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Paim destaca desigualdades raciais e avanços das políticas de igualdade no país

Sessão especial no Senado marca Dia da Consciência Negra e reconhece personalidades com a Comenda Abdias Nascimento

Asthego Carlos

Paim destaca desigualdades raciais e avanços das políticas de igualdade no país

O Senado realizou nesta segunda-feira (17/11), por iniciativa do senador Paulo Paim (PT-RS), uma sessão especial para celebrar o Dia Nacional de Zumbi e da Consciência Negra — lembrado anualmente em 20 de novembro — e entregar a Comenda Abdias Nascimento. A honraria é concedida todos os anos a personalidades que contribuíram de forma relevante para a proteção e promoção da cultura afro-brasileira.

Na abertura da sessão, Paim afirmou que a busca por reparação histórica e por igualdade de direitos e oportunidades é “uma longa jornada, feita de passos firmes, de mãos unidas, de vozes que ninguém conseguiu calar — e nunca vão conseguir”. Para o senador, o movimento antirracista “não separa, mas agrega; une negros e brancos na luta pela dignidade humana”.

Paim destacou que a população negra representa 55% dos brasileiros — mais de 120 milhões de pessoas — mas ainda enfrenta desigualdades profundas.

Segundo dados do IBGE citados pelo parlamentar, 70% das pessoas em extrema pobreza são negras; 64% dos desempregados são negros; e, entre os 10% mais pobres, 78% são pretos e pardos. Mais de 60% das moradias precárias são ocupadas por famílias negras. A mortalidade materna entre mulheres negras é quase o dobro da registrada entre mulheres não negras. O Atlas da Violência aponta ainda que 70% das vítimas de homicídio no país são negras.

“Esses números não são estatísticas frias. São vozes, são rostos de crianças, jovens, adultos e idosos. São histórias interrompidas”, afirmou o senador. Ele acrescentou que o racismo estrutural “ainda define o destino de milhões de brasileiros”: a renda das pessoas não negras, segundo ele, é 87% superior à das pessoas negras, mesmo com o mesmo nível de escolaridade.

“A jornada é longa, mas não vamos parar. Precisamos seguir firmes, fazendo o bom combate, a boa luta”, reforçou.

Conquistas

Paim relacionou os avanços da população negra desde a promulgação da Constituição de 1988 ao surgimento da Fundação Cultural Palmares e destacou o papel decisivo dos governos Lula e Dilma no fortalecimento das políticas de igualdade racial.

Ele lembrou que, em 2003, foi criada a Secretaria de Políticas de Promoção da Igualdade Racial (Seppir) e que, em 2010, o país aprovou o Estatuto da Igualdade Racial. Em 2012, a Lei de Cotas abriu as portas das universidades federais; em 2014, a reserva de vagas foi estendida ao serviço público. Em 2021, o Brasil ratificou a Convenção Interamericana contra o Racismo, que passou a ter status constitucional. Em 2023, o presidente Lula recriou o Ministério da Igualdade Racial, atualizou a Lei de Cotas para incluir quilombolas e determinou que 30% dos cargos comissionados da administração federal sejam ocupados por pessoas negras.

Já em 2025, foi sancionada a Lei 15.142, que ampliou de 20% para 30% o percentual de cotas no serviço público, incluindo pretos, pardos, indígenas e quilombolas.

“Todas essas leis só foram possíveis pela mobilização da sociedade — de negros, brancos comprometidos, indígenas, quilombolas, da juventude e dos idosos. Foi esse movimento coletivo que tornou tudo realidade. E é preciso reconhecer que tivemos governos comprometidos com o social para que isso acontecesse. Aqui, eu bato palmas para Lula e Dilma Rousseff”, afirmou o senador.

“Essas são sementes de um futuro mais justo e plural. Cabia a nós fazê-las florescer”, completou Paim.

Semana de reflexão

Durante a sessão, o senador Randolfe Rodrigues (PT-AP) ressaltou que a Semana da Consciência Negra não se limita à celebração do feriado de 20 de novembro, mas deve servir como momento de reflexão profunda sobre as desigualdades raciais no país. Ele afirmou que o Prêmio Abdias Nascimento tem justamente a função de evidenciar os números que revelam essas disparidades e de provocar a consciência nacional sobre a necessidade de ampliar a presença de pessoas negras nos espaços de poder e decisão.

“O poder político só se realiza plenamente quando reflete a diversidade do país”, afirmou Randolfe, citando a importância de aumentar a representação negra no Senado, no Judiciário e em instâncias como os tribunais regionais e o Tribunal Superior Eleitoral.

O senador também destacou que, apesar dos avanços, ainda persistem traços de estruturas herdadas do passado. “Lamentavelmente, ainda vemos, mesmo que de forma mais obscura, resquícios daqueles que se comportam como proprietários de terras do século XIX”, disse.

Ele concluiu elogiando os homenageados e afirmando que a semana deve ser marcada tanto pela celebração quanto pela reflexão crítica. “Ainda bem que seguimos tendo vozes que denunciam o racismo presente”, declarou.

Conheça as personalidades agraciadas com a Comenda Abdias Nascimento

– Bezerra de Menezes (In memoriam)

Nascido em 1831 e falecido no ano de 1900, destacou-se como médico, político e filantropo cearense que, ainda no século 19, atuou ativamente em defesa dos pobres e da população negra escravizada, inclusive prestando atendimento médico gratuito a escravos e intercedendo por sua libertação.

– Carlos Alves Moura

Advogado e militante histórico dos direitos humanos e da igualdade racial no Brasil, é fundador do Centro de Estudos Afro-Brasileiros de Brasília e primeiro presidente da Fundação Cultural Palmares, cargo que exerceu em dois mandatos (1988-1990 e 2000- 2002).

– Gilson José Rodrigues Junior

Antropólogo e professor do Instituto Federal do Rio Grande do Norte (IFRN), onde atua também como assessor de Educação Étnico-Racial, desenvolvendo projetos voltados à valorização das culturas afro-brasileira e indígena, e ao combate ao racismo estrutural.

– Natanael dos Santos

Historiador e pesquisador com atuação destacada na historiografia africana e nas relações Brasil-África. Fundador do Grupo de Estudos Afro-Brasileiros da Unicamp e do Núcleo Nigéria da Universidade Feevale. Coordenou o núcleo de Direitos Humanos e Relações Étnico-Raciais da Faculdade Zumbi dos Palmares.

– Tulio Augusto Samuel Custódio

Sociólogo e pesquisador cuja trajetória acadêmica e intelectual dedica-se há quase duas décadas ao estudo e à difusão do legado de Abdias Nascimento, contribuindo para reposicionar sua obra no debate nacional.

– Valdice Gomes da Silva

Jornalista e ativista alagoana, com reconhecida trajetória na defesa da igualdade racial e da cultura afro-brasileira. Foi presidente do Sindicato dos Jornalistas de Alagoas e integrou a diretoria da Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj), além de ser a fundadora da Comissão de Jornalistas pela Igualdade Racial de Alagoas (Cojira-AL).

Abdias Nascimento foi deputado federal de 1983 a 1987 e senador entre 1997 e 1999, sempre pautando sua atuação política na defesa da cultura e da igualdade para as populações afrodescendentes no Brasil.

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