Governo volta a dizer que é contra mudanças na demarcação

“Somos contrários e temos a convicção de que o poder de demarcação de terras da União é do Poder Executivo”, disse a ministra Gleisi.

Governo volta a dizer que é contra mudanças na demarcação

O Governo Federal reafirmou, nessa terça-feira (1º), sua posição contrária à Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 215, que transfere do Executivo para o Legislativo a atribuição de demarcar terras indígenas. “A posição do governo com relação à PEC 215, já externada às lideranças indígenas em mais de uma ocasião, é que esta proposta é inconstitucional. Somos contrários e temos a convicção de que o poder de demarcação de terras da União é do Poder Executivo”, afirmou ministra-chefe da Casa Civil, Gleisi Hoffmann.

Índios estiveram hoje no Senado e na Praça
dos Três Poderes para pedir a rejeição da
emenda constitucional

Líderes indígenas representando etnias de todo o País estão em Brasília para protestar contra a tentativa de transferir a decisão sobre a demarcação de suas terras para o Legislativo. Eles montaram acampamento na Esplanada dos Ministérios, em frente ao Congresso Nacional e desde o começo da manhã começaram a chegar à Câmara e ao Senado para pressionar os parlamentares pela rejeição da PEC 215. A mobilização levou o presidente da Câmara, Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN) a anunciar o adiamento da instalação da comissão especial encarregada de analisar o projeto. Segundo Alves, o objetivo é construir “uma proposta consensual, que possa pacificar”.

No início de julho, a presidenta Dilma Rousseff já havia manifestado a posição do Governo, contrária à PEC 215, num encontro com lideranças indígenas no Palácio do Planalto. Nesta terça-feira, Gleisi Hofmann lembrou que o Executivo vem trabalhando para mediar conflitos entre fazendeiros e indígenas por demarcação de terras, realizando reuniões “com lideranças de ambos os lados, dialogando, conversando, para acertar os casos de disputas e evitar a judicialização”.

A ministra afirmou que a proposta de incluir outros órgãos, além da Fundação Nacional do Índio (Funai), no processo de demarcação de terras indígenas tem o objetivo de “tornar o processo mais transparente e minimizar disputas judiciais, com saídas para situações complexas e antecipando negociações e reconhecimento de direitos. A Funai continuará sendo o órgão coordenador e decisivo neste processo”, completou.

Gleisi afirma que o governo brasileiro tem demonstrado compromisso com os direitos dos povos indígenas às terras originárias. Hoje, cerca de 120 milhões de hectares estão demarcados, o que representa 13% do território nacional ou uma área equivalente a Angola. Já a área plantada, ocupa 7% e as áreas urbanas e de infraestrutura respondem por 2% do território nacional. Apenas nos últimos 10 anos, 91 áreas foram demarcadas em favor dos índios. “O Estado de Direito é para todos os brasileiros, índios e não índios”, afirmou a ministra.

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O Governo reafirmou ainda que a Funai
continuará a ser o órgão com a palavra
final sobre as demarcações

A criação da comissão especial para analisar a PEC 215 na Câmara dos Deputados reascendeu o debate sobre a matéria, que está em tramitação desde 2000. Uma mobilização nacional envolvendo as etnias e organizações que apoiam os direitos indígenas foi convocada para esta semana, contando com a presença, em Brasília, de lideranças vindas das diversas regiões do País.

Com a suspensão da instalação da comissão destinada a analisar a PEC, anunciada pelo presidente da Câmara, representantes do Legislativo e do Executivo deverão se reunir, na próxima semana, criar um grupo de trabalho para discutir um texto consensual.

A PEC 215, de autoria do ex-deputado Almir Sá (PPB-RR), é apoiado pela bancada ruralista. Já foi aprovado pela Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara, mas, antes de ir ao plenário, tem de ser avaliado pela comissão especial. A proposta é alvo de críticas dos índios por retirar do governo federal a autonomia para demarcar terras indígenas, de quilombolas e zonas de conservação ambiental.

Há 20 dias, mesmo sob protesto de líderes indígenas, o presidente da Câmara havia afirmado que iria instaurar o colegiado. A instalação da comissão parlamentar motivou a ocupação da Câmara por dezenas de representantes de várias etnias em abril. Na ocasião, para pressionar a direção do Legislativo a não criar o comitê, os índios tomaram o plenário principal e interromperam por mais de duas horas as atividades da Casa. Os indígenas só aceitaram deixar o prédio da Câmara depois que Alves prometeu não instalar a comissão no primeiro semestre.

Nesta terça, com a segurança do Congresso reforçada, um grupo de índios de diversas tribos se limitou a fazer uma manifestação pacífica na Esplanada dos Ministérios contra a PEC 215, que propõe mudanças nos critérios de demarcação.

Audiência pública

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“Cabe ao Legislativo sim fazer as leis e fiscalizar
a implementação das leis, mas não executá-las”,
disse Ana Rita na audiência

Por intermediação da senadora Ana Rita (PT-ES), uma comitiva de 70 índios foi autorizada pela polícia legislativa do Senado a acompanhar uma audiência pública na Comissão de Direitos Humanos (CDH) da Casa. O restante dos indígenas se manteve sob uma lona de circo instalada nos gramados da Esplanada, em frente ao prédio do Congresso Nacional.

De acordo com a presidente da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib), Sônia Boni, os índios não ficarão mais parados assistindo ao movimento da bancada ruralista no Congresso para impedir a participação dos índios na questão de demarcação de terras. Ela também se disse inconformada com o tratamento dado na chegada ao Senado.

“Mais uma vez, ao chegar à Casa, somos recebidos com a truculência da polícia. A gente não entende porque, sendo a casa do povo, a gente não pode entrar e discutir as questões que estão sendo tratadas.[…] Se as coisas estivessem acontecendo como na Constituição Federal, a gente não precisaria estar aqui”, afirmou.

Um dos principais pontos debatidos durante a audiência foi a Emenda 215. Atualmente, o Ministério da Justiça edita decretos de demarcação a partir de estudos feitos pela Funai. “Isso é muito ruim. Eu, particularmente, entendo que isto é inconstitucional, porque a execução de políticas cabe ao Executivo fazer, não cabe ao Legislativo. Cabe ao Legislativo sim fazer as leis e fiscalizar a implementação das leis, mas não executá-las”, disse a senadora Ana Rita.

Foto1: Agência Brasil

Com agências onlines

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