Investigados por esquema de propina preferem o silêncio na CPI do Carf

Investigados por esquema de propina preferem o silêncio na CPI do Carf

Alexandre Paes afirmou não ter “nada a ver com o Carf”O silêncio frustrou uma das audiências mais aguardadas da CPI que investiga irregularidades no Conselho Administrativo de Recursos Fiscais da Receita Federal (Carf). Nesta quinta-feira (19), durante reunião do colegiado, dois dos principais investigados pela Operação Zelotes usaram o direito de ficarem calados, garantido por um habeas corpus concedido pelo Supremo Tribunal Federal. 

Os inquiridos foram os lobistas Alexandre Paes dos Santos e José Ricardo da Silva, ambos detidos pela Polícia Federal e suspeitos de intermediar o pagamento de propinas para manipular julgamentos no Carf. 

Enquanto José Ricardo nem sequer se manifestou, Paes praticamente não contribuiu com o trabalho dos senadores. Entre as raras declarações dadas na CPI, ele disse não ter nenhum interesse em aderir a uma delação premiada, com o intuito de revelar mais detalhes do esquema criminoso em troca de redução de pena. O lobista também negou conhecer o filho do ex-presidente Lula, Luís Cláudio, ou que tenha estado alguma vez com o ex-ministro da Casa Civil Gilberto Carvalho. Disse ainda não ter “nada a ver com o Carf”. “Nunca fui nem trabalhei lá”, acrescentou. 

Para a relatora da CPI, senadora Vanessa Grazziotin (PCdoB-AM), Paes e José Ricardo atuavam no “centro do esquema de corrupção” existente no Carf. Eles também vêm sendo investigados por tráfico de influência na edição de medidas provisórias que favoreceram setores como o automotivo. 

Em audiências anteriores, ex-funcionários do escritório de advocacia de José Ricardo, que é ex-conselheiro do Carf, revelaram movimentações financeiras volumosas no local. Diversos saques foram feitos pelo contínuo do escritório, Hugo Borges, algumas somando mais de R$ 400 mil por dia. As transações suspeitas, segundo Borges, começaram em 2009, quando José Ricardo se juntou a Alexandre Paes. 

A audiência com os dois ex-sócios era importante para esclarecer, por exemplo, o possível envolvimento do ministro do Tribunal de Contas da União, Augusto Nardes, no esquema criminoso. 

No dia 15 de outubro, uma das ex-funcionárias do escritório de José Ricardo —que é ex-conselheiro do Carf —, Gegliane Bessa Pinto, confirmou ter repassado dinheiro em um envelope ao sobrinho de Augusto Nardes. Gegliane disse aos senadores da CPI que não sabia os valores recebidos por Juliano Nardes, sobrinho do ministro do TCU, mas que havia feito “dois ou três” repasses de dinheiro para ele dentro de envelopes. “Sei que tinha dinheiro, porque uma vez o Juliano abriu um envelope e falou: ‘Tá faltando’”, revelou ela. 

A contadora não soube explicar a razão dos pagamentos a Juliano, já que ele não prestaria nenhum serviço ao escritório, mas contou à CPI que ele ia com frequência ao local – cerca de duas vezes por semana. Hugo Borges, também ex-funcionário no mesmo escritório, confirmou as informações. 

A revelação pode comprometer o ministro Nardes porque os valores repassados a Juliano, no escritório, eram anotados em planilhas – em posse da Polícia Federal – junto com a palavra “tio”. Não bastasse isso, o ministro e o sobrinho são sócios na empresa Planalto Soluções e Negócios. 

Novo modelo de atuação 

Após a reunião, Vanessa Grazziotin afirmou que estuda propor um novo modelo de funcionamento para o Carf. O relatório da parlamentar sobre a CPI deve ser divulgado na próxima semana. 

Para a senadora, já existe um consenso atual de que “do jeito que está o Carf não pode ficar”. Ela defende que o órgão funcione apenas com servidores indicados pelo governo, por se tratar de uma instância recursal de caráter administrativo. 

O Carf atua como uma espécie de ‘tribunal’ onde os grandes contribuintes podem contestar multas aplicadas pela Receita Federal. Atualmente, metade dos conselheiros do órgão são indicados pelas confederações patronais, que representam as empresas privadas. 

“Garantindo-se pleno direito de defesa ao contribuinte, é claro. Mas vale lembrar que daí pra frente, se for o caso, o contribuinte tem pleno direito de contestar na esfera judicial”, afirmou Vanessa. 

A senadora disse ainda não estar convencida quanto à conveniência da proposta de Ataídes Oliveira de tornar obrigatório o preenchimento de todas as vagas do Carf por concurso público. Para ela, é que no novo modelo de gestão da instituição sejam definidos prazos claros de julgamento para todos os processos em análise. 

Carlos Mota 

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