A Medida Provisória (MP 759/2016) que prevê, segundo o governo, a “modernização” do sistema de regularização fundiária rural e urbana no País recebeu novamente uma série de críticas durante a Comissão Geral da Câmara dos Deputados, nesta terça-feira (11), para debater o assunto.
A Medida altera e/ou revoga artigos de 16 diferentes leis. Dentre as leis afetadas pela MP 579 estão o Estatuto das Cidades (Lei 10.257/2001), a Lei 11.481/2007, a Lei 11.952/2009 e todo o capítulo III da Lei 11.977/2007 que trata do programa Minha Casa Minha Vida. Essa última tem sido usado como orientador e instrumento dos municípios para a regularização fundiária.
Na avaliação da subprocuradora geral da República, Deborah Duprat, não pode ser alvo de uma medida provisória texto que revoga ou altera mais de uma dezena de leis e assuntos. Para ela, a MP 759 seria o equivalente a uma alteração num Vade Mecum (livro de uso constante).
Outra crítica de Deborah ao texto da MP 759 é a ausência do requisito da urgência para edição da Medida Provisória. Só o fato de o texto da MP remeter diversos aspectos para posterior regulamentação escancara, segundo ela, a falta de urgência para tratar do tema por meio MP.
“Essa é uma MP com um grande número de problemas. Nesse caso, particularmente, só o fato de o tema ser tratado por meio de MP, já é algo muito grave. É uma MP em que faltam os atributos da relevância e da urgência”, disse.
Rosane Tierno, representante do Instituto Brasileiro de Direito Urbanístico (IBDU), disse que a edição da Medida Provisória em dezembro do ano passado causou estranheza por passar a impressão de que o País não tratava dessas questões anteriormente. “A MP passou a impressão de que nunca houve regularização fundiária no País e isso é uma mentira. Desde a década de 70 quando houve um êxodo rural para os grandes centros urbanos, as prefeituras vêm se debruçando sobre essa questão”, explicou.
Luiza Lins Veloso, defensora pública e coordenadora do Núcleo Especializado de Habitação e Urbanismo da Defensoria Pública do Estado de São Paulo, disse que apesar de a MP 759 prometer um novo marco legal com a simplificação e desburocratização dos procedimentos da regularização fundiária, as 732 emendas apresentadas por parlamentares “sinalizam que o tema carece de debates e participação popular na sua construção”.
Regularização rural
O único ponto louvável da matéria, segundo Deborah Duprat, é a tentativa de destravar a reforma agrária no País. Porém, um problema da proposta é a facilitação da legalização de posses de terras na Amazônia, muitas vezes fruto de grilagem de terras e a aceleração da emancipação de assentados.
“Na questão agrária, temos um grande problema de reforço à cultura da grilagem, que não é de agora. É um problema de leis que pretendem fazer regularização fundiária descoladas da reforma agrária. A Constituição Federal, em seu artigo 188, é clara ao afirmar que qualquer política de doação de terras públicas e terras devolutas tem de se dar em conformidade com a política nacional de reforma agrária”, destacou.
Para Alexandre Conceição, coordenador nacional do Movimento dos Trabalhadores Sem Terra (MST), o único objetivo da MP 759 no meio rural é acabar com a política de assentamentos no Brasil e facilitar a venda de terras no Brasil aquecendo, assim, o mercado financeiro com a entrega do patrimônio nacional.
“O governo quer com a MP trazer terra para o mercado, aquecendo o mercado de terras, incentivar a grilagem e acabar com a terra pública no País. Querem transformar as terras de grileiros, antes públicas, em terras legalizadas. Além disso, querem expulsar dos assentamentos mais de 570 mil famílias pelo País acabando com o programa de assentamentos da reforma agrária. A MP tenta acabar com as organizações sociais do campo, com assentados da reforma agrária e aquecer o mercado de terras no País”, denunciou.
A defensora pública Luiza Velloso ainda critica a tentativa de agilizar e modernizar o programa nacional de reforma agrária com aumento de titulações de terra a trabalhadores rurais assentados como descreve a MP. Para ela, a lógica da patrimonialização no campo, assim como ocorre nas cidades, implicará na dificuldade de acesso aos créditos do Pronaf, bem como da manutenção da propriedade nas mãos de trabalhadores rurais.
“A consequência será a alienação dos imóveis e retorno da concentração de terras nas mãos de poucos”, resumiu.
Regularização urbana
Luiza Velloso ainda apontou que, na área urbana, a MP 759 afasta-se de algumas diretrizes constitucionais da Política Nacional Urbana como: a função social da propriedade e a aplicação de seus instrumentos indutores.
Assim, segundo ela, as modalidades de regularização fundiária urbana como Reurb-S e Reurb-E são tratadas sem maiores distinções para fins de prioridades de procedimentos – Reurb-S, de interesse social, que visa atender a população de baixa-renda; e Reurb-E, de interesse específico, aplicável a núcleos urbanos informais habitados por população não denominada como de baixa renda.
“É imprescindível o estabelecimento de critérios para estipular prioridades na regularização de interesse social, visto que a maioria dos municípios não possui estrutura para regularizar todas áreas irregulares. Não é possível que as duas modalidades concorram em paridade de condições sob pena de inviabilizar que a população de baixa renda tenha acesso a regularização fundiária”, disse.
A titulação pela legitimação de posse, alerta Luiza, antes aplicada a população de baixa renda, agora com a MP é estendida a regularização de interesse especifico. “Aplicado indevidamente o princípio da competitividade, em clara violação ao princípio da igualdade material, previsto no artigo 5º da Constituição Federal”, apontou.
Para conhecer mais alterações propostas pelas MP 759/2016, clique aqui