Lindbergh quer votar resolução do ICMS até dia 26 na CAE

O presidente da Comissão de Assuntos Econômicos (CAE), senador Lindbergh Farias (PT-RJ), afirmou no início da noite desta segunda-feira (11/03) que seu objetivo é votar a unificação das alíquotas do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) até dia 26 de março na comissão e em plenário no começo de abril. O texto da matéria está contido no Projeto de Resolução do Senado (PRS nº 1/2012). Ao comandar o primeiro ciclo de debates sobre o Pacto Federativo, numa audiência pública que teve a presença de dois ex-ministros de estado, um ex-governador e um economista, Lindbergh enfatizou que seu esforço é contribuir para que haja mais convergências do que divergências na discussão desse projeto que envolve interesses distintos entre os estados. Praticamente todos os participantes consideram que a guerra fiscal chegou a um ponto de esgotamento, ruim para o desenvolvimento do País.

Para evitar que essa exaustão continue prejudicando os estados, Lindbergh observou que o projeto de resolução deve ser aprovado juntamente com a Medida Provisória 599 que estabelece as compensações para eventuais perdas que alguns estados terão. A mesma MP cria, também, o fundo de desenvolvimento regional.

Senadores de diversos partidos participaram da audiência – 13 ao todo – entre eles os da bancada petista que elogiaram a iniciativa de Lindbergh de promover debates temáticos, como José Pimentel (PT-CE), líder do Governo no Congresso, Wellington Dias (PT-PI), líder do PT e do Bloco de Apoio ao Governo, Humberto Costa (PT-PE) e Eduardo Suplicy (PT-SP).

O presidente da CAE, antes de iniciar a audiência pública, informou ter designado o senador Luiz Henrique (PMDB-SC) para acompanhar as discussões na Câmara dos Deputados do projeto que trata da mudança do indexador da dívida dos estados. “Não espero que haja uma radicalização como houve no debate dos royalties, cuja lição deixada é a da necessidade de encontrarmos  uma saída que atenda a todos e é preciso uma maioria possível”, disse Lindbergh sobre a uniformização da alíquota o ICMS. O senador Ricardo Ferraço (PMDB-ES) criticou a Resolução aprovada no ano passado que unificou a alíquota do ICMS na importação, acabando com a guerra dos portos. Segundo ele, a medida foi açodada e os resultados não foram favoráveis a seu estado.

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No entanto, o senador José Pimentel observou que as medidas adotadas pelo Governo Federal são fruto de um conjunto de reuniões que ocorreram ao longo de 2012. Em dezembro, por exemplo, a CAE promoveu uma mesa de diálogo com secretários estaduais de Fazenda onde mostraram preocupação com a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) que declarou ilegais todos os benefícios fiscais com base no ICMS que foram concedidos pelos estados a partir de 1999 e à revelia do Conselho Nacional de Política Fazendária (Confaz), que exige a unanimidade na concessão de qualquer benefício fiscal. Na guerra dos portos, para atrair cargas, alguns estados incentivaram, com isenção do ICMS, a vinda de importadores, em prejuízo aos estados consumidores. E boa parte – senão a maioria desses incentivos – não foi aprovada por unanimidade como é exigida no Confaz.

“Cinco estados já receberam por parte do STF a declaração da nulidade de benefícios concedidos. Portanto, o entendimento do pacto federativo é dar uma resposta aos incentivos concedidos e considerados ilegais. O governo tem adotado várias medidas de desoneração fiscal e feito um esforço muito grande pelo pacto federativo”, enfatizou disse Pimentel.

Foram convidados para a audiência o ex-ministro da Previdência Social e ex-secretário-executivo do Ministério da Fazenda, Nelson Machado; Guilherme Dias, ex-ministro do Planejamento no Governo de Fernando Henrique; Germano Rigotto, ex-governador do Rio Grande do Sul; Bernard Appy, ex-secretário de Política Econômica do Ministério da Fazenda, no governo Lula e José Roberto Afonso, economista ligado ao PSDB. A seguir, trechos da avaliação que cada um tem sobre a uniformização das alíquotas do ICMS.

