“O depoimento de hoje comprova a existência direta da digital de Bolsonaro no atentado do dia 8 de janeiro. Ele é coautor de todos os crimes.” A afirmação foi feita pelo senador Fabiano Contarato (ES), líder do PT no Senado, durante o depoimento de Walter Delgatti Neto à CPMI do Golpe, nesta quinta-feira (17/8).
O hacker coloca o ex-presidente no centro da conspiração golpista que culminou nos ataques do dia 8 de janeiro. “As declarações de Delgatti reúnem elementos para a Justiça decretar a prisão de Bolsonaro e de todos que atentaram contra a democracia”, declarou Contarato, com a autoridade de uma vida como delegado e professor de direito.
Delgatti afirmou durante a oitiva que se encontrou por acaso com a deputada Carla Zambelli (PL-SP) em Ribeirão Preto (SP) e se apresentou. Os dois então teriam trocado contato e, segundo o hacker, a deputada o contatou e ofereceu uma vaga de trabalho. Essa vaga seria na campanha do então presidente Jair Bolsonaro, candidato à reeleição derrotado nas últimas eleições.
Ele também relatou ter sido levado até Bolsonaro pela deputada, e que, em reunião realizada em agosto do ano passado, foi questionado pelo ex-presidente sobre a possibilidade de invasão do sistema das urnas eletrônicas.
No encontro com o então presidente, o marqueteiro de Jair Bolsonaro, Duda Lima, teria proposto a Delgatti a criação de um código-fonte falso para sugerir que a urna eletrônica era vulnerável e passível de fraude.
“A segunda ideia era no dia 7 de setembro pegarem uma urna emprestada da OAB, acredito. E que eu colocasse um aplicativo meu lá e mostrasse à população que é possível apertar um voto e sair outro. O código-fonte da urna eu faria o meu, não o do TSE. Só mostrando, a população vendo que é possível apertar um voto e imprimir outro. Era essa a ideia”, disse Delgatti aos parlamentares.
Na sequência, o depoente ainda reforçou a invulnerabilidade do sistema eleitoral brasileiro dizendo que nem ele, nem ninguém conseguiria invadir uma urna eletrônica e adulterar os dados eleitorais.
De acordo com o hacker, Bolsonaro chegou a lhe prometer indulto, caso fosse decretada a sua prisão ou viesse a ser condenado pela atuação fraudulenta envolvendo as urnas eletrônicas.
“A ideia era que eu receberia um indulto do presidente [Bolsonaro]. Ele havia concedido um indulto a um deputado federal [Daniel Silveira]. E como eu estava com o processo da [operação] Spoofing à época, e com as cautelares que me proibiam de acessar a internet e trabalhar, eu visava esse indulto. E foi oferecido no dia”, relatou Delgatti.
Bolsonaro pediu ajuda em grampo contra Moraes
Walter Delgatti Neto também afirmou, durante a oitiva, que havia sido sugerido a ele por Bolsonaro que assumisse a responsabilidade sobre um grampo que já existiria nos dispositivos do ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes. O pedido foi feito diretamente por Bolsonaro, numa conversa telefônica intermediada por Carla Zambelli, contou o hacker.
“Ela pegou um celular que estava com ela, enviou mensagem a alguém e o presidente da República entrou em contato comigo. E segundo ele [Bolsonaro], eles haviam conseguido um grampo, que era tão esperado à época, do ministro Alexandre de Moraes. Que teria conversas comprometedoras do ministro, e ele precisava que eu assumisse a autoria desse grampo”, relatou Delgatti.
Além disso, o hacker disse ter ouvido de Bolsonaro que o grampo teria sido feito por estrangeiros.
O senador Rogério Carvalho (PT-SE) classificou as denúncias apresentadas pelo hacker Walter Delgatti Neto como “gravíssimas”.
“Estamos diante de uma prática que não vai cessar, diante de um campo político [extrema direita] que não acredita na democracia. Tudo que vimos foi a tentativa de burlar a democracia”, destacou Rogério.
Relatório da Defesa sobre as urnas foi orientado por hacker
Durante o período eleitoral do ano passado, Jair Bolsonaro colocou um peso enorme sobre um relatório que seria produzido pelo Ministério da Defesa acerca da segurança do sistema eleitoral brasileiro.
O relatório não apontou qualquer fraude na votação, mas pediu que o TSE fizesse ajustes no sistema eleitoral já rejeitados tecnicamente por entidades fiscalizadoras e disse que não era possível atestar a isenção das urnas.
Walter Delgatti Neto afirmou, durante o depoimento, que a íntegra do conteúdo do relatório do Ministério da Defesa foi orientada por ele. Apesar de não ter escrito o texto, o hacker destacou que foi ele quem chegou a essas conclusões e as transmitiu aos técnicos do Ministério da Defesa.
“Tudo isso que eu repassei a eles consta no relatório que foi entregue ao TSE. Eu posso dizer hoje que, de forma integral, aquele relatório tem exatamente o que eu disse, não tem nada menos e nada mais”, disse.
Proteção à testemunha
Ao longo do depoimento de Walter Delgatti, vários parlamentares mostraram preocupação com a situação do depoente. O hacker está preso desde o início do mês e, ao longo do dia, disse temer pela sua vida.
No fim da reunião, o vice-presidente do colegiado, Cid Gomes (PDT-CE), informou que a CPMI entrará em contato com o ministro Alexandre de Moraes para que sejam tomadas providências para garantir a segurança de Walter Delgatti.