassação.
Em uma série de declarações, Maia havia dito que o Supremo não poderia determinar a extinção dos mandatos. O presidente, que encontrou apoio de diversos líderes partidários da Casa, chegou a aventar a possibilidade de não cumprir a decisão do STF. “A não observância de uma decisão desta Corte debilita a força da Constituição. O STF tem o monopólio da última palavra”, afirmou Celso de Mello, acrescentando que desobedecer decisões judiciais seria um “comportamento intolerável, inaceitável e incompressível”.
Como a decisão fixa que a cassação automática só ocorrerá após o trânsito em julgado, é possível que essa crise institucional nem chegue de fato acontecer. Segundo determina o próprio STF, a fase de execução das penas só se inicia após julgado os últimos recursos e publicado o acórdão final. Assim, é bem possível que o final definitivo da Ação Penal 470 se arraste para de 2014, ano em que se encerra a atual legislatura. O deputado Natan Donadon, por exemplo, foi condenado pelo Supremo em 2010, porém seus últimos embargos foram julgados pela Corte na última quinta-feira (13/12).
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