A Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) discutiu, nesta terça-feira (19), por mais de quatro horas a Proposta de Emenda Constitucional (PEC 6/2019) enviada por Jair Bolsonaro ao Congresso Nacional e prevê a alteração das regras de acesso a aposentadoria e o desmonte do sistema de Seguridade Social. Ao final do debate, nenhum dos economistas convidados ou senadores presentes ao debate defendeu a aprovação do projeto de reforma.
“O que é mais grave na proposta apresentada pelo governo é a proposição de uma série de mudanças paramétricas no sistema de Previdência para gerar um caixa de R$ 1 trilhão para financiar a decolagem do foguete da capitalização, como disse o próprio ministro Paulo Guedes. No Chile, a capitalização foi um desastre completo. Na proposta está colocada a perspectiva de termos a capitalização, como no Chile, apenas com a contribuição do empregado. Isso é um desastre”, classificou o ex-ministro da Previdência, Ricardo Berzoini.
O economista Felipe Salto, diretor-executivo da Instituição Fiscal Independente (IFI), afirmou que reformar a Previdência é uma condição necessária, mas não suficiente para resolver o problema fiscal e de crescimento econômico do País. “A agenda da produtividade é que precisa ser retomada para voltar a gerar crescimento”, destacou.
Na avaliação do senador Paulo Paim (PT-RS), ex-presidente da CPI da Previdência, a imprensa nacional tem prestado um “desserviço” na cobertura do tema ao afirmar que a aprovação da reforma da Previdência promoverá a retomada do crescimento econômico.
“A mídia vende que se houver a reforma da Previdência, tudo estará resolvido. Se resolve a saúde, a educação, a infraestrutura, o emprego, o salário. Tudo. É uma mentira deslavada. Todos [convidados] vieram aqui fazer o debate, mas ninguém teve coragem de defender a proposta do Bolsonaro. Ela é indefensável”, afirmou o senador.
Preocupação com mudança de regime
O consultor legislativo Pedro Nery considerou legítima a preocupação dos críticos da reforma com a proposta de alteração do regime solidário atual para o sistema de capitalização, principalmente pelo alto custo de transição de sistemas.
“Se a gente fosse migrar esse ano, de forma súbita, para o sistema de capitalização, estaríamos abrindo mão de aproximadamente R$ 400 bilhões em receita do INSS. Estaríamos quintuplicando o déficit do Tesouro Nacional e triplicando o déficit do Regime Geral da Previdência. Não acho que seja viável. Faltam salvaguardas para essa mudança no texto da proposta”, alertou.
O líder do PT no Senado, Humberto Costa (PE), disse que o grande problema da reforma apresentada por Bolsonaro é a ameaça que ela representa ao sistema de Seguridade Social solidário atual garantido pela Constituição e a sua transformação num sistema individual de capitalização.
“Essa reforma representa o desmonte de um sistema de proteção social na área previdenciária que garante uma renda mínima para milhões de brasileiros. Essa reforma só se preocupa com o corte do lado da despesa sem se preocupar com as implicações sociais de cada um desses cortes”, criticou o líder.
Já o vice-líder do PT no Senado, Rogério Carvalho (SE), afirmou que a proposta de Bolsonaro, caso seja aprovada como está, será responsável pela exclusão de milhões de brasileiros do sistema se seguridade e por levar outros milhões para a situação de miséria.
“Ao lidar com números nós precisamos olhar para a realidade social do País. Não podemos achar que vamos aprovar qualquer coisa em nome dos números. Temos que aprovar em nome da construção de uma sociedade minimamente equilibrada e civilizada. A disputa é entre o sistema de seguridade solidário e um sistema de seguro previdenciário”, disse.
Sociedade precisa ser ouvida sobre reforma
Paulo Tafner, pesquisador da Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas (FIPE), classificou o sistema previdenciário brasileiro como “injusto” por ter regras mais benevolentes com os mais ricos do que com os mais pobres. “Um dos sintomas disso é a idade avançada com que se obtém um BPC ou a aposentadoria por idade. Assim, a empregada doméstica aposenta depois da patroa, o peão de obra depois do empreiteiro”, exemplificou.
Para o senador Jean Paul Prates (PT-RN), os debates em torno de uma reforma do sistema previdenciário não podem ser acelerados pelo “criado pretexto de um colapso tributário e fiscal”. Qualquer mudança nas regras de acesso a aposentadoria, avalia Jean Paul, deve ouvir representantes dos mais diversos segmentos da sociedade.
“A conclusão que a sociedade começa a ter é de que realmente estamos diante de uma reforma que ataca o Estado brasileiro. Um ataque multidimensional ao Estado. Todo mundo quer diminuir imposto e reduzir o tamanho do Estado. E quem paga a conta do Estado que precisa existir, especialmente, num País com as características do Brasil? ”, questionou o senador.