Senadores do PT não aprovam relativização da PEC do Trabalho Escravo pretendida pela bancada ruralista
O trabalho escravo continua sendo uma mancha no Brasil, como comprova o crescente trabalho da Justiça, como mostra a série de reportagens que o PT no Senado publica desde a semana passada. (Veja os links abaixo)
Mas as claras evidências ainda não são suficientes para motivar parlamentares de vários partidos a apoiar a prioridade definida pelo líder do PT no Senado, Wellington Dias (PI), para a aprovação urgente da PEC do Trabalho Escravo (PEC 57A/99). Para o senador, a aprovação da PEC “é um compromisso da bancada e uma dívida com Bruno Maranhão, líder do Movimento dos Trabalhadores Sem Terra,falecido recentemente”.
A Semana Nacional do Trabalho Escravo, que se encerra nesta segunda-feira (3), lembrará o combate à escravidão com eventos promovidos em todo o País. Duas das mais importantes entidades dessa linha de frente – a organização não governamental (ONG) Repórter Brasil e a Comissão Pastoral da Terra, ligada à igreja católica, tomaram a frente da campanha pela aprovação urgente no Senado da proposta de emenda à Constituição.
Aprovada pela Câmara em 2012, na nova lei, que permite o confisco de propriedades rurais e prédios onde a fiscalização encontrar a exploração do trabalho escravo (na Câmara – PEC 438/01 e, no Senado – PEC 57/99), prevê a expropriação dos imóveis (para reforma agrária ou a programas de habitação) onde for comprovada a existência de trabalho análogo à escravidão.
O diretor da ONG Repórter Brasil, Leonardo Sakamoto, também lamentou, no site www.trabalhoescravo.org.br que a proposta não tenha avançado. Ele critica ainda tentativas de parlamentares ligados ao agronegócio de modificar a legislação que define o que é trabalho escravo, cujo objetivo é reduzir o rigor da lei.
As propostas, segundo Sakamoto, enfraquecem o conceito de trabalho escravo modificando dois aspectos. “Tem uma parte ligada à dignidade do trabalhador que diz respeito a condições degradantes de trabalho. São condições que colocam em risco a saúde, a vida e a dignidade do trabalhador. Tenda no meio do mato, trabalhador que come comida estragada, que é obrigado a trabalhar nessas condições…”, explica.
Outra condição é a jornada exaustiva. “Jornada exaustiva não é a quantidade de horas trabalhadas, é um erro achar que é isso, mas é a intensidade da exploração. A pessoa pode trabalhar por sete ou oito horas por dia e ser configurada jornada exaustiva se ele está trabalhando tanto que a saúde e a vida dela estão em risco”, detalha o site.
Código Penal
O Código Penal (Decreto-lei 2848/40) define como trabalho escravo reduzir uma pessoa à condição semelhante à de escravo, obrigando-a a trabalhos forçados ou a uma jornada exaustiva. Também considera uma situação análoga à escravidão sujeitar um trabalhador a condições degradantes de trabalho ou limitar a liberdade de ir e vir do trabalhador por causa de uma dívida contraída com o empregador ou com o aliciador de trabalhadores.
Apesar de já ter passado na Câmara, ainda há muita polêmica em torno do projeto. Capitaneados por ruralistas, parlamentares lutam para atenuar o conceito de trabalho escravo e manter uma fonte de lucro fácil que se perpetua no Brasil desde a época do descobrimento.
Reação conservadora
No Congresso Nacional, parlamentares ligados à Bancada Ruralista vêm tentando alterar a legislação para descaracterizar o que é trabalho escravo. No final do ano passado, eles condicionaram a aprovação no Senado Federal da Proposta de Emenda Constitucional 57A/99, a PEC do Trabalho Escravo, à mudança na definição do conceito do que é escravidão.
Os ruralistas querem alterar a lei e limitar a definição de escravidão aos casos em que há ameaças e violência física direta, ignorando os casos de degradação humana, infelizmente ainda recorrentes no país.
A definição atual é apontada como referência pela Organização das Nações Unidas e pela Organização Internacional do Trabalho. O conceito é defendido por ministros de tribunais superiores, juízes, procuradores, auditores, acadêmicos e representantes de movimentos sociais que atuam no combate à escravidão.
Um exemplo da reação conservadora é o deputado Moreira Mendes (PSD-RO) é autor de projeto que modifica o conceito de trabalho escravo (PL 3842/12). Entre outros pontos, o texto retira os termos “jornada exaustiva” e “condições degradantes de trabalho”‘ do Código Penal e inclui a necessidade de ameaça, coação e violência para ser caracterizado o trabalho escravo.
Moreira Mendes afirma que a atual redação do Código Penal dá margem a muitas interpretações. “Essa é uma coisa que não pode ficar ao arbítrio da autoridade que eventualmente estiver exercendo o seu poder de polícia ou de fiscalização”, argumenta o parlamentar.
“Eu tenho convicção de que teremos que tirar do artigo 149 (do Código Penal) as expressões ‘jornada exaustiva’ e ‘trabalho degradante’, porque é uma coisa muito ampla”, defende Mendes. “O fiscal pode dizer que tomar água num copo que não seja descartável, como já têm casos, pode ser considerado trabalho degradante e, consequentemente, trabalho escravo. Esse tipo de abuso é que nós não podemos permitir.”
No Senado, o senador Romero Jucá (PMDB-RR), trabalha para que, no processo de regulamentação da PEC do Trabalho Escravo o conceito atual seja alterado. Uma Comissão Mista composta por 11 deputados e 11 senadores está debatendo possíveis mudanças.
Giselle Chassot, com informações do site trabalho escravo e da Agência Câmara
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