“Essa não é uma reforma da Previdência. É um debate desonesto porque o governo e seus apoiadores não podem dizer a verdade. A verdade é que estão querendo reformar o modelo de sociedade pactuado em 1988. Esse é o projeto”.
Assim o economista Eduardo Fagnani resumiu a proposta de reforma da Previdência de Bolsonaro (PEC 6/2019) durante audiência pública da Comissão de Direitos Humanos (CDH) que debateu a proposta que passou a tramitar no Senado nesta semana. A audiência foi presidida pelo senador Paulo Paim (PT-RS), presidente da CDH.
Para Fagnani, autor do livro “Previdência: o debate desonesto”, o projeto de reforma previdenciária encampado pelo atual governo representa a continuação do processo de desmonte do Estado Social inaugurado pela Constituição de 1988 colocado em prática pelo governo Temer em 2016. A PEC 6 é a continuação de outras medidas de redução da proteção social como a aprovação do teto de gastos, o aumento da DRU de 20% para 30% do orçamento e a reforma trabalhista.
“A reforma da Previdência é apenas mais uma peça nesse processo para acabar com a seguridade social. Hoje, 82% dos idosos brasileiros tem ao menos a Previdência e o Benefício de Prestação Continuada como fonte de renda. Se você somar a quantidade de benefícios do INSS urbano, rural e BPC são cerca de 40 milhões de benefícios mensais. Esse valor que sustenta a família de um idoso”, explicou o economista.
Para ele, a questão central a ser resolvida pelo Brasil é a política tributária que, atualmente, centrada no consumo potencializa a desigualdade social. Fagnani classificou como um “escárnio” o Brasil sinalizar para um projeto de reforma tributária que vá apenas simplificar as regras de tributação sobre o consumo e retirar a tributação do setor produtivo.
“No Brasil, quando a pessoa recebe a renda cai a desigualdade. Quando ela paga o imposto sobe a desigualdade. E a desigualdade cai de novo com as transferências de rendas sociais como BPC, Previdência, abono salarial, Bolsa Família. O índice de GINI brasileiro é 16 pontos percentuais menor por conta das transferências da Previdência, BPC, Bolsa Família, saúde e educação. E estamos destruindo esses mecanismos de proteção social”, criticou.
“A reforma da Previdência é um potencial concentrador de renda. Temos de alertar para o risco de a proposta ser aprovada com esses elementos que ainda nos preocupam e que podem resultar no agravamento da má distribuição de renda e no funcionamento da economia”, complementou Clóvis Scherer, representante da Associação Brasileira dos Economistas pela Democracia (ABED).
A representante da Associação Brasileira de Juristas pela Democracia (ABJD), Marcelise Azevedo, salientou que a proposta de reforma da Previdência do atual governo significa um forte retrocesso social já que ela diminui direitos fundamentais sociais e alguns pontos e, em outros, chega a extingui-los.
“A Previdência Social é um direito social de 2ª geração que visa assegurar os recursos indispensáveis a manutenção da subsistência dos trabalhadores em situações de risco social, no momento em que elas mais precisam do amparo, poder seguir em frente. A Previdência representa esse amparo. Ao tornar absurdamente rígidos alguns critérios para obtenção do benefício previdenciário, a reforma acaba por inviabilizar o exercício desse direito. E inviabilizando o exercício desse direito é como se ele não existisse”, explicou.