“Era quase impossível, mas conseguimos”, diz Viana

A difícil votação da Medida Provisória do Código Florestal (MP 571/2012) ainda ecoa no Senado Federal, nesta quinta-feira (30/08) – um dia depois da última sessão da Comissão Mista que analisou a matéria. O texto, que só teve a continuidade da tramitação garantida após um desafiador entendimento entre os parlamentares ligados as causas ambiental e ruralista, foi o tema do pronunciamento do senador Jorge Viana (PT-AC), vice-presidente da comissão e um dos principais interlocutores da negociação. Ele ressaltou que o maior desafio do acordo era reverter o “desastre” da votação passada, que colou sob risco de extinção parte da água potável do País ao aprovar uma emenda que derrubava a proteção dos rios temporários.

Mesmo conseguindo resgatar, em parte, os estragos causados pela última votação na legislação, Viana avaliou que o resultado final “não é bom, mas razoável, porque foi o possível”. “O Brasil, certamente, precisa de um Código diferente do que votamos, para se firmar como um líder mundial na produção de alimentos, cuidado com seus recursos naturais. Esse não foi o Código votado ontem. Lamentavelmente, não foi, porque nós tínhamos de fazer o impossível”, afirmou, lembrando da árdua missão de consolidar uma proposta que exigia a unanimidade dos parlamentares. Especialmente, em função do jogo de barganha operado por alguns ruralistas, que trocaram a restauração dos rios intermitentes e das nascentes pela redução da necessidade de recomposição de Áreas Proteção Permanente (APPs) para médios e grandes agricultores.

Para evitar que a MP perdesse a validade, deixando os agricultores familiares – ou 90% dos produtores brasileiros – na completa insegurança jurídica, o relator da MP, senador Luiz Henrique (PMDB-SC) teve que ceder à pressão ruralista. O acordo só vingou após Luiz Henrique alterar a proposta, do Governo, de recomposição para imóveis de 4 a 10 módulos fiscais. Antes era exigida uma margem de, pelo menos, 20 metros de vegetação ao redor de rios, localizados nessas propriedades. Com a mudança, a área reflorestada terá 15 metros de largura e se estende as propriedades de até 15 módulos. Para fazendas maiores que 15 módulos, a APP passou de, no mínimo, 30 para 20 metros, com a ressalva de que as definições sobre a largura, que pode atingir 100 metros, serão estabelecidas pelo Programa de Regularização Ambiental, que será instituído nos estados.

“Não é o que eu queria. Não é o que Vossa Excelência [Jorge Viana] queria. Tivemos de, na negociação, fazer também concessões. Mas o resultado, posso garantir, foi o de termos a lei mais avançada em termos ambientais do mundo”, ponderou Luiz Henrique, após elogiar o trabalho de Viana e constara que foi “um dos maiores privilégios” que teve em sua carreira política, semelhante ao proporcionado pelo convívio de outros emblemáticos nomes da política, como, por exemplo, Ulysses Guimarães, Teotônio Vilela. Nomes que, além de marcarem importantes páginas da história do País, também estão inscritos nas paredes do Senado, batizando os espaços comuns da Casa.

Falta de mobilização

Viana argumentou que, apesar das flexibilizações realizadas no Código, a “espinha dorsal” da proteção ambiental está mantida. Entretanto, admitiu que o resultado poderia ter sido melhor, caso entidades ambientalistas radicais tivessem se mobilizado no processo de negociação ao invés de apenas encampar “o veta tudo Dilma”.

“O embate radicalizado não trouxe uma árvore de volta. Agora estamos saindo da política do faz de conta. Mas há algo estranho acontecendo no País. Onde estavam os que lideram o movimento ambiental quando nós estávamos decidindo, ontem, sem voto, uma das mais importantes leis ambientais do Brasil, que é o nosso Código Florestal?”, questionou o senador, recordando que havia pedido mobilização do movimento e que ninguém compareceu a audiência.

Modificações

Os senadores Jorge e Luiz Henrique ainda listaram algumas das principais propostas e polêmicas que permearam durante toda a discussão do Código, desde a primeira análise do projeto na Câmara. São elas:

– O novo parâmetro adotado para medir o início das APPs é “leito regular”, altura da margem que o rio alcança na maior parte do ano. Na legislação anterior, era o “ponto mais alto”, cuja função era evitar a ocupação de áreas sob risco de enchentes e alagamentos.  

– A adoção mínima de 20 metros, e não 30 metros, para a recomposição das grandes propriedades rurais. Nas discussões na Câmara a proposta era de apenas 15 metros. Mas a presidente Dilma Rousseff vetou, orientada por uma avaliação da Agência Nacional de Águas (ANA) mostrando que os 15 metros são insuficientes para proteger todos os rios. Mesmo não conseguindo manter a proposta do Governo de 30 metros, conforme o texto inicial da MP, os ambientalistas que tiveram que admitir os 20 metros conseguiram amarrar ao PRA a consulta sobre a largura da área a ser reflorestada, que terá no máximo 100 metros de largura.

– A divisão do Código em regras permanentes e transitórias, para estimular a recomposição ambiental. Na parte permanente estão todos os limites e regras que valem para a exploração das florestas. E na transitória estão as medidas que promoveram o reajuste dos produtores ilegais com a natureza, especialmente pela recuperação do que foi ilegalmente desmatado. Eliminado assim o fantasma da anistia.

– Além disso, o Código institui a maior política de reflorestamento do mundo, com o PRA – um plano que os produtores irregulares deveram assinar, após se regularizarem junto ao Cadastro Ambiental Rural (CAR). Os inscritos no PRA, terão as multas suspensas, até recuperarem o dano ambiental que fizeram.

Tramitação

A MP 571 ainda precisa ser aprovada nos plenários da Câmara dos Deputados e Senado Federal, antes de seguir para a sanção presidencial.

Catharine Rocha

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