Numa sessão com pauta especialmente dedicada ao Dia da Consciência Negra (celebrado em 20 de novembro), o Plenário aprovou nesta quinta-feira (18) duas propostas do senador Paulo Paim (PT-RS) que carregam forte simbolismo para o movimento negro do país.
Uma delas reconhece o sítio arqueológico Cais do Valongo (RJ) como Patrimônio da História e Cultura Afro-Brasileira, que segue para análise da Câmara, e a outra institui o Selo Zumbi dos Palmares, a ser concedido a municípios promotores da igualdade racial, que vai à promulgação.
Um emocionado Paulo Paim agradeceu às senadoras e senadores pela aprovação das iniciativas e também do projeto que tipifica a injúria racial como crime de racismo. “Hoje é um dia histórico! Pela primeira vez, o Congresso vai deliberar sobre três propostas sobre o combate ao racismo. É no diálogo, na compreensão do ontem e do hoje e no respeito à diversidade que o Senado tem dado exemplos de que é possível transformar a esperança e ampliar o significado do verbo esperançar”, afirmou o senador.
Segundo ele, os 56% de pretos e pardos da população brasileira, em sua grande maioria pobres, é vítima ainda hoje do racismo estrutural, “que está no olhar, no verbo, na violência, no ódio”. “Famílias se perdem enquanto sonham em viver em um país justo. E esse sonho há de se tornar realidade. Temos que encarar e enfrentá-lo, e é isso o que estamos fazendo. Quando se combate o racismo, se combate a pobreza e a fome”, disse Paim.
Para o líder do PT no Senado, Paulo Rocha (PA), os projetos do senador Paim “têm o objetivo de criar um arcabouço legal para garantir a proteção histórica da luta desses povos”. O líder lembrou do período em que, como deputados, ele e Paim dirigiram a Comissão de Trabalho da Câmara e conseguiram aprovar leis importantes, como a que criminaliza o trabalho escravo ou degradante, de sua autoria.
“O PT sempre foi muito sintonizado com essa pauta. E é com muito orgulho que participamos desse processo”, afirmou. Paulo Rocha citou ainda o pedido oficial de desculpas ao povo africano feito por Lula em viagem a Senegal, em 2005, durante o primeiro mandato como presidente da República, num gesto de reparação histórica.
“No Benin, dizem que no Benin, os escravos, antes de embarcar, eram obrigados a dar sete voltas em torno da árvore do esquecimento para renunciar à sua identidade. A escravidão começa assim, pelo esquecimento forçado da condição humana, e o racismo se mantém pelo esquecimento do processo que nos formou como país”, disse. “Enfrentar o racismo é talvez nossa principal tarefa. Enquanto não nos acertarmos com esse passado, não saberemos analisar com lucidez as questões do presente e seguir adiante como o país justo e feliz que o mundo inteiro aprendeu a admirar”, concluiu Paulo Rocha.
Cais do Valongo
O projeto de lei (PL) 2.000/2021, relatado pelo senador Carlos Portinho (PL-RJ), reconhece o sítio arqueológico do Cais do Valongo, região portuária do Rio de Janeiro, como “patrimônio histórico-cultural afro-brasileiro, essencial para a formação da identidade nacional, devendo ser protegido pelo poder público”. Em 2017, o Cais do Valongo recebeu o título de Patrimônio Histórico da Humanidade pela Unesco.
Segundo Portinho, a região foi a principal porta de entrada de escravos no Brasil. Ao longo de 3 séculos, 4 milhões de negros africanos chegaram ao país. “Pelo Cais do Valongo passaram quase 1 milhão de escravos em 40 anos. Foi o maior porto receptor de escravos do mundo, e possui portanto valor universal como memória da violência contra a humanidade”, afirmou. “Preservar o Cais do Valongo e os vestígios ali existentes clamam por nossa memória, para que nunca nos esqueçamos desse trágico capítulo da nossa história”, concluiu.
Selo Zumbi dos Palmares
Já o projeto de resolução do Senado (PRS) 55/2021 foi relatado pela senadora Eliziane Gama (Cidadania-MA). A criação do Selo Zumbi dos Palmares será concedido a municípios que tenham se destacado com políticas públicas voltadas à promoção da igualdade racial. Para a relatora, a iniciativa é louvável e representa um caminho de “enfrentamento das chagas do racismo estrutural, resultado de 300 anos de escravidão no país”.
“A inserção no calendário do Senado da efeméride reafirma os esforços de valorização de igualdade racial, com o reconhecimento de que o racismo é um problema a ser enfrentado. A denominação Zumbi é meritória pela alusão ao líder da resistência do povo africano à escravidão no Brasil, assim como Palmares, que foi o maior quilombo do país e resistiu por mais de 100 anos”, afirmou a senadora.