“A dívida dos estados nos moldes como está é |
Senado dará continuidade aos projetos que têm por objetivo construir uma nova relação entre a União e os entes federados – estados e municípios – no chamado novo Pacto Federativo. Logo na abertura do seminário “O Estado e a Federação: Crises e reforma”, realizado pela Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) do Senado, o presidente do colegiado, senador Lindbergh Farias (PT-RJ), anunciou que, após um acordo com o presidente da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), Vital do Rêgo (PMDB-PB), e com o senador Eunício Oliveira (PMDB-CE), será colocado em votação na semana que vem o projeto de Lei Complementar (PLP nº 99/2013) que muda o indexador da dívida dos estados e municípios, hoje corrigida pelo IGP-DI mais 6% a 9% para o IPCA mais 4% ao ano ou a Taxa Selic, o que for menor.
Todos os estados e municípios que renegociaram suas dívidas em 1997 têm interesse nessa mudança. Após apreciação pela CCJ, o projeto seguirá para a CAE.
Ao contrário do que tem sido publicado na imprensa, de que esse projeto beneficiará exclusivamente o município de São Paulo, porque a troca do indexador da dívida garantirá uma folga fiscal que permitirá novos investimentos em áreas estratégicas, o percentual do comprometimento da receita corrente líquida mantido nos atuais 13% não vai incorrer em desrespeito à Lei de Responsabilidade Fiscal.
E quem fez essa afirmação é ninguém menos do que o secretário de Fazenda do Estado de São Paulo, Andrea Calabi, um dos palestrantes do seminário. “Apoiamos a troca do indexador das dívidas pleiteada pela prefeitura de São Paulo prevista no PLP nº 238/2013 (número do projeto já aprovado na Câmara. No Senado é PLP nº 99/2013). Estamos falando da terceira maior região metropolitana do mundo, que tem 18 milhões de habitantes. O projeto interessa a todos os estados e municípios que refinanciaram suas dívidas em 1997”, observou o secretário de Fazenda do Estado de São Paulo, Andrea Calabi.
No caso dos estados, todos serão beneficiados, exceto o Ceará, e, entre os cinco primeiros estão: Alagoas, Rio Grande do Sul, Minas Gerais, Rio de Janeiro e São Paulo. No caso das capitais, São Paulo e Rio ficam nos primeiros lugares. A mudança do indexador constou da pauta de reivindicação dos governadores e prefeitos nas reuniões realizadas em Brasília no início do ano com os presidentes da Câmara e do Senado. Em seguida, senadores também começaram a trabalhar pelo tema. O prefeito de Porto Alegre, José Fortunati, e de São Paulo, Fernando Haddad, lideraram o movimento defendido pela maior parte dos governos estaduais e municipais. Quando Lindbergh anunciou hoje a vontade de votar a matéria, ficou claro o interesse de todos. Diversos prefeitos e governadores procuraram a Comissão de Assuntos Econômicos para saber se a notícia era factível.
Segundo o senador petista, não haverá um impacto fiscal de proporções razoáveis a partir da aprovação desse projeto que muda o indexador das dívidas estaduais e municipais. Estudo da Assessoria Técnica da Liderança do PT e do Bloco de Apoio ao Governo mostra dados que relevam a distorção que a correção pelo IGP-DI mais 6% a 9% produziu a partir de 1997. O Estado do Mato Grosso do Sul, por exemplo, tinha dívida de R$ 2,2 bilhões em 1997; já pagou cerca de R$ 6,05 bilhões e ainda deve R$ 7,6 bilhões.
A dívida total renegociada com base na Lei 9496/1997 previa que o indexador seria o IGP-DI mais 6% caso o estado ou município optasse por privatizar suas empresas públicas que eventualmente fossem deficitárias e ainda pagar de imediato 20% do total, conforme regia a cartilha tucana na ocasião. Quem não fez essa opção, de privatizar e nem recolher os 20%, se viu obrigado a ter um contrato de renegociação da dívida corrigido pelo IGP-DI mais 9%. Naquela ocasião, a Taxa Selic correspondia a 50% ao ano e o IGP-DI tinha uma variação menor, que compensava essa opção.
Acontece que a partir de 2003, início do governo Lula, as taxas de juros foram atacadas e ficaram menores do que a variação exibida pelo IGP-DI mais 6% a 9% ao ano, representando juros entre 15% e 20% ao ano, enquanto que a inflação medida pelo IPCA caiu drasticamente, ficando sempre dentro das metas de inflação, ou seja, abaixo de 6,5% ao ano. E é por causa dessa diferença que estados e municípios têm interesse em mudar o indexador da dívida e o projeto integra o rol de matérias integrantes do novo Pacto Federativo.
Outra informação da Assessoria Técnica da Liderança do PT é que a iniciativa de votar a matéria também não vai afetar o pacto fiscal firmado pela presidenta Dilma Rousseff e o Congresso Nacional. Na verdade, a queda de receita da União em relação ao pagamento das dívidas estaduais e municipais vai ocorrer ao longo dos anos e, o principal efeito, em uma década. Outro fator importante, é que governos e prefeituras com alívio da dívida, sem comprometer a LRF, poderão realizar investimentos em áreas estratégicas para atender às demandas da população. “A dívida dos estados nos moldes como está é impagável. A renegociação ajudará os estados sem prejudicar as finanças públicas. Para a maioria dos estados, o dispêndio anual não diminuirá em relação a receita corrente líquida, mas o estoque da dívida será reduzido expressivamente”, diz Lindbergh.
Seminário
Para Lindbergh Farias, o melhor resultado do seminário para discutir o federalismo foi a decisão de colocar em pauta o projeto que troca o indexador da dívida. Mas ele não deixou de externar sua avaliação a respeito de outras matérias que têm por objetivo melhorar a relação entre a União e os estados e municípios. “Tenho reclamado muito da falta do papel de coordenação do Senado e da União nesse debate federativo. Temos que aprovar a renegociação das dívidas e promover a reforma do ICMS e uma nova fórmula de cobrança do PIS/Cofins, mas está faltando esse papel de liderança política, porque ficamos sem uma coordenação”, disse ele.
O presidente da CAE reconheceu alguns avanços, como a aprovação do Projeto de Resolução do Senado (PRS nº 1/2013) que uniformiza as alíquotas do ICMS e está aguardando para ser votado pelo plenário da Casa. “Encontro lideranças municipais que reclamam da concentração das receitas na União em descompasso com o aumento da divisão das responsabilidades. Não está fácil ser prefeito. As desonerações feitas foram importantes, mas causaram um impacto violentíssimo nos repasses do Fundo de Participação dos Municípios, o FPM. Portanto, a situação fiscal está muito difícil”, alertou.
Lindbergh fez um apelo para que o Governo Federal não jogue a toalha e deixe para depois as reformas que vão permitir um melhor relacionamento entre a União e os entes federados. “Esse seminário nos ajuda fazer andar essa pauta. Tivemos uma negociação difícil e aprovamos na Câmara a troca do indexador da dívida que traz um alívio para os estados e municípios. O esforço também seria aprovar a reforma do ICMS e o PRS nº 1/2013, porque há insegurança jurídica das empresas em relação aos incentivos considerados ilegais pelo Supremo Tribunal Federal”, disse ele, acrescentando que não concorda simplesmente com a pura e simples validação dos incentivos ilegais. “Faço um apelo à União, ao Ministério da Fazenda porque falta pouco. Sem acabar com a guerra fiscal vamos desorganizar todo o estado. Portanto, está faltando a boa política, um maior diálogo com o Governo Federal”, acrescentou.
Marcello Antunes
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