Educação

Violências nas escolas não será resolvida com resposta populista

Debatedores apontam caminhos possíveis para conter escalada de violência no ambiente escolar e defendem retomada de investimentos em política públicas, retomada da cultura de paz e o fim do discurso de ódio na sociedade
Violências nas escolas não será resolvida com resposta populista

Foto: Alessandro Dantas

Os violentos ataques a escolas ocorridos recentemente no Brasil, suas causas e possíveis soluções foram debatidos, nesta quarta-feira (19), em audiência pública da Comissão de Segurança Pública do Senado. Para se ter uma ideia da dimensão que o tema tomou, estudo da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) mostra que, nos últimos 20 anos, ocorreram 23 ataques a escolas no país, sendo 9 deles apenas nos últimos oito meses.

Os debatedores destacaram a complexidade do tema e apontaram que não existe uma solução simplista que coloque fim ao problema existente.

O líder do PT no Senado, Fabiano Contarato (ES), disse temer que o Congresso Nacional não se debruce sobre o tema com a seriedade necessária e, em vez de propor soluções duradouras e acertadas, promova soluções simplistas, imediatistas e populistas, como a colocação de polícias armados dentro de escolas.

“O espaço escolar não é um espaço para a criança ter medo. É um espaço para ela ser acolhida, abraçada e aprender todas as suas possibilidades de conhecimento”, disse. “As escolas públicas precisam ter laboratório, biblioteca”, emendou o senador, ao apontar que 92% das escolas públicas do país não tem laboratório de ciências, 73% delas não possuem biblioteca, outros 73% não tem acessibilidade para os alunos e 63% não tem, sequer, quadra poliesportiva.

Sammy Barbosa Lopes, procurador de Justiça do Ministério Público do Estado do Acre, afirmou que o Brasil enfrenta, hoje, uma “epidemia de violência”. Para ele, é possível fazer diversos recortes da violência que assola o Brasil, passando pelos casos de feminicídio, LGBTfobia e criminalidade na cidade e no campo.

Mas, para o procurador, não faz sentido propor a militarização de escolas, quando falta o básico para as crianças desenvolverem seu potencial, principalmente em escolas de cidades menores do interior do Brasil.

“Vamos colocar detectores de metais em todas as escolas do Brasil? Temos em torno de 180 mil escolas no país. Cerca de 85% do total são escolas públicas que sofrem com a falta de água, merenda e internet. Será que essas escolas vão ter uma porta giratória ou um portal detector de metais? Me parecem soluções um tanto utópicas”, criticou.

Foto: Alessandro Dantas

O secretário nacional de Acesso à Justiça, Marivaldo de Castro Pereira, destacou a determinação do presidente Lula em mobilizar toda a estrutura do governo federal para buscar saídas para o aumento de ataques às escolas. O consenso, segundo ele, é de que não se trata de um problema de segurança pública.

“Se decidirmos tratar esse problema exclusivamente pela perspectiva da segurança pública, nós já perdemos. É um problema que exige ampla mobilização da sociedade, das famílias, da comunidade escolar e diálogo com estudantes”, explicou, alertando para a necessidade de retomada de políticas públicas de melhoria das escolas que deem suporte à complexidade dos problemas existentes nas escolas.

Nesse sentido, o governo anunciou ontem a liberação de mais de R$ 3 bilhões para políticas de prevenção à violência nas escolas. Com o recurso, estados e municípios poderão implementar ações de prevenção, segurança e apoio psicossocial nos colégios; uma cartilha com orientações para gestores escolares; e a abertura de canais de denúncias que já estão ajudando no combate a atentados.

Apologia à cultura do ódio

Os especialistas ouvidos pela comissão alertaram que o aumento de casos de violência no ambiente escolar decorrem do estímulo ao armamento da população e aos discursos de ódio e preconceito promovidos pela gestão anterior.

O senador Fabiano Contarato fez um resumo daquilo que foi o Ministério da Educação nos últimos quatro anos. Tivemos desde pedidos para que professores filmassem as crianças cantando o hino nacional e o slogan do ex-presidente até ministro que chegou a dizer que a universidade pública era para poucos, que criança com deficiência era impossível de se conviver e que gays vêm de famílias desajustadas.

“Isso tudo tem um histórico”, resumiu o senador. “Não se reduz a violência armando a população e não se vai combater a violência nas escolas com um comportamento imediatista colocando uma polícia armada dentro das escolas. Precisamos é armar a população de livros, para que ela tenha dignidade”, disse.

Foto: Alessandro Dantas

O secretário nacional de acesso à Justiça também apontou que, a partir de 2018, lideranças do governo federal passaram a tratar a educação como inimiga dos interesses do Brasil. Universidades públicas foram retratadas como local de balburdia, o racismo foi minimizado e a violência contra a mulher passou a ser tratada como algo de menor gravidade.

“Vimos o desmonte de todo tipo de política de combate ao ódio. Ao invés de termos o presidente da República falando de cultura de paz, de pacificação e integração, vimos o presidente ensinando criança a fazer ‘arminha’. É óbvio que esse discurso de ódio levaria a esse resultado e teria impacto na sociedade”, lamentou Marivaldo Pereira.

“Precisamos fazer com que toda sociedade compreenda a gravidade do que estamos vivendo no Brasil. E não é por acaso, são consequências”, enfatizou Rosilene Corrêa, secretária de Finanças da Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação.

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