Pau D’Arco

Gestão Temer incentiva violência no campo

Nos últimos 50 dias foram quatro massacres diferentes em diferentes regiões rurais do País
Gestão Temer incentiva violência no campo

Foto: Comissão Nacional de Direitos Humanos

A chacina ocorrida na Fazenda Santa Lúcia, em Pau D’Arco, região sudeste do Pará, no último dia 24 de maio e que resultou na morte de dez trabalhadores rurais motivou audiência pública da Comissão de Direitos Humanos (CDH) para debater as causas e soluções para a escalada de conflitos no campo.

Nos últimos 50 dias foram quatro massacres diferentes em diferentes regiões rurais do País. Colniza (MT), com nove mortes; Vilhena (RO), três mortes; Viana (MA), 22 índios Gamela feridos, além da chacina em Pau D’Arco, Pará.

Vinte anos após o massacre ocorrido em Eldorado dos Carajás, também no Pará, em que 19 trabalhadores rurais foram assassinados por policiais militares, ressurgem no País diversos casos de chacinas no meio rural.

Na avaliação do senador Paulo Rocha (PT-PA), é preciso recuperar a memória dos conflitos já ocorridos pelo País, para que os agentes do Estado possam ter mais subsídios na busca de soluções que interrompam a matança. Para o senador, lamentavelmente, nos casos de conflitos rurais, o Estado costumeiramente tem optado por estar ao lado do agronegócio.

“Precisamos recuperar a memória desse processo e debatermos soluções para que não nos passemos como agentes omissos ou pensem que o Estado brasileiro é omisso nessas questões. Quando se processa um conflito como esse, o Estado costuma optar por um lado”, disse.

A procuradora geral dos direitos do cidadão, Deborah Duprat, classificou como “inverossímil” a versão da polícia militar do Pará. Na oportunidade, os tinham como objetivo o cumprimento de busca e apreensão contra suspeitos de envolvimento na morte de um dos seguranças da empresa privada responsável pela guarda da fazenda Santa Helena. Ainda segundo os policiais, as mortes dos trabalhadores rurais ocorreram após uma troca de tiros.

[blockquote align=”none” author=” Procuradora Geral dos Direitos do Cidadão, Deborah Duprat”]“Essa primeira versão apresentada pela Secretaria de Segurança Pública rapidamente endossando que teria havido um conflito na área nos assustou muito. É no mínimo estranho que dez pessoas morram e se ache que vai ficar por isso mesmo” [/blockquote]

Deborah Duprat, que esteve na região, classificou o local como “de difícil acesso” por conter mato alto nos arredores e disse achar muito difícil os trabalhadores não terem conseguido se esconder ao avistar a chegada dos policiais se eles realmente tivessem a intenção de fugir.

“Essa primeira versão apresentada pela Secretaria de Segurança Pública rapidamente endossando que teria havido um conflito na área nos assustou muito. É no mínimo estranho que dez pessoas morram e se ache que vai ficar por isso mesmo. É uma região em que os trabalhadores rurais se esconderiam facilmente no mato que é muito alto e estariam invisíveis com apenas dez passos. É curioso que a polícia chegue depois de uma chuva, provocando barulho, os trabalhadores reagem com tiros a essa chegada, a polícia atira, mata todo mundo e ninguém saiu ferido. É uma versão absolutamente inverossímil”, avaliou.

Após as mortes dos trabalhadores, os policiais foram flagrados por sobreviventes da chacina empilhando corpos na traseira de uma picape configurando a alteração da cena do crime.

Para a procuradora, o Brasil vive um cenário que estimula a ação contra os trabalhadores rurais com a reforma agrária paralisada, sinais legislativos como a aprovação da Medida Provisória da Regulamentação Fundiária (MP 759) e a CPI da Funai que acabam dando a impressão de que “um lado teria vencido essa disputa e teria uma certa autorização para agir sobre trabalhadores rurais”.