Nelson Machado – ex-ministro do Ministério da Previdência Social e ex-secretário-executivo do Ministério da Fazenda:

“A insuficiência das políticas de desenvolvimento regional levou os estados a conceder benefícios fiscais para atrair investimentos, empregos e arrecadação”, afirmou. A proposta de reduzir a alíquota interestadual, começando em 2013 e baixando até 4% em 2025, é fundamental na sua avaliação. “É preciso reduzir as alíquotas de 12% (estados mais pobres) 7% (estados mais ricos) que hoje são o combustível da guerra fiscal. É preciso criar, também, mecanismos de compensação daqueles estados que vão perder receita quando alíquota cair. Os estados que usavam a guerra fiscal vão perder. Tudo isso precisa de um acordo de convalidaçãoo de benefícios e incentivos fiscais que não foram aprovados por unanimidade do Confaz. Acontece que a proposta colocada na MP trabalha com a redução de 12% e 7%, mas mantém exceções para a Zona Franca e para o gás de Mato Grosso do Sul”, observou.

Guilherme Dias, ex-ministro Planejamento do governo Fernando Henrique Cardoso:

“Compartilho e tenho convergência com muitas ideias. Hoje teria divergências amplas, que ajudam o criar clima de debate. Minha dúvida fica no terreno boas intenções”, disse. Segundo ele, o que se espera de uma reforma tributária é reduzir a carga e simplificar a arrecadação. “Sinceramente, a mudança em duas etapas, a primeira para a guerra dos portos e agora com a alíquota geral, essa reforma não entrega as duas coisas. Não reduz a carga tributária e a experiência da Resolução 13 complicou”, afirmou.

Para Guilherme Dias, a Resolução 13, da guerra dos portos, não surtiu o efeito desejado pelo governo porque aparentemente não cumpriu o objetivo de proteger a indústria nacional, já que algumas exceções foram dadas para setores que continuam sendo beneficiados por regimes de tributação do ICMS diferenciados. “A única coisa líquida e certa é que os estados de Santa Catarina, Espírito Santo e Goiás foram prejudicados e outros beneficiados, como Amazonas e Mato Grosso do Sul”, destacou. Ele entende que as mudanças tributárias deveriam ser graduais. “Condicionalidades têm que ser eliminadas ou reduzidas para que haja compensação. O tema é o excesso de prioridade contra a guerra fiscal. Não consigo entender qual a diferença entre desoneração dada pelo Governo Federal daquela feita pelos estados. Quando se analisa a política de investimentos somos todos desenvolvimentistas, mas quando é ruim pelos estados, somos chamados de neoliberais”, afirmou.

José Roberto Afonso – economista:

José Roberto Afonso fez um questionamento na mesma linha do ex-ministro de Fernando Henrique Cardoso, ou seja, questionou o motivo de mudar o ICMS às pressas. O economista afirmou que o Supremo tem se posicionado contra os benefícios fiscais concedidos pelos estados como forma de atrair investimentos, mas o erro persiste, segundo ele, desde a definição da partilha do Fundo de Participação dos Estados (FPE).

Para ele, a motivação básica de mudar a regra do ICMS está na dificuldade de se atrair novos investimentos. “A proposta inicial do governo quando não tinha exceções para alguns setores representava perdas para seis 6 estados da ordem de R$ 15,3 bilhões. Com as exceções para gás e a Zona Franca essas perdas caem para R$ 10 bilhões”, disse ele.

Afonso enfatizou que é mais fácil entrar numa guerra fiscal do que sair, porque se cria um paradoxo em torno daquela empresa que fez investimentos em determinado estado que ofereceu redução de ICMS. “A saída pode ser uma barreira para novos investimentos. Garante-se para quem está dentro (do estado), mas trava novos investimentos”, comentou.

Bernard Appy – ex-secretário de politica econômica do Ministério da Fazenda:

Appy considera a proposta do governo correta tanto em termos objetivos quanto subjetivos, por entender que a guerra fiscal entre os estados prejudica o crescimento do País. Reduzir a alíquota é o modelo correto para tratar da questão, segundo ele.

“Acho que algumas questões precisam ser aperfeiçoadas mas insisto que a proposta do governo merece apoio. Há necessidade de garantirmos os investimentos já realizados, em cima dos incentivos, e os recursos do fundo de desenvolvimento podem ser usados. Mas o fato é: a MP vai reabrir nova rodada de negociação dos governadores com os incentivos. Vamos reduzir alíquotas mais devagar?. Isso é ruim porque incentiva a continuidade de manutenção de incentivos. Outro mecanismo é o reforço do fundo desenvolvimento regional, tornando mais clara a alocação dos recursos”, disse ele.

