Mídia: Marcos Coimbra traduz reações da imprensa sobre a CPMI

O cientista político Marcos Coimbra retoma hoje, no Correio Braziliense, a tese lançada pela mídia dominante de que a CPI Mista que vai investigar a rede criminosa do contraventor Carlos Cachoeira não passa de um ardil para desviar a atenção do público sobre o julgamento do chamado “mensalão” no Supremo Tribunal Federal (STF). Para Coimbra, há varias reações na mídia – desde a desconfiança, até a ira contra o engajamento do PT na investigação dos tentáculos de Cachoeira em empresas privadas, inclusive as de mídia. Ferino, ele ironiza: diz que o senador Demóstenes Torres (sem partido-GO) é um “criptopetista”.

Leia abaixo o texto na íntegra:

Mensalão vs. CPICorreio Braziliense – Por Marcos Coimbra

Ingênuo é achar que o PT deixaria um escândalo como esse passar em branco, sem se aproveitar dele politicamente

Nossa “grande imprensa” está reagindo de forma curiosa à instalação da CPI do Cachoeira. Salvo uma ou outra voz discordante, anda cheia de desconfianças. No mínimo. Em alguns casos, sua má vontade é clara. Em outros, mostra-se furiosa.

Cabe a pergunta: o que esperava do Congresso? O que deveriam senadores e deputados fazer frente as denúncias de que Demóstenes Torres está afundado até a raiz dos (poucos) cabelos em gravíssimas irregularidades, assim como, em escala menor, alguns deputados e lideranças de vários partidos?

E quanto às suspeitas que alcançam os governos de Goiás e Distrito Federal, a revista Veja — um dos baluartes da imprensa de direita — e grandes empresas privadas agora que pipocam indícios de todos os lados?O certo seria que cruzassem os braços e fingissem que nada acontece?

Quando Lula e as lideranças do PT no Congresso entraram em campo para defender a criação da CPI, comportaram-se como é natural na política: perceberam que seus adversários estavam fragilizados e agiram.

As atuais oposições fizeram a mesma coisa quando tiveram a oportunidade. Assim como os próprios petistas no passado, quando eram oposição e não deixavam escapar qualquer chance de atingir o governo.

A desconfiança da maioria dos comentaristas — e a fúria de alguns — tem a ver com a ideia de que a CPI do Cachoeira é útil ao PT.

Existem CPIs que não são políticas — as que investigam e propõem medidas para enfrentar problemas sociais relevantes. Hoje, por exemplo, há três dessas na Câmara: uma a respeito do abuso infantil, outra do trabalho escravo e uma terceira sobre o tráfico de pessoas. Por mais meritórias que sejam, alguém acompanha seus trabalhos e se interessa por elas, a não ser (talvez) os especialistas?

Resultam de consensos, o inverso do que ocorre nas CPIs políticas. Essas são invariavelmente contra algo ou alguém — governo, governante, partido.

Se nossos comentaristas estão desconfiados — ou apopléticos — com a CPI do Cachoeira por ela ser política, deveriam ficar assim sempre. Todas têm “motivos secretos”, todas visam a alcançar objetivos estratégicos.

Ingênuo é achar que o PT deixaria um escândalo como esse passar em branco, sem se aproveitar dele politicamente.

E a hipótese de a CPI do Cachoeira “nada mais” ser que uma manobra para desviar a atenção do mensalão e livrar os acusados?

Seria um ardil extraordinário, no qual teriam que estar envolvidos Demóstenes Torres e Carlinhos Cachoeira — para não falar dos asseclas. Sem suas centenas de conversas, sem os fogões, geladeiras e celulares que um recebeu do outro, ninguém nem pensaria em CPI. Ou, quem sabe, o senador seria um criptopetista?

Fora sua pouca lógica, a tese de que a motivação última da CPI é distrair o interesse das pessoas do julgamento do mensalão implica supor que esse interesse existe e que o tema, para elas, é relevante. O que não faz sentido. O assunto perdeu, há tempo, a capacidade de motivá-las.

Implica, também, imaginar que o Supremo julga conjunturalmente, ao sabor dos humores ocasionais da população e de acordo com o modo como a imprensa o pauta. Se as pessoas forem “desviadas” do mensalão, será leniente. Se for pressionado, será rigoroso. Ou seja: não age. Somente reage.

Implica acreditar que o Supremo não decide de acordo com a lei.

No fundo, quem cultiva essas fantasias tem pequeno apreço por nossa Justiça e pela opinião pública. Ou as conhece mal.

(Artigo publicado no jornal Correio Braziliense de 18/04/2012)

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