“Estamos numa situação no campo que enseja preocupação. Temos esses episódios se sucedendo com uma velocidade absurda. Não se mata apenas. Se mata, tortura e mostra-se o que está fazendo. Saio muito desconfiada de que há uma naturalização no estado do Pará de que as forças policiais ali estão para salvaguarda do latifúndio. Não só por essa investigação, mas pela análise de vários outros processos. Ainda que assim não seja, essa é a percepção do comportamento policial”, disse.

Para Osmar Prado, do Movimento Humanos Direitos (MDuH), o processo que desembocou nessa chacina “com requintes de crueldade e ódio” está atrelado a realidade política vivida nesse momento no Brasil está atrelada ao início do processo de impeachment da presidenta Dilma.

“A abertura do processo de impeachment abriu as portas para o conservadorismo, desencadeando a violência que já existia, não só nos grandes centros urbanos com a morte da comunidade negra pobre e jovem, mas também com o acirramento da luta no campo”, apontou.

O líder do PT no Senado, Lindbergh Farias (RJ) chamou a atenção para os números alarmantes apresentados por estudo da Comissão Pastoral da Terra sobre a violência no campo. Em 2016, houve o registro de 1.536 conflitos no campo. O número representa um crescimento de 26% com relação ao ano anterior. No ano passado, foram 61 assassinatos registrados em conflitos no campo, uma média de cinco por mês.

“Esse ano de 2017 estamos presenciando uma escalada gigantesca de violência. Nos últimos 50 dias foram quatro massacres diferentes. Em Pau D’Arco as vítimas foram mortas pela Polícia Militar. Existe um debate paralelo que é a desmilitarização da polícia. Nossa polícia ela é, na verdade, força de reserva do Exército. Todo o treinamento é feito como se do outro lado estivesse o inimigo e não o cidadão que tem que ser protegido”, disse.

A senadora Gleisi Hoffmann relatou que a realidade no Paraná não é muito diferente da apresentada no estado do Pará com relação a conflitos pela terra. Além disso, em sua avaliação, o governo federal tem incentivado a violência no campo pela postura, discursos e pessoas que são nomeadas, como o ex-ministro da Justiça, Osmar Serraglio, que sempre se posicionou de forma contrário aos movimentos sociais.

“Recentemente tivemos três companheiros do movimento dos sem-terra mortos em Quedas do Iguaçu. Estamos vivendo uma situação triste em relação aos movimentos sociais e os movimentos de defesa pelo acesso a terra. A criminalização tem sido muito grande”, disse.

O senador Paulo Paim (PT-RS) criticou o fato de a violência no campo estar se espraiando pelo Brasil. Para ele, o estado do Pará não é uma exceção. “Parece que virou corriqueiro fazer isso. Pelo que percebo, se nada for feito isso continuará acontecendo”, disse.

O senador José Pimentel (PT-CE) disse que “uma das grandes raivas da elite, particularmente na região Nordeste, é que os programas sociais proporcionaram aos cidadãos mais pobres a possibilidade de deixarem de trabalhar nas propriedades privadas em troca de comida”, prática na década de 90.

“Essa era uma política muito perversa. Ao mesmo tempo em que proporcionamos uma melhor condição de vida, assistimos à diminuição do êxodo rural. Infelizmente, com o golpe de 2016, assistimos uma ação acompanhada da retirada de um conjunto de direitos. A vítima da cidade é exatamente o nosso trabalhador rural de ontem que estava na roça e foi expulso. Aqueles que ainda resistem estão sendo expulsos pelo grande latifúndio”, apontou.

Encaminhamentos
Dentre as soluções apontadas pela Comissão, o colegiado solicitará aos órgãos competentes a proteção das testemunhas da chacina e ao secretário de segurança pública do Pará será solicitada a celeridade ao inquérito.

O colegiado também solicitará o cumprimento da normativa do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) que determina o cancelamento de registro de terra do estado do Pará considerados irregulares.

A Comissão também passará a apoiar o Projeto de Lei do Senado de autoria do senador Paulo Rocha – PLS 166/2017. O texto prevê a alteração do Código de Processo Civil para prever o acompanhamento presencial por membro do Ministério Público da execução de manutenção ou reintegração de posse, de despejo, ou de qualquer medida judicial que importe em remoção de famílias nos litígios coletivos pela posse de terra rural ou urbana.

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