Segundo Appy, outra alternativa é fazer incentivo através do PIS/Cofins, mudando a forma de concessão estadual para federal, mais transparente, limitando esse benefício por empresa e por estado, de modo a evitar a migração de uma empresa de um estado para o outro em busca de incentivos fiscais. Ele também observou que a redução da alíquota do ICMS para 4% irá aumentar demasiadamente o potencial de acúmulo de crédito pelas empresas. “A redução da alíquota interna para insumos e bens intermediários vendidos para a indústria não é ideal, porque prejudicará o comércio varejista e as vendas para as empresas do Simples”, disse ele.

Em relação à compensação por perda de receita, Appy lembra que o prazo deve ser estipulado e encerrado, por exemplo, num período de vinte anos. Caso contrário, lá na frente haverá outra disputa entre os estados e a União pela prorrogação das compensações. “Se o ICMS tivesse a tributação no destino da mercadoria, hoje não estaríamos nesse discussão e os recursos dessa compensação devem ser orçamentários”, recomendou. 

Germano Rigotto – ex-governador do Rio Grande do Sul, ex-presidente da Comissão da Reforma Tributária na Câmara, quando deputado federal:

“Quando presidi a comissão da reforma tributária, visitei 26 estados e participei de centenas de reuniões, mas houve um desencanto de fazer a reforma”, lembrou. Segundo Rigotto, assim que foi eleito governador do Rio Grande do Sul, “entrou de cabeça” na guerra fiscal para atrair investimentos para o estado, por mais que o ex-presidente Lula e a ministra Dilma tenham nos ajudado. “Se não entrássemos na guerra fiscal, o polo naval hoje não estaria no Rio Grande. Mas digo que entrei de cabeça na guerra fiscal mas ela chegou ao limite. Enquanto São Paulo não entrava nessa guerra, isso não acontecia. A guerra fiscal determina sombras absurdas, as empresas que tem incentivo convivem com aquelas que não tem, numa concorrência desleal”, afirmou.

Segundo ele, alguns estados possuem mais de 2.500 dispositivos legais para determinar o incentivo e a maneira de tributação do ICMS e ao unificar a alíquota em 4% a nota eletrônica pode contribuir para determinar as compensações para aqueles estados que vão perder a receita. Rigotto concorda com Appy, os recursos dessa compensação devem ter um prazo e vir de fonte orçamentária. “Fui relator da Lei Kandir que repactuou a divida dos estados. Acreditava-se na possibilidade de ter um instrumento de tributação para as empresas exportadoras, mas os estados, hoje, tem que mendigar recursos no Congresso Nacional para repor os recursos que estão perdendo por conta das desonerações das exportações”, observou.

Rigotto disse que aplaude as iniciativas do governo da presidenta Dilma Rousseff em buscar mudanças estruturais com campo tributário para racionalizar o sistema. “É bem vinda a fusão do PIS/Cofins em estudo, porque segue na direção de um sistema tributário moderno. No caso do ICMS, ele não pode continuar do jeito que está”, disse ele.

Ricardo Ferraço – senador do PMDB pelo Espírito Santo:

“A competição fiscal existe nos estados mais civilizados. Na Suíça funciona assim. Hoje o Confaz tem de evoluir para ser mediador com regras transparentes para que os estados busquem desenvolvimento econômico. É acertada a iniciativa dos debates proposto pelo senador Lindbergh, mas não deve ser tão depressa e nem tão devagar”, disse ele. Ferraço disse ter convicção de que a unificação da alíquota do ICMS deve ser analisada com cautela, o que não significa covardia de discutir o assunto.

Luiz Henrique – Senador pelo PMDB de Santa Catarina e ex-governador do estado:

Segundo Luiz Henrique, o estado de Santa Catarina já perdeu R$ 90 milhões com a Resolução 13 que acabou com a guerra dos portos. Ele considera que no caso da MP 599 que estabelece a compensação para as perdas, há um dispositivo indicando que, nas operações de bens importados, não haverá compensação. “O artigo 3º da MP vai promover dificuldade imediata na arrecadação não só de Santa Catarina. Essa questão tem de ser maturada, meditada, para não fazermos uma lei inexequível ou que não atinja os objetivos preconizados pelo governo. Precisamos tratar com outras questões do pacto federativo, como a dívida consolidada dos estados”, afirmou.

