CPI do HSBC só trabalhará com documentos oficiais, reafirma Paulo Rocha

Paulo Rocha: “Não vou fazer um processo espetacular, colocando em xeque os direitos individuais de quem quer que seja”, ressaltou Paulo RochaNão adianta a pressão. O senador Paulo Rocha (PT-PA), presidente da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) do HSBC destinada a investigar suspeitas de irregularidades de brasileiros detentores de contas na agência do banco na Suíça, reconheceu nesta quinta-feira (30) que há dificuldades para fazer avançar os trabalhos. No entanto, afirmou categoricamente que a comissão terá a responsabilidade de tratar informações de caráter legal.

“Houve um diálogo no Ministério Público e no Ministério da Justiça e até nas embaixadas dos países que têm relação com o caso, e há essa questão dos acordos bilaterais para acesso às informações. Temos ciência de que todas as informações que tocam a área fiscal, a Receita Federal já têm os documentos, mas que é proibido o compartilhamento exatamente por conta das relações e acordos internacionais”, afirmou.

No início da reunião de hoje, o vice-presidente, senador Randolfe Rodrigues (PSOL-AP) e o relator, senador Ricardo Ferraço (PMDB-ES), chegaram 50 minutos depois do horário previsto e deram a entender que os trabalhos da CPI estavam sendo conduzidos de maneira lenta, como alternativa para atrasar a análise de requerimentos. Paulo Rocha rechaçou essa hipótese, porque em respeito aos convidados que cumpriram o horário ele considerou que as oitivas poderiam anteceder a análise dos requerimentos.

“Eu cheguei aqui às 9 horas. E quero dizer aos dois companheiros e para o plenário o seguinte: eu vou dirigir esta CPI da forma que falei no início, com responsabilidade, porque estamos tratando de direitos, inclusive, individuais. Não vou fazer um processo espetacular, colocando em xeque os direitos individuais de quem quer que seja”, salientou.

A CPI do HSBC ouviu Wilson Rodrigues de Souza Filho, delegado da Polícia Federal que atua na Divisão de Repressão a Crimes Financeiros, da Diretoria de Investigação e Combate ao Crime Organizado. Também ouviu o doutor Heleno Torres, professor de direito tributário da Faculdade de Direito da USP.

Polícia Federal

Wilson Rodrigues explicou que o inquérito do caso Swiss Leaks está na diretoria em que trabalha e que a portaria de instauração é baseada nas possíveis tipificações penais. “Desde já, é preciso esclarecer que as pessoas, eventualmente citadas nessa relação ou nesses dados, não cometeram crime até que se demonstre, pelos meios legais, que não houve a declaração aos órgãos competentes”, observou. 

Em tese, segundo o delegado, o principal crime ocorrido pode ter sido o da evasão de divisas. Em alguns casos, a pessoa pode ter praticado todas as modalidades delitivas previstas no artigo 22 da Lei 7.492, iniciando pela operação ilegal de câmbio, seguida da remessa do recurso para o exterior e lá mantendo o depósito. “A pessoa responde só pela última modalidade, que é a manutenção do depósito no exterior”, observou.

O artigo 22 dessa lei de 1986, também conhecida como LCB – Lei do Colarinho Branco – diz que efetuar operação de câmbio não autorizada, com o fim de promover evasão de divisas do País. Pena – reclusão de dois a seis anos, e multa. O parágrafo único diz o seguinte: incorre na mesma pena que, a qualquer título, promove, sem autorização legal, a saída de moeda ou divisa para o exterior, ou nele mantiver depósitos não declarados à repartição federal competente.

Wilson Rodrigues explicou, ainda, que a Polícia Federal assinou pedido de cooperação jurídica internacional já encaminhado à França. Não fez isso diretamente à Suíça porque a evasão de dividas lá é considerada um crime fiscal e o regime jurídico suíço não permite o compartilhamento dessas informações, salvo em fraudes fiscais.

Especialista

O professor doutor, Heleno Torres, que há vinte anos atua na área do direito tributário internacional, defendeu iniciativas que facilitem a regularização dos recursos mantidos por brasileiros no exterior, estabelecendo, por exemplo, uma taxação de 30%. Segundo ele, brasileiros são donos de ativos e dinheiro depositado bancos no exterior equivalentes a US$ 500 bilhões. Supondo que US$ 200 bilhões estejam ilegais, o governo brasileiro poderia estipular uma tributação de 30% e obter cerca de US$ 60 bilhões.

O senador Randolfe Rodrigues perguntou a ele se o Brasil demorou a assinar tratados de compartilhamento de informações e Heleno Torres foi enfático: “Quero dizer o seguinte que o Brasil não se atrasou. Quero deixar muito claro que o Brasil, em novembro do ano passado, na convenção do G-20, foi um dos quatro países que assinara de imediato a convenção de troca de informações sobre contas bancárias no exterior”, salientou.

A seguir, trechos da entrevista com o presidente da CPI do HSBC, senador Paulo Rocha:

PTnoSenado Qual avaliação que o senhor faz da apresentação do representante da Polícia Federal e do professor de direito tributário?

Paulo Rocha – Só reafirma o cuidado que nós estamos tendo ao dirigir um processo de investigação que envolve pessoas e empresas. Portanto, nosso material principal tem que ter uma dose de legalidade fundamental para assegurar a investigação profunda que a comissão deve ter. Mas sem avançar nos direitos fundamentais e individuais de cada cidadão e de cada empresa. Então, a intervenção e a vinda dos dois especialistas à comissão reafirmou esta cautela que hoje a CPI do HSBC detém para que a gente possa ter acesso às informações oficiais e legítimas, tanto do estado suíço quanto do estado francês, para que deem legitimidade e autoridade para nossa investigação.

PTnoSenadoO professor Heleno Torres disse que o Brasil está na frente em matéria de compartilhamento de informações tributárias e bancárias, porque na última reunião do G-20 foi uma das quatro nações a assinar acordo com os Estados Unidos e 136 países da OCDE para ter informações de todo brasileiro que tenha ativos no exterior. Isso contribui de qual maneira para os trabalhos da CPI.

Paulo Rocha – Eu acho que isso confirma a forma como as autoridades brasileiras, tanto o governo quanto nossa Justiça, o Ministério Público quanto o próprio Congresso Nacional, que avança na consolidação da democracia, na transparência ao tratar da coisa pública. Enfim, o Brasil está integrado em nível internacional de combate aos vários crimes que são cometidos contra o poder público, seja pelas chamadas máfias internacionais, do crime organizado, do combate à pirataria, do combate ao tráfico de droga. Significa que nosso País está sintonizado com o mundo moderno no sentido de corrigir essas distorções e proteger a soberania de nosso País dessas operações.

PTnoSenado O senhor acha necessário que integrantes da CPI do HSBC viagem até à França para interpelar o ex-técnico de informática do HSBC na Suíça, o franco-italiano Hervé Daniel Marcel Falciani?

Paulo Rocha – Não, inclusive toda e qualquer informação que ele der não é legítima, não tem amparo legal porque ele confiscou, roubou informações do estado suíço que agora está legalizado na França. Nós precisamos legalizar os dados e só quem pode legalizar esses dados é o estado francês que já detém essas informações que podem ser compartilhadas com o Brasil. Já têm autoridades brasileiras, tanto do Ministério Público Federal quanto do Poder Executivo em busca desses documentos. O que nós estamos brigando é que aja o compartilhamento das informações.

Marcello Antunes

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