Fátima: “O que precisamos é encontrar formas de implementar plenamente direitos de educação, saúde e outros, previstos no ECA e na Constituição”Reduzir a proposta da redução da maioridade penal a uma retaliação contra o governo petista é apequenar a discussão e pautar o problema por um sentimento de vingança. A análise da senadora Fátima Bezerra (PT-RN) é uma resposta ao presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), que, nesse final de semana, anunciou a aceleração da votação em plenário da Proposta de Emenda Constitucional (PEC 171/1993) que fixa uma nova maioridade no País.
O movimento de retaliação de Cunha começou assim que um grupo de deputados de seis partidos ajuizou mandado de segurança no Supremo Tribunal Federal (STF) para cancelar a sessão da última semana referente à reforma política – no item que autorizou a inclusão, na Constituição, do financiamento privado de campanhas para partidos políticos.
Para o grupo, o presidente da Câmara está afrontando o regimento. Cunha, por sua vez, chama os deputados de chorões e atribui o movimento ao Executivo, que anunciou a decisão de criar uma comissão de ministros para estudar profundamente uma alternativa à proposta que tramita na Câmara. Para afrontar o “inimigo da vez”, o deputado-presidente anunciou a disposição de acelerar a lei que endurece a punição para os adolescentes que cometem crimes. Convencido de que a população apoia a medida, o presidente da Câmara quer convocar um referendo popular para homologar a decisão.
“Ao se pronunciar sobre o mérito da PEC, o presidente da Câmara fala como se aprovar a alteração da maioridade penal fosse uma questão, inclusive, de derrotar o PT… Meu Deus, isso é um sentimento muito pequeno”, observou Fátima Bezerra.
Ela lembrou que os setores mais progressistas, como entidades civis, ligadas aos direitos humanos, advogados, magistrados, especialistas e grande parte dos religiosos e o próprio governo entendem que se a redução da idade penal for aprovada como pretende Eduardo Cunha, “quem levará um golpe profundo serão os direitos humanos e a juventude deste País, especialmente os jovens pobres, os jovens negros”, disse.
De acordo com a senadora, punir com prisão os menores infratores não contribuirá para reduzir os índices de criminalidade. “Aqueles que defendem a redução da maioridade penal teimam em comparar nossa situação com o restante do mundo, muitas vezes manipulando os dados, inclusive, a seu favor”, afirmou . Ela lembrou que, ao contrário do que muita gente diz, hoje o Brasil é um dos poucos países que fixa o início da responsabilidade juvenil aos 12 anos. A maioria dos países da Europa, por exemplo, só o faz a partir dos 14 anos. “Responsabilizar jovens como jovens é uma coisa – e isso, inclusive, já é feito. Agora, punir jovens como se adultos fossem é outra completamente diferente”, alertou.
A redução da maioridade, segundo os números apresentados pela parlamentar potiguar, não significa menos violência. “Será que os defensores da redução da maioridade penal sabem que menos de 1% dos homicídios cometidos no País têm como autores menores de 18 anos?”, questionou, baseada em dados do Ministério da Justiça e da Unicef, que também informam que, dos 20 mil adolescentes que cumprem medidas socioeducativas, apenas 11% cumprem pena por assassinato. A maioria, 43%, cometeu crimes contra o patrimônio, como furto e roubo. Outros 26,6% estão presos por envolvimento com o tráfico de drogas.
Para ela, o problema não é o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA). “Com o Estatuto da Criança e do Adolescente, temos uma das legislações mais avançadas do mundo. Mas é preciso que a lei seja cumprida, porque não adianta termos uma lei baseada na ressocialização, se as unidades sócio-educativas estão superlotadas, muitas vezes nos moldes das prisões comuns”, analisou.
Fátima defendeu a educação, de preferência em tempo integral, como saída para a violência. E concluiu: “Não temos que endurecer a lei, mas cumpri-la. O que precisamos é encontrar formas de implementar plenamente direitos de educação, saúde e outros, previstos no ECA e na Constituição. A sociedade não está fazendo o seu trabalho: é negligente com a educação de seus jovens e, depois, quer resolver problemas sociais com punição, botando na cadeia.
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