Concessão não é venda – Por Marta Suplicy

A política é uma arte que exige paciência e, às vezes, contorcionismo. Nesta última semana, essas "artes" ocuparam bastante espaço tanto no Senado quanto na mídia. Petistas e peessedebistas se esmeraram em dar suas versões frente à concessão dos aeroportos de Brasília, Guarulhos e Viracopos.

Enquanto governo e petistas comemoravam o enorme sucesso de uma concessão importante para a Copa, a Olimpíada e o desenvolvimento do país, a presidenta era acusada de “estelionato eleitoral”. Aos petistas couberam de ironias até a cobrança de mea-culpa, por fazerem o que antes criticavam.

A intenção do estardalhaço foi igualar privatização com concessão e livrar, por meio desse artifício, a pecha de entreguista e mau negociador que tem corroído as chances tucanas nas últimas eleições.

Na privatização, há transferência de patrimônio e de responsabilidade para a iniciativa privada. Esses ativos não retornam mais ao poder público. A nova empresa -fruto desse processo- toma as decisões de acordo com seus interesses. É o caso da Vale, privatizada por R$ 3,3 bilhões, valor ridículo já à época da venda. Pior foi a venda da telefonia, que tirou qualquer participação da União nas empresas, além de entregar o ouro do século 21 para mãos estrangeiras. Esqueço: sem receber um tostão na venda.

Trocando em miúdos: a privatização feita pelo PSDB é como se eu vendesse meu apartamento. Venda feita e pagamento efetuado, não tenho mais nada a receber, seja de aluguéis ou futura valorização imobiliária.

Na concessão, que é o que foi feito no caso dos aeroportos, o bem ativo não é alienado. Depois de um tempo, volta para o governo, que até então tem a propriedade de 49% das ações dos aeroportos. Essa fatia permite ao governo, como sócio, participar das principais decisões, receber aluguéis e utilizar o ganho na melhoria de outros aeroportos, para os quais seria difícil conseguir interessados.

Dá para dizer que é igual? Não dá, porque não é venda. Na concessão, o tal apartamento continua sendo meu.

Até entendo o esforço para confundir as duas ações, foco de tantas eleições. O ponto importante é que se espera que os grandes aeroportos tenham nova infraestrutura pronta para a Copa e os pequenos sejam recuperados. O bom é que devido às novas condições econômicas do país, os R$ 24,5 bilhões arrecadados, com quase 350% de ágio, não irão para pagamento de dívida, e sim para melhorias para o povo.

Teremos progresso político se, nas próximas concessões, as falas não precisarem ser distorcidas e unirmos forças para ações de qualidade e proteção à economia do país.

Publicado na Folha de S. Paulo

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