Divulgação/Polícia Federal

Senadores do PT apontaram diversas inconstitucionalidades na proposta
Os senadores do PT se manifestaram nas redes sociais para explicarem os motivos pelos quais se manifestaram contra a aprovação do Projeto de Lei (PL 2.159/2021) de criação da Lei Geral do Licenciamento no Brasil. Na prática, a proposta que segue para a Câmara dos Deputados enfraquece a regulamentação ambiental no país.
O projeto, por exemplo, permite a emissão automática de licenças com base na autodeclaração do empreendedor, sem qualquer análise técnica prévia, com exceção de projetos de alto risco.
Outro aspecto da proposta é a previsão de dispensa para uma série de atividades agropecuárias, bastando apenas o preenchimento um formulário autodeclaratório sem qualquer verificação sobre impactos ambientais.
O senador Fabiano Contarato (PT-ES), presidente da Comissão de Meio Ambiente (CMA) do Senado, afirmou que o texto aprovado ignora critérios técnicos e abre brechas para liberar empreendimento sem a devida análise de impacto, além de enfraquecer a participação da sociedade.
“Licenciamento não é entrave. É proteção. É o que garante que o desenvolvimento ocorra com responsabilidade, sem colocar em risco vidas, territórios e ecossistemas. Fragilizar esse instrumento é abrir espaço para retrocessos ambientais graves”, alertou.
O líder do governo no Senado, Jaques Wagner (PT-BA), afirmou que a fragilização do licenciamento ambiental impõe um duro retrocesso ao país. Apesar das intensas negociações com os relatores e todos os partidos durante os últimos meses, Wagner explicou que a versão final ficou distante do que o PT considera aceitável. Por isso, o partido votou contra a medida.
“Um dos pontos mais críticos da iniciativa é o risco de o projeto criar uma ‘guerra ambiental’ ao delegar a estados e municípios a liberação de obras com impacto ambiental sem um marco referencial para estabelecer diretrizes nacionais de licenciamento. Também apontamos as ameaças às comunidades indígenas e quilombolas, entre várias outras medidas equivocadas, algumas inconstitucionais”, destalhou.
Nesse ponto específico, Contarato havia alertado aos colegas, em plenário, sobre a inconstitucionalidade da norma. Já que o projeto afronta o artigo 24 da Constituição, que prevê a competência da União para legislar normas gerais sobre meio ambiente.
Em nota divulgada na quarta-feira (21/5), o Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima (MMA) afirmou que o PL representa desestruturação significativa do regramento existente sobre o tema e representa risco à segurança ambiental e social no país.
O líder do PT no Senado, Rogério Carvalho (SE), durante a discussão em plenário lamentou a aprovação da proposta. Ele ainda lembrou os colegas que a atual legislação ambiental foi importante para impor limites a ações possivelmente predatórias e minimizar a ocorrência de desastres ambientais.
“Neste momento se atende ao pensamento de uma maioria. Eu acredito que algumas coisas poderiam constar desse texto, de experiências boas. O Brasil, graças a uma regulamentação e um modelo de licenciamento, conteve muito da destruição que ocorria livremente no nosso país. Não podemos dizer que esse marco existente foi de todo ruim. Ele estabeleceu limites”, apontou o líder.
Ainda segundo o MMA, um dos pontos mais críticos do PL é a aplicação da Licença por Adesão e Compromisso (LAC), modalidade simplificada de licenciamento baseada na autodeclaração do empreendedor.
“Isenção de licenças, autolicenciamento e enfraquecimento de preservação de terras indígenas são pontos com forte potencial de comprometer a conservação do meio ambiente”, avaliou a senadora Teresa Leitão (PT-PE).
A senadora Augusta Brito (PT-CE) também justificou o voto contrário à proposta apontando para o potencial de as mudanças trazerem graves consequências para além da questão ambiental.
“Grandes obras e desenvolvimento são necessários e o licenciamento, às vezes, precisa de maior agilidade. Mas infelizmente, o que foi aprovado tem graves consequências para o ambiente e comunidades tradicionais”, disse.
O presidente do PT, senador Humberto Costa (PE), reforçou a existência de diversas inconstitucionalidades na proposta. Ele também lamentou a aprovação de tamanho retrocesso na área ambiental justamente no ano em que o Brasil sediará a Conferência das Nações Unidas sobre as Mudanças Climáticas, na capital do Pará.
“[O projeto] enfraquece o Ibama e atribui deliberações a estados, municípios e empresas interessadas. Visão ultrapassada de desenvolvimento às portas da COP30”, criticou.
Confira alguns pontos considerados inconstitucionais:
– A Licença por Adesão e Compromisso (LAC) contraria o entendimento do Supremo Tribunal Federal (STF), que autoriza o uso da LAC apenas para empreendimentos de baixo impacto. O projeto generaliza a LAC para empreendimentos de médio impacto, com licenciamento automático, baseado em autodeclaração, sem análise técnica prévia. Enfraquece o papel do Estado, elimina a prevenção de danos e ignora alternativas locacionais.
– O STF declarou inconstitucional a dispensa genérica de licenciamento para atividades agropecuárias, mesmo de baixo impacto. A proposta favorece o agronegócio mais predatório e fragiliza a fiscalização ambiental, com base apenas em formulários autodeclaratórios.
– O projeto viola a Política Nacional de Recursos Hídricos. O licenciamento ambiental, segundo a proposta, passa a independer da outorga de uso da água, desarticulando a gestão hídrica. Isso pode comprometer o direito à água e à saúde, especialmente em contextos de crise climática.
Nota técnica detalha desmonte do licenciamento ambiental no Senado
– O texto também viola os direitos coletivos e constitucionais ao limitar a participação de órgãos técnicos e comunidades tradicionais. Órgãos como Funai, Iphan e ICMBio ficarão restritas a atuarem em terras homologadas ou tituladas, desconsiderando áreas em processo de reconhecimento. Os pareceres desses órgãos não são vinculantes, podendo ser ignorados pelos licenciadores, mesmo sem expertise nas matérias envolvidas.
Os povos indígenas, segundo a proposta, não têm mais a garantia da consulta prévia. Também fica enfraquecido o controle sobre unidades de conservação.
– A chamada guerra ambiental, destacada pelos senadores do PT, se apresenta na proposta nas formas de fragmentação normativa e insegurança jurídica. O projeto permite que estados e municípios definam livremente o que será ou não licenciado, sem critérios nacionais mínimos. E isso entra em conflito com a Constituição, que prevê a competência da União para legislar normas gerais sobre meio ambiente.
Isso deve gerar desigualdade entre entes federativos, judicialização em massa e um ambiente regulatório caótico.
Com voto contrário do PT, Senado flexibiliza regras de licenciamento ambiental