Senadoras querem avançar mais, após consolidação do Feminicídio como crime hediondo

Senadoras reconhecem a previsão do crime de feminicídio como um avanço no combate à violência contra a mulher (Fotos: Alessandro Dantas)As senadoras petistas comemoraram a aprovação no plenário da Câmara dos Deputados, na noite dessa terça-feira (3), do projeto (PLS) 292/13 que coloca o feminicídio como homicídio qualificado e crime hediondo. O termo é usado para classificar o assassinato de mulheres pela condição de serem mulheres. A aprovação do projeto é uma das vitórias da bancada feminina no Congresso Nacional e segue para sanção da presidenta Dilma Rousseff. No entanto, as parlamentares querem que outras proposições que firmam o papel da mulher na política entrem em pauta.

Para a senadora Fátima Bezerra (PT-RN), agora, o crime e a violência contra a mulher estão mais explicitos, com punições mais severas para os agressores. “O Congresso precisava dar esta resposta, pois, infelizmente, ocupamos o sétimo lugar no ranking de 84 países que mais matam mulheres por questões de gênero”, colocou.

A senadora Marta Suplicy (PT-SP) lembrou que os parlamentares trabalharam “arduamente” na Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) da Violência contra a Mulher na defesa dessa proposição. “Este é um momento histórico, avanço na luta contra essa chaga: os altos índices de crimes contra as mulheres no País”, destacou Marta.

Apesar de reconhecer o avanço com a aprovação da proposta, a senadora Regina Sousa (PT-PI) ressaltou a necessidade do efetivo cumprimento da lei. “Não deixa de ser uma coisa boa essa nova legislação para a luta das mulheres, mas é preciso que a lei seja cumprida. A Lei Maria da Penha é ótima, mas a efetivação dela deixa a desejar. Deu visibilidade ao tema, mas não inibiu. Não sei se os homens que praticam os crimes vão ter medo dessa lei a não ser que ela pegue pra valer”.

A senadora Ângela Portela (PT-RR) destacou que a aprovação do projeto do feminicídio é um avanço decorrente da mobilização das parlamentares mulheres. “O combate à violência de gênero é apenas um dos focos da bancada feminina. Também temos nos mobilizado em ações que visem ampliar a participação feminina no Parlamento brasileiro”, observou a senadora.

Entre as propostas que podem ampliar essa participação está um projeto (PLS 295/2011) da senadora Gleisi Hoffmann (PT-PR) que reserva às mulheres 50% das cadeiras de todas as casas legislativas do País onde a representação é proporcional (câmaras de vereadores, assembleias legislativas e Câmara dos Deputados). Relatado pela senadora Ângela, o texto foi aprovado em novembro do ano passado na Comissão de Constituição e Justiça do Senado (CCJ). O projeto precisa agora ser votado no plenário da Casa.

A cota por gênero nas casas legislativas é uma das principais bandeiras da bancada feminina para a reforma política, de acordo com a senadora Regina. “Esse é o caminho para que a mulher ocupe o lugar que ela merece, que tem direito. Apenas não ocupa porque é inibida pela forma como está a legislação atual”, disse a parlamentar.

Feminicídio

A proposta que qualifica o feminicídio como crime hediondo mantém a pena de 12 a 30 anos de prisão já determinada para o homicídio e não elimina a punição de outros delitos associados ao assassinato, como o estupro. O projeto prevê ainda o aumento da pena em 1/3, se o crime ocorrer durante a gestação ou nos três meses posteriores ao parto; contra menor de 14 anos, maior de 60 ou pessoa com deficiência; e na presença de descendente ou ascendente da vítima.

Aprovado pelo plenário do Senado em dezembro do ano passado, o projeto foi relatado pela senadora Gleisi. Na época, a petista afirmou que a apreciação da proposta era “uma resposta concreta do Parlamento à situação de barbárie que atinge as mulheres brasileiras”. Gleisi lembrou que é preciso continuar avançando rumo a medidas concretas que reduzam a violência de gênero no País.

A tipificação do crime de feminicídio foi criada no âmbito da CPMI da Violência contra a Mulher. Essa comissão, que teve relatório da senadora Ana Rita (PT-ES) aprovado em julho de 2013, analisou as falhas da estrutura do Estado e a omissão de órgãos públicos para coibir essa violência. O parecer apontou 68 encaminhamentos para instituições do Legislativo, Executivo e Judiciário, nas esferas municipal, estadual e federal.

A CPMI fundamentou essas recomendações em dados que mostram a gravidade da questão. Entre 2000 e 2010, foram assassinadas 43,7 mil mulheres no Brasil, 41% delas mortas em suas próprias casas, muitas por companheiros ou ex-companheiros. O aumento de 2,3 para 4,6 assassinatos por 100 mil mulheres entre 1980 e 2010 colocou o Brasil na sétima posição mundial de assassinatos de mulheres.

Países como México, Guatemala, o Chile, El Salvador, Peru, Nicarágua e Argentina já incorporaram a figura do feminicídio às suas legislações penais, acolhendo a recomendação da Organização das Nações Unidas (ONU), reforçando sua capacidade de investigar e punir os agressores.

“Defesa da honra”

A tipificação do feminicídio tem entre os objetivos impedir o surgimento de interpretações jurídicas inaceitáveis, tais como as que reconhecem a violência contra a mulher como crime passional.

No passado, essa caracterização já serviu de atenuante para o crime e, até o final dos Anos 70, assassinos de mulheres foram absolvidos ao amparo da tese de que haviam matado as esposas, companheiras e namoradas “em legítima defesa da honra”, como no rumoroso caso do playboy Doca Street, que assassinou a namorada, Ângela Diniz, em 1977, sob essa alegação. Street chegou a ser absolvido, no primeiro julgamento.

Outros projetos contra a violência

Diversas propostas foram aprovadas pela CPMI da Mulher para coibir a violência de gênero. Entre elas, o PLS 293/2013, que classifica a violência doméstica como crime de tortura, para coibir e punir situações de abuso em qualquer relação familiar ou afetiva que resulte na qual alguém submeta o outro a intenso sofrimento físico ou mental como forma de exercer domínio, “com emprego de violência ou grave ameaça”.

Já o PLS 296/2013 garante benefício temporário da Previdência às vítimas, nos moldes do auxílio por acidente de trabalho. O texto estabelece que todas as seguradas do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) vítimas de agressão domiciliar e familiar terão direito ao benefício caso o episódio resulte em afastamento do trabalho.

Por sua vez, o PLS 294/2013 reduz o prazo para a análise do pedido de prisão preventiva para os agressores, que deverá ser comunicado ao juiz e ao Ministério Público 24 horas após o encaminhamento da ofendida ao abrigamento.

Carlos Mota

 

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