Luiz Henrique disse que os estados entraram na guerra fiscal por falta de uma política de desenvolvimento regional, e também pela redução crescente da arrecadação. Em 1954, os estados arrecadavam 35% do bolo tributário brasileiro e hoje não chega a 32%. “Os estados recorreram a essa política por necessidade. A guerra fiscal não fui ruim, o problema também está no indexador da dívida dos estados. Peguei o estado com uma dívida de R$ 4 bilhões. Paguei R$ 6 bilhões e hoje devemos R$ 10 bilhões”, afirmou.

Armando Monteiro – senador do PTB pelo Pernambuco, ex-presidente da Confederação Nacional da Indústria (CNI).

“Ninguém imagina que estamos vivendo num ambiente tributário bom. Não há nada pior do que esse ambiente do ICMS. A redução da carga não demanda nem reforma. Temos que buscar um sistema que se harmonize com medidas do exterior. Hoje o ICMS é disfuncional e não é possível imaginar que esse sistema tenha sobrevida. É evidente que, para construir transição, sobretudo aos entes da Federação que são importadores líquidos, um mecanismo que chamaria de seguro de receita seria feito por processo automático para repor as perdas e não um fundo. Podemos discutir o ritmo do processo, como se dá a convergência, mas não há dúvida de que precisamos iniciar esse processo”, recomendou.

Monteiro elogiou a iniciativa do governo Lula de avançar na desoneração de bens de capital. “Reduzimos o prazo de compensação do PIS/Cofins para zero. Antes era de 48 meses para receber. Agora ficou o ICMS, onde o prazo é de 60 meses em alguns estados. Porque não aproveitar e fazer já um movimento mais afirmativo de uma desoneração efetiva dos bens de capital. Precisamos retirar o resíduo da cumulatividade. O sistema do Imposto por valor agregado – IVA – gera crédito e só se paga pelo valor adicionado. A substituição tributária de hoje prejudicou as micro e pequenas empresas porque houve um aumento perverso do ICMS nos últimos quatro anos. Elas foram penalizadas com a substituição tributária”, afirmou.

O que de fato ocorre, segundo Monteiro, é que as distorções no sistema tributário chegam ao ponto onde uma empresa cedia o empreendimento exportador, sendo obrigada a reconhecer créditos que não arrecadou. “Pergunto: quando vamos começar a criar um sistema tributário de classe mundial. Desonerar investimento e exportação. Louvo iniciativa do governo Dilma quando inicia a desoneração da folha. Confio que o Senado e o Congresso darão a contribuição para superar essas contradições. E o senador Lindbergh inicia sua presidência na CAE com esse debate que é da maior importância para o Pais”, salientou.

Wellington Dias – Líder do PT e do Bloco de Apoio ao Governo no Senado, ex-governador do Piauí:

O líder reconhece que esse tema da unificação do ICMS não tem unanimidade. “Se for esperar a unanimidade não vamos ter um passo adiante. Desde o governo de Lula e agora com a presidenta Dilma há esforço para trabalhar regras para conter aquele medo de como vai ser a vida do estado amanhã, com qual garantia terá com a unificação das alíquotas. Esse é o ponto crucial”, afirmou.

Segundo ele, em 2010 existiam dez pontos para trabalhar mudanças no pacto federativo, com ganhos e perdas. Entre os tópicos principais, a redução dos encargos da dívida, FPE, ICMS na importação, ICMS geral. “Mas antes disso, quando era deputado federal e Germano Rigotto estava envolvido na reforma tributária, saímos à noite da Câmara com um entendimento, mas às sete da manhã do outro dia já não havia mais. Quebramos a oportunidade de acordo”, afirmou. Wellington Dias fez esta observação para mostrar que o caminho é buscar uma convergência possível entre os estados e a União. Ele disse que recebeu favoravelmente a sugestão de Bernard Appy para o fundo de compensação para as perdas, onde o estado que receberá os recursos tenha a liberdade para utilizar os valores em projetos locais de seu próprio interesse.

Marcello Antunes

 

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