Investigação

Combate ao crime organizado passa pela descapitalização dos grupos, alerta diretor-geral da PF

CPI inicia trabalhos com alerta de Andrei Rodrigues sobre avanço tecnológico do crime e importância da cooperação nacional e internacional

Alessandro Dantas

Combate ao crime organizado passa pela descapitalização dos grupos, alerta diretor-geral da PF

A CPI do Crime Organizado realizou nesta terça-feira (18/11) sua primeira oitiva, com a participação do diretor-geral da Polícia Federal, Andrei Rodrigues. No depoimento, afirmou para a necessidade de uma definição clara e precisa do que configura crime organizado e destacou que o enfrentamento efetivo passa pela descapitalização financeira das organizações.

Andrei Rodrigues afirmou que o termo “crime organizado” tem sido usado de forma indiscriminada, o que prejudica a atuação das forças de segurança. Segundo ele, sem clareza conceitual, o combate se torna ineficiente.

“Tudo virou crime organizado. Para enfrentar de forma qualificada, precisamos compreender o que é o fenômeno. É alguém com um fuzil na periferia? É quem desvia recursos públicos? É o pessoal da Faria Lima? Sem essa clareza, não avançamos”, disse.

Ele lembrou que a legislação brasileira define organização criminosa como a associação de pelo menos quatro pessoas, com hierarquia e objetivo comum, para praticar crimes cuja pena máxima ultrapassa quatro anos.

Descapitalização: estratégia central do combate

O diretor-geral enfatizou que retirar o poder econômico das organizações é uma das formas mais eficazes de enfraquecê-las. De acordo com ele, a PF vem ampliando de forma significativa as apreensões de bens e valores nos últimos anos.

Em 2023, foram apreendidos R$ 3 bilhões — valor muito superior ao registrado no ano anterior, inferior a R$ 1 bilhão. Em 2024, as apreensões chegaram a R$ 6,4 bilhões. Em 2025, apenas a operação deflagrada na cadeia de combustíveis deve resultar em quase R$ 4 bilhões, elevando o total do ano para cerca de R$ 9 bilhões.

“Estamos falando de dinheiro, imóveis, veículos, aeronaves e embarcações efetivamente apreendidos, não apenas bloqueios que nunca se concretizam”, ressaltou.

Ele citou ainda a operação realizada no dia de hoje, que investiga fraude estimada em R$ 12 bilhões e já localizou R$ 1,6 milhão em espécie na casa de um investigado.

PF como principal agência nacional contra o crime organizado

Rodrigues defendeu que o Brasil já possui uma agência nacional de enfrentamento ao crime organizado — a própria Polícia Federal — atuando em cooperação com polícias civis, militares, o Ministério Público e outros órgãos do sistema de justiça.

Ele destacou que o avanço tecnológico das atividades criminosas, impulsionado por criptoativos, fintechs e sistemas de pagamento instantâneo, exige atualização constante das instituições de controle.

“O Estado ainda está, muitas vezes, no momento analógico, enquanto o crime opera no digital”, afirmou.

Integração entre forças e cooperação internacional

O diretor ressaltou as Forças Integradas de Combate ao Crime Organizado, que reúnem policiais civis, militares, penais, rodoviários e guardas municipais em todos os estados, sob coordenação e financiamento do Ministério da Justiça e da PF. Essas equipes, apontou Rodrigues, foram responsáveis, em 2023, por cerca de 300 operações, mil prisões e R$ 400 milhões em apreensões — números já superados em 2024.

Ele também destacou a criação do Sistema de Segurança da Amazônia, com um Centro de Cooperação Policial Internacional sediado em Manaus e integrado por representantes dos nove países da região.

A PF mantém ainda cooperação com Europol, Interpol e Ameripol, além de adidâncias em 34 países.

Eficiência nas investigações

O diretor-geral citou indicadores que colocam a PF entre as “principais polícias do mundo”. Segundo ele, a instituição resolve 85% dos inquéritos — índice que inclui tanto casos com autoria identificada quanto investigações que comprovam inexistência de crime.

Em 2023, a PF instaurou 45 mil inquéritos, realizou 2,9 mil operações, cumpriu 2 mil mandados de prisão e apreendeu 70 toneladas de cocaína e 438 toneladas de maconha.

Solução foi apresentada pelo governo Lula

O líder do PT no Senado, Rogério Carvalho (SE), destacou que o Projeto de Lei Antifacção, enviado pelo governo Lula e atualmente em debate na Câmara dos Deputados, representa uma resposta à crescente demanda da sociedade por ações efetivas na área de segurança pública.

Segundo ele, o enfrentamento ao crime organizado exige não apenas medidas policiais, mas também atuação estratégica em diferentes esferas.

“Precisamos dar conta de tudo que está no entorno: da inteligência, de desmontar esquemas mais sofisticados, de identificar as conexões da política com o crime organizado, do sistema financeiro com o crime organizado e de toda a cadeia de produção e abastecimento dessas organizações”, afirmou.

O líder do governo no Congresso, senador Randolfe Rodrigues (PT-AP), reforçou que a CPI tem papel central na construção de soluções estruturantes e no fortalecimento do combate nacional ao crime organizado.

“O objetivo desta CPI está claro: colaborar com a guerra que é de todos os brasileiros, a guerra contra o crime organizado. No depoimento do doutor Andrei, vimos qual é o papel da Polícia Federal. Hoje mesmo, a PF, junto com a Polícia Civil do Amapá, realizou uma operação com mais de 20 presos. A cooperação entre as polícias é o primeiro passo”, destacou.

CPI investigará toda a cadeia criminosa

O presidente da CPI, senador Fabiano Contarato (PT-ES), afirmou que o colegiado investigará de forma técnica e independente toda a estrutura do crime organizado no país.

“Não há espaço para covardia. Toda a pirâmide será desvendada — da base ao topo, do executor ao financiador, do operador ao protetor político”, declarou.

Contarato também mencionou o Projeto de Lei Antifacção e disse que o Congresso deve atuar com base em fatos, não pressões ou interesses momentâneos. “Se houver agentes públicos, políticos, empresários ou qualquer pessoa associada ao crime, não importa o cargo ou o poder: esta Comissão irá investigar, expor e encaminhar”, concluiu.

To top