CPI da Previdência

Reforma da Previdência tem “DNA inconstitucional”

“Tem cem grandes empresas aí que são responsáveis por 70% da dívida do INSS", adverte José Bezerra da Rocha, vice-presidente da Associação Nacional dos Técnicos de Fiscalização Federal Agropecuária
Reforma da Previdência tem “DNA inconstitucional”

Foto: Agência Senado

Participantes da audiência pública realizada na última segunda-feira (21) pela CPI da Previdência classificaram a reforma proposta pelo governo de inconstitucional e pediram medidas eficazes de combate à sonegação.

Kléber Cabral, vice-presidente da Associação Nacional dos Auditores Fiscais da Receita Federal do Brasil (Unafisco), afirmou que há uma sonegação fiscal no Brasil em torno de 27% do valor que deveria ser arrecadado, o que dá um valor total de R$ 500 bilhões. Para ele, a própria legislação favorece o crime, já que trata a sonegação como um fato de menor importância e gera o sentimento de impunidade tributária.

“Temos uma legislação de 1995 – já faz 22 anos – que é a raiz de muitos problemas, porque extinguiu a punibilidade com o pagamento. A atividade sonegadora é uma atividade de risco calculado. O pior que pode acontecer é ter que pagar os tributos e as multas”, explicou.

Kléber também criticou a quantidade de programas de parcelamentos especiais (Refis) e explicou que cada programa pode causar perdas de até R$ 50 bilhões por ano aos cofres públicos. O vice-presidente da Unafisco criticou ainda as leis que tratam da repatriação de recursos. Segundo ele, essas leis também são exemplos de benesses tributárias que o Estado dá, premiando o mau contribuinte.

“Inclusive porque as alíquotas cobradas foram inferiores às que eram cobradas das pessoas físicas e jurídicas que cumpriam as suas obrigações tributárias. Então, além da anistia penal, havia uma vantagem econômica. Isso é, de fato, o Estado usando a pedagogia às avessas, deseducando o contribuinte”, protestou.

Grandes empresas
José Bezerra da Rocha, vice-presidente da Associação Nacional dos Técnicos de Fiscalização Federal Agropecuária destacou que os trabalhadores brasileiros não podem ser omissos no debate sobre a reforma. Caso contrário, vão estar sujeitos a pagar as duras penas da mudança. José também ressaltou que o servidor público não colaborou com o déficit da previdência e disse que o governo precisa cobrar de quem realmente deve ao Brasil, que são as grandes empresas.

“Tem cem grandes empresas aí que são responsáveis por 70% da dívida do INSS. Ora, se isso é verdade e é verdade, por que não se trabalha uma legislação que vá buscar a recuperação dessa dívida? É interessante manter esse status e prejudicar o brasileiro? “, indagou.

Proporcionalidade
Mauro José da Silva, diretor de Estudos Técnicos da Unafisco, destacou que a reforma fere o princípio da proporcionalidade ao realizar mudanças previdenciárias com retirada de direitos sem antes apresentar alternativas menos danosas à sociedade.

Segundo ele, a CPI está trazendo inúmeros fatos que mostram que medidas menos lesivas aos direitos sociais não foram tomadas e que, por isso, a PEC 287/2016 – reforma da Previdência proposta por Temer – teria um “DNA inconstitucional”.

A falta de investimento no combate à sonegação, a falta de agilidade na cobrança dos devedores da previdência, a concessão de novos Refis e o desvio de recursos das contribuições para a seguridade social são alguns exemplos citados pelo diretor da Unafisco para confirmar que a proposta fere o princípio da proporcionalidade.

Fábio Zambitte, advogado especialista em Direito Previdenciário, discordou dos demais debatedores e destacou que, independente do modelo ser superavitário ou deficitário, a reforma é necessária em razão dos aspectos demográficos. Segundo ele, o Brasil passa por um envelhecimento populacional rápido, aliado a uma retração de natalidade severa e isso, com o tempo, causará um colapso no sistema previdenciário.

“É a hora de arrumar a casa, de fazer algum tipo de reforma. Acho que não cabe ao Brasil esperar a questão demográfica agravar-se para aí, sim, todo mundo aqui concluir que há um déficit da Previdência brutal e então fazer uma reforma, porque o custo de transição vai ser muito maior. Essa é a questão”, disse.

Capitalização referencial
O diretor da Unafisco, Mauro José, afirmou que a sustentabilidade de um sistema previdenciário não pode ser medida pelo critério déficit/superávit. Mauro defendeu a capitalização referencial para o Regime Próprio de Previdência e afirmou que o modelo é mais justo na medição dessa sustentabilidade.

A capitalização referencial caracteriza-se pela existência de contas individuais, onde são controladas as contribuições dos trabalhadores e empregadores, adicionando-se juros formando um patrimônio para efeito referencial. Na aposentadoria, o valor acumulado na conta referencial é convertido em um fluxo de pagamento dos benefícios usando uma fórmula baseada na expectativa de vida.

Foto: Alessandro Dantas

Problemas de gestão
O presidente da CPI, senador Paulo Paim (PT-RS) destacou não ser contrário ao fato de se debater com profundidade e seriedade alguns pontos passíveis de aperfeiçoamento na legislação previdenciária brasileira. O que não pode ocorrer, de acordo com Paim é a aprovação “absurda” de uma reforma “radical” como a apresentada pelo atual governo.

“Ninguém é contra debater pontualmente [mudanças no sistema previdenciário]. Mas uma reforma radical como essa é um absurdo. Já está comprovado que o tal de déficit previdenciário não existe. Os problemas advêm de uma questão de gestão e do combate a roubalheira. É sonegação, fraude, apropriação indébita, anistia que o Congresso dá aos devedores toda hora e o povo é chamado, novamente, a pagar essa conta”, disse.

Foto: Alessandro Dantas

Militares
O ex-ministro da Previdência, senador José Pimentel (PT-CE) disse que os constituintes de 1988 construíram a Carta Magna do Brasil seguindo a lógica de que o Estado poderia comportar todo o peso da Previdência Social. Porém, ao longo dos anos, correções do sistema tem sido feito para garantir o direito daqueles que já contribuem e assegurar o direito a aposentadoria daqueles que ainda acessarão o mercado de trabalho.
Pimentel ainda detalhou o funcionamento da Previdência dos servidores das Forças Armadas e a concessão de pensão vitalícia as filhas de militares nascidas até 2001 e que não constituam família, mesmo que os militares não contribuam para a Previdência ao longo da carreira.

“Estamos ao longo do período criando uma série de normas que garantam o direito, daqueles que os têm, e crie um ambiente previdenciário para proteger os futuros trabalhadores. Mas precisamos fazer o seguinte debate. O Estado, a sociedade está disposta a manter esse desenho? Ou queremos fazer como fez essa turma que encaminhou a reforma da previdência e inserir na conta dos trabalhadores, de um modo geral, essa rubrica que não conta com contribuição desse seguimento? É preciso estar claro no Orçamento da União que esses recursos saem do Orçamento da Defesa. Esse é um problema que precisamos enfrentar”, destacou.

Com informações da Agência Senado

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