Mandetta

Bolsonaro assumiu riscos em busca da imunidade de rebanho

Ex-ministro confirmou que o atual presidente assumiu o risco de expor os brasileiros ao vírus
Bolsonaro assumiu riscos em busca da imunidade de rebanho

Foto: Alessandro Dantas

Primeiro depoente da CPI da Covid, o ex-ministro da Saúde do governo Bolsonaro, Luiz Henrique Mandetta (DEM) confirmou aos senadores que o atual presidente da República assumiu o risco de expor os brasileiros ao vírus em busca da imunidade coletiva ou imunidade de rebanho – tese que propõe acelerar o contágio da população a fim de criar anticorpos à doença de forma natural.

Mandetta foi demitido por Bolsonaro, em abril, já em meio à pandemia, e disse aos parlamentares que, à época, percebia que o presidente era simpático à tese da imunidade de rebanho. O ex-ministro também destacou que Bolsonaro duvidou da gravidade da pandemia, ainda no início, quando apresentada a estimativa de 180 mil mortos até dezembro de 2020 caso o país não adotasse medidas firmes de combate ao coronavírus.

“A impressão que tenho é que algumas teorias eram mais simpáticas [ao presidente]. O entendimento era de que as pessoas moram aglomeradas, moram em favelas, moram sem esgoto. O brasileiro vai se contaminar e vai morrer só quem tem que morrer. E só está morrendo idoso. Vai se atingir o coeficiente de proteção de rebanho. E embarcaram nessa teoria”, disse o ex-ministro.

Para o senador Humberto Costa (PT-PE) o depoimento do ex-ministro confirma que o governo Bolsonaro buscava a imunidade de rebanho como estratégia para vencer a pandemia da Covid-19.

“A posição do governo leva a conclusão de que o presidente assumiu por conta e risco a adesão a tese da busca da imunidade de rebanho. Essa foi a linha que Bolsonaro adotou. Tanto que ele várias vezes falou que isso seria como chuva, que todo mundo iria se molhar. Se isso for verdade, é uma ação altamente criminosa. Sabendo-se, inclusive, das consequências em termos do número de mortes”, disse o senador Humberto Costa.

O senador ainda destacou estudo Faculdade de Saúde Pública da USP e a Conectas Direitos Humanos que analisaram 3.049 normas federais produzidas em 2020 e concluiu que Bolsonaro executou uma “estratégia institucional de propagação do coronavírus”.

Produção em massa de cloroquina
O ex-ministro Luiz Henrique Mandetta disse que não partiu do Ministério da Saúde a orientação para a produção de cloroquina pelo Exército para o combate ao novo coronavírus.

Segundo ele, durante sua gestão, havia quantidade suficiente do medicamento pela Fiocruz para aquilo que lhe convém, como o tratamento da malária. Apesar disso, afirmou que fez consulta ao Conselho Federal de Medicina, que orientou que o medicamento era para o uso compassivo -quando não há outro recurso terapêutico para os pacientes graves em ambiente hospitalar.

Assessoria paralela ao Ministério da Saúde
O ex-ministro afirmou que teve acesso ao que seria uma proposta de decreto presidencial para alterar a bula da cloroquina. A medida seria feita de uma forma que passasse a indicar o remédio no tratamento da Covid-19.

“Ele (Bolsonaro) tinha um assessoramento paralelo. Havia sobre a mesa um papel não timbrado de um decreto presidencial para que fosse sugerido naquela reunião mudar a bula da cloroquina na Anvisa para que na bula tivesse a indicação do medicamento para o coronavírus. O presidente da Anvisa disse que não. Jorge Ramos disse que era uma sugestão”, afirmou Mandetta.

Foto: Alessandro Dantas

O senador Rogério Carvalho (PT-SE) classificou como “gravíssima” a informação trazida pelo ex-ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta, acerca da tentativa de alteração da bula da cloroquina.

“Acho grave o debate sobre a prescrição, a recomendação de medicamento não validado cientificamente. Acho mais grave ainda a sugestão de alterar a bula de um remédio para que ele possa ser levado ao consumo humano. O Estado tem a tarefa de proteger a vida e não de colocar em risco a vida de sua população. Isso é uma situação gravíssima”, classificou o senador.

O ex-ministro da Saúde citou ainda que testemunhou por diversas vezes a presença de Carlos Bolsonaro, vereador pelo Republicanos no Rio de Janeiro e filho do presidente, em reuniões ministeriais. “Testemunhei várias vezes reunião de ministros em que o filho do presidente que é vereador do Rio de Janeiro estava sentado atrás dele tomando notas. Eles tinham reuniões dentro da Presidência”, disse Mandetta.

Dificuldade nas relações com a China
O ex-ministro afirmou que filhos políticos de Bolsonaro acompanhavam reuniões ministeriais que tratavam do enfrentamento ao vírus e atrapalharam a relação com a China, principal fornecedora de insumos. Segundo o ex-ministro, Carlos Bolsonaro e os irmãos, o deputado Eduardo Bolsonaro (PSL-SP) e o senador Flávio Bolsonaro (Republicanos-RJ), chegaram a barrar uma reunião presencial com o embaixador da China no Planalto.

“O outro filho do presidente, Eduardo [Bolsonaro], tinha rotas de colisão com a China. Um dia estavam os três filhos do presidente [no Palácio do Planalto]. E disse a eles que precisava conversar com o embaixador da China. E ele disse que ‘aqui não’. Acabei fazendo por telefone. Havia dificuldade de superar essas questões”, relatou.

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