Das 23 modificações feitas pelo senador Jorge Viana, os deputados rejeitaram 12O Brasil está prestes a ganhar um novo Marco da Biodiversidade com um conteúdo muito aquém do que poderia ter, graças às forças do atraso da Câmara dos Deputados. Na noite dessa segunda-feira (27), os deputados retiraram do projeto (PLC 2/2015), medidas incorporadas no Senado por Jorge Viana (PT-AC), que contribuiriam para agregar riqueza ao Brasil e efetivar o desenvolvimento regional. O resultado foi lamentado pelo Viana, em discurso ao plenário nesta terça-feira (28).
“Fizemos modificações não para diminuir a importância da Câmara, mas para, usando a prerrogativa do Senado, aperfeiçoar a matéria. O mundo inteiro está de olho na lei que o País que tem a maior biodiversidade do planeta adotará”, ressaltou Jorge Viana, após destacar que todas as alterações que promoveu, decorreram de acordos com os mais diversos atores da sociedade civil, do governo e dos institutos de pesquisa.
Das 23 modificações feitas pelo senador petista, os deputados rejeitaram 12. A maioria delas destinada a beneficiar os cerca 4,5 milhões de brasileiros que fazem parte das comunidades tradicionais – representadas por caboclos, caiçaras, extrativistas, indígenas, pescadores, quilombolas e ribeirinhos. Esse povo é detentor de um conhecimento (passado de geração em geração) com alto valor comercial; historicamente, explorado inadequadamente. “Exatamente os que podem se beneficiar com a aplicação dessa lei, os que podem ser parte dela com seu conhecimento não foram ouvidos”, observou Viana.
Retrocessos impostos pelos deputados
Em consonância com o lobby das indústrias de fármacos, os deputados reduziram os benefícios financeiros a que as comunidades tradicionais, e por extensão o Brasil teria direito. Eles dispensaram, por exemplo, que o setor empresarial repartisse, em até 1%, o lucro obtido com os donos do conhecimento ou de uma das matérias-primas, quando este não for o elemento principal do produto.
Quando a matéria ainda estava em discussão no Senado, Walter Pinheiro (PT-BA) havia destacado que tudo o que é usado em um produto ajuda a agregar valor e é computado na hora de precifica-lo. “Todos os elementos contribuem para o efeito de um produto, seja ele visual, estético, medicinal”, afirmou Pinheiro.
A Câmara também excluiu do novo Marco a necessidade da indústria ter de consultar os órgãos públicos de defesa das comunidades tradicionais, a exemplo da Fundação Nacional do Índio (Funai), sobre a redução do lucro de um produto, nos casos em que o elemento principal da fórmula for um conhecimento tradicional não identificável. Os deputados ainda impediram a criação de uma instância de assessoramento aos detentores de conhecimento tradicional.
Avanços conseguidos
Dentre as emendas do Senado aprovadas pela Câmara destaca-se a que exclui a possibilidade de empresas estrangeiras sem associação com instituição nacional acessarem e explorarem a biodiversidade brasileira ou receber amostra desse conhecimento. Antes da modificação, uma empresa de qualquer lugar do mundo poderia se instalar na Amazônia, fazer sua pesquisa, transformar um item da natura brasileira em produto e ganhar milhões.
“Cumpri meu papel, acho que a lei que se votou ontem, na Câmara, é muito melhor do que a que chegou aqui no Senado pela primeira vez, mas acho que o Brasil ainda tem muito a fazer nesse tema e espero que o governo da presidenta Dilma possa nos ajudar”, desabafou Jorge Viana em seu discurso.
Fonte de inspiração
A construção de uma aliança que incentive o progresso científico e a preservação ambiental mobiliza todo o mundo, nos dias de hoje. O Brasil se consolida na vanguarda dessa discussão com o novo Marco da Biodiversidade (PLC 2/2015), porque estabelece os princípios e diretrizes para impulsionar o aproveitamento sustentável da biodiversidade brasileira, na geração de conhecimento, emprego e riqueza.
A legislação foi proposta pela Presidência da República, após verificar-se que a lei em vigor (Medida Provisória 2.186-16/2001), criada para conter a biopirataria, acabou por desestimular o desenvolvimento de pesquisas científicas e tecnológicas acerca do patrimônio natural e das comunidades tradicionais brasileiras, em função da burocracia e do excesso de restrições.
Em números, isso quer dizer que o País G1 em biodiversidade – com 20% da biodiversidade do planeta – e detentor da 13º colocação no ranking de publicações científicas do planeta não produz nem 5% do conhecimento científico e do reconhecimento acadêmico dessa riqueza nacional. O que reflete diretamente na economia, cuja base são commodities que sequer fazem parte do recurso natural do País.
“As espécies usadas na agropecuária são todas de fora: laranja, soja, cana, café, equinos, gado. E até o capim, que é africano. Isso tem causado um enorme prejuízo. A economia brasileira perde competitividade”, pontuou Jorge Viana.
Catharine Rocha
Conheça o histórico da tramitação da matéria no Senado:
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